• Carregando...
 |
| Foto:

Técnica elucidou funcionamento de 10 mil genes

São Paulo – O modelo animal dos camundongos nocautes é amplamente usado hoje em vários laboratórios do mundo. Em todas as experiências com animais "nocauteados’’ feitas até agora, estima-se, 10 mil genes foram desligados. Isso é quase metade do genoma dos mamíferos.

A técnica é útil tanto para a indústria farmacêutica quanto para a agropecuária e a biotecnologia, além de servir como ferramenta para a pesquisa básica – o que fará aparecer muitas terapias no futuro.

"Quase todos os medicamentos hoje são testados em animais nocautes para saber se existem reações colaterais’’, diz João Pesquero, da Unifesp. Segundo um estudo na revista "Nature Reviews’’, de 2003, as cem drogas mais vendidas do mundo (do Viagra ao Xenical) foram testadas em nocautes.

O cientista cita o exemplo do rimonabant (droga antiobesidade), que age em uma proteína produzida por um tipo de receptor endocanabinóide.

Ela foi testada em animais que não produzem a proteína, ou seja, os nocautes, para saber se era específica para aquele alvo molecular.

Estocolmo – Um camundongo manipulado geneticamente somado a um punhado de células-tronco embrionárias é igual a um terço de Prêmio Nobel. A receita, que hoje é fundamental para colocar um novo antidepressivo ou um antiinflamatório no mercado, acaba de ser rotulada como revolucionária pelo Instituto Karolinska, que anunciou ontem, em Estocolmo (Suécia), os vencedores do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2007.

Os laureados são dois norte-americanos naturalizados, Mario Capecchi (que nasceu na Itália), Oliver Smithies (que veio do Reino Unido) e o britânico Martin Evans. Eles vão dividir, em partes iguais, a quantia de US$ 1,5 milhão (cerca de R$ 2,8 milhões).

"É sensacional. Essa é uma tecnologia importante. Era até esperado que eles ganhassem o prêmio’’, comemorou Lygia Pereira, pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP). Ela aplica no Brasil, desde 2001, a técnica desenvolvida nos anos 1980 pelos cientistas agora laureados (que se tornou parte fundamental do kit de ferramentas da biologia no mundo todo): o chamado nocaute genético, no qual camundongos têm um gene específico desligado, ou "nocauteado’’.

O desligamento permite observar, no modelo animal, qual é o papel que aquele gene desempenha no organismo, e que tipo de doenças sua falta pode causar (ou sanar). Os roedores "nocaute" têm ajudado os cientistas a estabelecer o papel de genes individuais em uma série de moléstias, que vão da pressão alta a vários cânceres.

Segundo Carlos Menck, também da USP, os trabalhos feitos por Capecchi e Evans, principalmente, são fundamentais. "Eles estão na bibliografia do meu curso de pós-graduação’’. Menck usa roedores nocaute para estudar doenças de pele.

Células-tronco

Em linhas gerais, principalmente Capecchi e Smithies, trabalhando em colaboração mas de forma independente, descobriram como manipular em larga escala nos animais o processo natural da recombinação homóloga – troca de seqüências de DNA iguais entre os cromossomos.

Mas, para isso – e aqui entra a colaboração de Evans –, as células-tronco embrionárias, que o cientista britânico isolou pela primeira vez há quase 30 anos são fundamentais. Essas células, que apresentam uma incrível capacidade de originar novos tecidos – como se viu só depois –, dão origem a animais com o traço genético desejado.

Sabendo que a recombinação homóloga é um processo natural, os cientistas manipulam as células – tronco de um embrião de camundongo e colocam nelas um pedaço de DNA que desliga o gene de interesse. Essas células, então, são injetadas em um embrião, chamado mosaico ou quimera, que passará a mutação para alguns de seus filhotes.

"Sem as células-tronco não se consegue fazer o animal nocaute’’, explica o pesquisador João Bosco Pesquero. No laboratório da Unifesp, o cientista também usa os animais com genes desligados. "Aqui trabalhamos com a obesidade. Ou seja, o animal com determinados genes nocauteados acaba protegido do ganho de peso.’’

Ontem, ao receber a notícia dos Nobel, o pesquisador da Unifesp teve um pensamento positivo e outro negativo. "O prêmio é merecido. Mas estamos organizando um congresso aqui para o início do ano que vem e o Smithies já tinha até confirmado a sua presença. Espero que ele mantenha.’’

Preocupação

A frase dita ontem exatamente por Smithies pode preocupar: "Espero que a minha vida não mude muito agora’’.

Pesquero conheceu o professor americano na Alemanha neste ano, quando ambos ganharam um outro prêmio científico. "Pelo menos posso dizer que estou no caminho certo.’’

Acordado às 3 h da madrugada pela ligação de Estocolmo – os organizadores avisaram antes os vencedores e depois fizeram o anúncio oficial, o que não é comum – Capecchi estava eufórico. "A voz do outro lado do telefone era tão séria que nada parecia muito real’’, comentou.

Apesar de ter chegado ainda criança aos EUA, o pesquisador de origem italiana teve que viver como menino de rua na sua Verona natal.

O outro integrante do trio também estava empolgado. "Estou absolutamente encantado. É o apogeu da minha carreira’’, resumiu Evans.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]