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Líder do Partido Brexit, Nigel Farage, em frente a um local de votação das eleições para o Parlamento Europeu, no Reino Unido
Líder do Partido Brexit, Nigel Farage, em frente a um local de votação das eleições para o Parlamento Europeu, no Reino Unido| Foto: Ben STANSALL/AFP

As eleições para o Parlamento Europeu começaram nesta quinta-feira (23), dando aos nacionalistas a chance de expandir seu poder na União Europeia. Reino Unido e Holanda foram os primeiros a ir às urnas, enquanto a maioria dos países vota no domingo.

Realizada a cada cinco anos, a votação é o segundo maior exercício de democracia no mundo, após as eleições da Índia, e oferece a quase meio bilhão de cidadãos dos 28 países-membros do bloco a chance de eleger seus representantes para o legislativo europeu.

Desde a última eleição, em 2014, a União Europeia foi abalada por uma crise de refugiados, vários ataques terroristas em massa, um voto do povo britânico para sair do bloco, o alarme de segurança sobre uma possível interferência russa e pela recuperação econômica da crise financeira global.

Mais do que em anos anteriores, os eleitores farão escolhas fundamentais sobre a trajetória da UE. As opções mais moderadas que dominaram as eleições passadas ​​estão dando lugar a decisões rígidas sobre a natureza do bloco europeu - ou, até mesmo, se deveria haver um bloco.

Os eurocéticos aparecem nas urnas há décadas, mas eles nunca exerceram tanta influência ou pareciam estar prestes a controlar uma parcela substancial dos 751 assentos.

"Estamos prontos para dizer hoje que o dia da glória chegou", declarou a francesa Marine Le Pen, líder da Frente Nacional e deputada da Eurocâmara, em um comício em Milão, no sábado, ao lado de líderes anti-imigração de todo o continente. "Dizemos não a essa imigração que está submergindo nossos países e que coloca em risco a segurança de nossos povos, nossos recursos e nossos valores civilizacionais".

De grandes palácios em Roma a vilas art nouveau em Budapeste, os nacionalistas da Europa têm preparado seus aríetes para derrubar as portas do Parlamento Europeu. Ninguém espera que eles conquistem a maioria, mas seu objetivo é mais obstruir do que legislar.

"Esta eleição é crucial para o futuro da Europa e da União Europeia", disse David McAllister, um parlamentar alemão de centro-direita que dirige o comitê de relações exteriores do Parlamento Europeu. "Os nacionalistas, os populistas e os demagogos querem destruir a cooperação europeia".

Espera-se que os tradicionais partidos de centro-esquerda e centro-direita – que já enfrentam dificuldades na última vez – percam espaço para partidos mais distantes do espectro político.

"A questão mais importante na eleição europeia não é a direita versus a esquerda - a antiga e tradicional fragmentação ideológica", disse Peter Kreko, diretor executivo do Instituto de Capital Político, com sede em Budapeste. "É muito mais importante a relação tradicionais versus extremos".

E essa proporção parece estar prestes a mudar significativamente, embora não radicalmente, à medida que a votação acontece pela Europa ao longo do fim de semana. A maioria dos países votam domingo (25).

A maior mudança, de acordo com as previsões baseadas em pesquisas, é que as famílias políticas de centro-direita e de centro-esquerda que dominaram Bruxelas provavelmente perderão a maioria combinada. As últimas projeções mostram que, juntas, elas caíram de 53% dos votos para 42%.

Para continuar a governar como uma grande coalizão – como eles fazem agora – eles precisarão de parceiros adicionais.

Espera-se que os partidos nacionalistas, populistas e de extrema direita passem a compor um quarto dos assentos – atualmente eles detém um quinto. Outros, incluindo partidos liberais na economia e ambientalistas, também devem ganhar mais espaço.

Os eurocéticos

Paradoxalmente, o Parlamento Europeu tem sido, por muito tempo, uma fonte de sustentação para os políticos eurocéticos. Até recentemente, poucos cidadãos europeus prestavam muita atenção à legislatura. O comparecimento às urnas é muitas vezes menor do que nas eleições nacionais, favorecendo extremos apaixonados que podem mobilizar sua base. E uma vez no cargo, os legisladores podem usar subsídios generosos para reforçar sua marca e sua legitimidade doméstica.

Os poderes dos legisladores são limitados. Eles não podem propor diretamente uma legislação, apenas aprovar reformas - como a revisão da privacidade de dados que entrou em vigor no ano passado. Questões de segurança e política externa ficam nas mãos dos líderes nacionais. Ainda assim, o Parlamento Europeu aprova os líderes seniores do bloco e as despesas da União Europeia.

As mudanças de representação deste ano podem ser relativamente modestas, mas podem ter um impacto desproporcional em como a UE funciona.

"Mesmo com uma porcentagem relativamente pequena dos votos, o potencial de deslegitimar o Parlamento Europeu é bastante forte", disse Almut Möller, co-diretor do escritório do Conselho Europeu de Relações Exteriores em Berlim. "Bruxelas está acostumada a operar de acordo com o consenso de Bruxelas. Agora a imagem será diferente".

