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 | Minh Uong/The New York Times
| Foto: Minh Uong/The New York Times
  • Aharon Zeevi Farkash, fundador da FST Biometrics, demonstra a tecnologia de sua empresa em um edifício residencial em Manhattan

Uma das tarefas do físico Joseph J. Atick, um dos pioneiros da tecnologia de reconhecimento facial, é promover a biometria nas agências governamentais incumbidas de identificar criminosos e prevenir fraudes de identidade. "Nós salvamos vidas e solucionamos crimes."

O setor de biométrica —que usa características fisiológicas exclusivas de cada indivíduo, como impressões digitais e traços fisionômicos, para registrar ou confirmar sua identidade— está em alta no mundo inteiro. Calcula-se que ele tenha gerado R$ 16,35 bilhões em 2012.

O doutor Atick, porém, está cada vez mais apreensivo com a proliferação dessa tecnologia. Quais são os critérios das empresas para reter e reutilizar dados faciais dos consumidores? Elas têm direito de identificar indivíduos sem seu consentimento explícito? Estarão repassando esses dados secretamente para agências governamentais?

O doutor Atick não está preocupado com o uso declarado do reconhecimento facial por parte do governo para fins específicos —por exemplo, o registro dos rostos de motoristas por departamentos estaduais de trânsito para prevenir a falsificação de carteiras de habilitação. O que o incomoda é a exploração do reconhecimento facial para identificar cidadãos, expondo suas vidas publicamente.

Hoje essa tecnologia viabiliza a vigilância em massa, "basicamente usurpando o anonimato das pessoas", diz ele.

De fato, documentos ultrassecretos da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) dos EUA revelam que a tecnologia de reconhecimento facial é usada em imagens recolhidas em operações de vigilância global. Funcionários da agência acreditam que essa tecnologia poderá revolucionar a maneira como o serviço secreto da NSA descobre alvos.

A agência intercepta "milhões de imagens por dia", incluindo cerca de 55 mil "imagens de reconhecimento facial de alta qualidade", segundo documentos de 2011 obtidos por Edward Snowden, ex-funcionário terceirizado da agência.

Uma apresentação em PowerPoint da NSA em 2011 mostra várias fotos de um homem não identificado —às vezes com barba, outras sem— em diversos locais, além de mais de duas dezenas de dados sobre ele. Tais dados incluem se ele estava em uma lista de passageiros que não se apresentaram para um voo, seu passaporte e tipo de visto, ligações suspeitas com terroristas e comentários de informantes sobre ele.

Mesmo assim, para muitos do setor da biometria, as conveniências dessa técnica superam os riscos. Eles imaginam um mundo no qual, em vez de depender de documentos de identificação que podem ser perdidos ou de senhas complicadas, bastaria desbloquear o smartphone e mostrar seu rosto para ter acesso a bancos e edifícios residenciais.

Mas Atick dá um contraexemplo: o aplicativo NameTag, que estava disponível para pessoas que testavam o Google Glass. Os usuários tinham apenas que olhar para um estranho e o NameTag fornecia o nome, a profissão e informações do perfil público dessa pessoa no Facebook. "Basicamente estamos permitindo que nossos concidadãos nos vigiem."

Suas apreensões são compartilhadas pelo senador americano Al Franken, democrata de Minnesota e presidente do subcomitê do Senado para privacidade, tecnologia e direito. Franken solicitou que o lançamento público do NameTag fosse adiado. No fim de abril, o desenvolvedor do aplicativo disse que acataria o pedido. O Google declarou que não aprovará aplicativos de reconhecimento no Google Glass.

Mas, nos últimos anos, o Google e outros gigantes de tecnologia têm comprado start-ups de reconhecimento facial. Recentemente, pesquisadores do Facebook disseram que a empresa desenvolveu um sistema de reconhecimento-padrão chamado DeepFace, com precisão quase humana para identificar rostos de pessoas.

Nos EUA, nenhuma lei federal rege o reconhecimento facial, embora uma divisão do Departamento de Comércio esteja trabalhando para elaborar um código de conduta voluntário.

Alguns usos do reconhecimento facial já estão disseminados. É isso que permite que o Facebook e o Google Plus sugiram automaticamente legendas com os nomes de seus amigos em fotos.

Embora seja um fenômeno relativamente recente, o reconhecimento facial automatizado em tempo real já é usado em operações legais e cassinos. No Japão, algumas mercearias usam a comparação facial para classificar certos clientes como gatunos ou "reclamões".

Em um edifício residencial de 1.600 apartamentos, em Manhattan, as cancelas se abrem quando os moradores passam pelas portas. Ele é uma vitrine para a FST Biometrics, empresa israelense que tem um software de reconhecimento facial e de movimento.

"Essa tecnologia tornará chaves, cartões e códigos obsoletos", disse Aharon Zeevi Farkash, presidente da empresa FST. "Seu rosto, seu comportamento e seus dados biométricos constituirão a chave de acesso a quase tudo."

Farkash acredita que sistemas como esse logo darão fim ao demorados e incômodos procedimentos de segurança na maioria dos aeroportos. "O mercado precisa de mais praticidade nas questões de segurança", disse ele. Atualmente, o sistema da empresa está sendo testado em um aeroporto.Farkash, general da reserva do Exército israelense, ficou interessado na biometria devido a duas tendências globais: o crescimento de megalópoles e o fascínio dos terroristas por populações densas.

Se todos "os mocinhos" se apresentassem voluntariamente para gravar seus rostos, teoriza ele, "os bandidos" seriam identificados mais facilmente. A vigilância pública em massa, diz, daria mais segurança a todos nós.

Como é o caso de muitas tecnologias, a biometria divide dois grupos: os que acham que a tecnologia precisa ter regras e regulação para prevenir violações de liberdades civis e os que temem que a regulação engesse a inovação.

"O reconhecimento facial envolve pesquisas multidisciplinares que têm sérias consequências para a privacidade e a proteção dos consumidores e dos direitos humanos", postou recentemente Jeffrey Chester, diretor-executivo do Centro para Democracia Digital, organização sem fins lucrativos, em um blog.

"Diretrizes agora poderiam impedir avanços em um mercado muito promissor e afugentar investimentos", escreveu Paul Schuepp, presidente da Animetrics, empresa que fornece sistemas móveis de reconhecimento facial para militares, no blog da empresa.

O doutor Atick tem uma opinião mais ponderada. Ele acredita que as empresas deveriam tomar algumas providências, como: declarar publicamente onde usam reconhecimento facial; pedir permissão ao consumidor antes de coletar uma impressão facial com um identificador único e passível de reprodução —como um nome ou código numérico—; e usar impressões faciais apenas para a finalidade específica para a qual receberam permissão.

Matt Kallman, porta-voz do Google, declarou que a empresa está "participando de debates para transmitir nossa visão de que o setor deveria assegurar que a tecnologia esteja alinhada com as expectativas das pessoas".

Porta-voz do Facebook, Jodi Seth disse que a empresa está em diálogo com a Agência Nacional de Informação e Telecomunicações. "Mas até que haja um código de conduta, não podemos dizer se iremos concordar com todos os seus termos."

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