Uma legislatura com menos capacidade de fazer as coisas alimentaria a narrativa dos críticos nacionalistas da UE, que argumentam que o bloco está fundamentalmente quebrado. O caos desencadeado pelo Brexit acalmou as demandas para uma saída da UE em outros países, mas os líderes eurocéticos ainda querem cortar seus poderes e reconstruir as barreiras entre os países.

"Se o seu objetivo é destruir a UE, então a estagnação é uma coisa muito boa", disse Marietje Schaake, deputado europeu da Holanda, de um partido de centro.

Para que os críticos da Europa exerçam a máxima influência, eles precisarão trabalhar juntos - algo que não conseguiram fazer até agora.

Os nacionalistas estão, agora, distribuídos em três blocos separados no Parlamento Europeu, com diferenças pessoais e políticas que se colocam no caminho da formação de uma coalizão nacionalista. Um dos assuntos que os dividem é a Rússia, já que os eurocéticos da Europa Ocidental tendem a admirar o Kremlin, enquanto seus colegas do leste europeu têm um pé atrás com Moscou.

Dos tradicionais para os alternativos

Atrasar o avanço dos eurocéticos é sinal de que, pelo menos em alguns lugares, seu momento pode estar passando.

Os nacionalistas são, inquestionavelmente, mais populares agora do que durante a última votação, em 2014, mas seu apoio em muitos países se nivelou à medida que a memória da crise de refugiados de 2015-2016 diminui.

Na Alemanha, por exemplo, o partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD) deve quase dobrar sua participação em relação à última eleição da UE, quando o partido era um recém-chegado protestando contra resgates de imigrantes na Costa da Grécia. Pesquisas recentes, porém, mostram que o partido não ganhou apoio desde os 12,6% de votos que obteve nas eleições nacionais de 2017, e pode até ter perdido um pouco.

"Essas eleições são parte da grande mudança na política - elas estão longe do antigo normal, mas ainda não chegamos lá", disse Heather Grabbe, diretora do Open Society European Policy Institute. "O que você vê em toda a Europa é que as pessoas se mudam dos partidos tradicionais para partidos alternativos".

Outro fator decisivo para os populistas será o resultado da Áustria, onde o governo entrou em colapso de forma espetacular na segunda-feira, depois que um vídeo revelou o líder do principal partido de extrema direita do país aparentemente disposto a negociar com os russos. O escândalo condenou uma coalizão entre centro-direita e direita populista, que alguns defendiam como um futuro alternativo para a Europa, além das coalizões de esquerda-direita que dominaram o bloco.

A participação do Reino Unido na eleição pode ser um refresco para os eurocéticos, com o Partido do Brexit, de Nigel Farage, que deve ter uma boa votação nesta quinta-feira. Mas os legisladores deixarão o Parlamento Europeu se o Reino Unido conseguir finalmente deixar o bloco.

Na França, o presidente Emmanuel Macron classificou a eleição como uma chance de avançar para uma Europa mais integrada, mas que melhor responde às inseguranças que alimentaram os movimentos nacionalistas. Ele fez campanha de forma agressiva e efetivamente "declarou a eleição como um referendo sobre sua presidência", segundo escreveu a consultoria política do Eurasia Group em uma análise publicada nesta semana.

Como funciona o Parlamento Europeu

A legislatura de 751 membros é mais notável por ser, como diz Deutsche Welle, "a única instituição supranacional democraticamente legitimada no mundo". Em outras palavras: é a única assembleia onde as populações de vários países podem votar diretamente em seus representantes. É também notável pelo grande número de eleitores nas suas eleições. Mais de 370 milhões de pessoas são elegíveis para votar, tornando estas as segundas maiores eleições do mundo.

Os membros do Parlamento Europeu são enviados como representantes dos 28 países da UE. Cada país decide como as eleições são realizadas. Vale tudo, desde que as cédulas sejam secretas e mulheres e homens possam votar (a idade mínima para votar é 18 em todos os países,  menos na Áustria, onde é 16).

Os assentos são distribuídos para cada país de acordo com o tamanho de sua população. A Alemanha, o estado mais populoso da UE, tem 96 representantes, enquanto países pequenos como Chipre, Malta e Luxemburgo têm seis cada. Dito isto, os membros do Parlamento Europeu - ou deputados - nem sempre votam ao longo das linhas de nacionalidade. Uma vez eleitos para o Parlamento Europeu, eles se juntam a partidos e coalizões maiores.

Os deputados são eleitos para mandatos de cinco anos e têm voz nas finanças do bloco, presença internacional e direção geral. Desde o Tratado de Lisboa, de 2009, que ampliou os poderes do órgão, o Parlamento Europeu nomeou o chefe da Comissão Europeia, órgão executivo da UE, aprovou ou rejeitou acordos internacionais e decidiu o orçamento total da UE. O corpo está envolvido em decisões sobre uma vasta gama de tópicos, incluindo agricultura e pesca, questões ambientais e políticas de migração.

Existem oito grupos políticos no Parlamento Europeu. Formar um grupo requer pelo menos 25 membros, de pelo menos sete países. Os maiores grupos são o Partido Popular Europeu (EPP), de centro-direita, e os Socialistas e Democratas, de centro-esquerda.

Reino Unido e Holanda votam neste quinta-feira; a Irlanda vai às urnas na sexta (24); República Checa, Letônia, Malta e Eslováquia, no sábado (25); e os outros países, no domingo (26).

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