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EUA enfrentam crise sem precedentes com o fentanil, droga sintética 50 vezes mais potente que a heroína
EUA enfrentam crise sem precedentes com o fentanil, droga sintética 50 vezes mais potente que a heroína| Foto: EFE/Mauricio Dueñas Castañeda

A cidade de Nova York divulgou recentemente um relatório que revela um grave problema de saúde pública: um recorde de mortes por overdose.

De acordo com os dados oficiais da prefeitura, somente no ano passado, foram contabilizadas 3 mil mortes por uso de drogas, o equivalente a 43 casos a cada 100 mil habitantes, um número 12% maior do que o ano anterior e a taxa mais elevada registrada desde que a cidade começou a fazer o levantamento, em 2020.

Isso mostra uma trágica realidade que tem afetado cada vez mais estados americanos, matando milhares de pessoas todos os anos, principalmente após a chegada dos novos opioides sintéticos como o fentanil, droga 50 vezes mais potente que a heroína e que foi responsável por 81% das overdoses fatais relatadas em Nova York e 76% em todo o país no ano passado.

Tamanho é o problema que procuradores-gerais e representantes de 18 estados enviaram uma carta ao presidente Joe Biden solicitando que o fentanil fosse classificado como uma "arma de destruição em massa".

No texto enviado à Casa Branca, os governos estaduais dizem que em 2022 foi apreendida uma “quantidade suficiente da droga para matar todos os homens, mulheres e crianças no país várias vezes".

A nível nacional, os números assustam ainda mais. Segundo o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, 109.680 overdoses fatais foram relatadas no ano passado. Dessas mortes, 79.770 envolveram os opioides, substâncias químicas muito usadas pela medicina para tratar pacientes com dor aguda.

É um número superior ao de mortes de americanos na Guerra do Vietnã (58.220).

Até algumas décadas atrás, os opioides eram usados basicamente para controlar dores crônicas, contudo, devido aos seus efeitos analgésicos e sedativos potentes, tais medicamentos têm virado cada vez mais uma mercadoria fabricada pelo mercado ilegal de drogas, que expandiu seu consumo principalmente entre os mais jovens, com finalidades recreativas.

Dados do governo americano mostram que o Oregon é atualmente o estado que enfrenta o maior crescimento da taxa de mortalidade relacionada às drogas entre os adolescentes.

Um artigo do portal da revista americana National Review relacionou esse fato à aprovação de uma lei estadual que descriminalizou a posse de todos os entorpecentes, incluindo heroína e metanfetaminas, para uso pessoal, em 2020. Desde então, a situação descontrolada se mostra cada vez mais distante de acabar.

O início da crise 

A minissérie "Império da Dor", disponível na plataforma Netflix, apresenta a origem da atual “epidemia” dos opiáceos sintéticos nos EUA, um problema que começou ainda na década de 1990 e ganhou novas formas nos últimos anos.

Os produtores da obra remontam ao ano de 1996, quando houve o lançamento de uma nova fórmula do opioide sintético oxicodona, medicamento mais potente que a morfina, lançado pela farmacêutica Purdue, que hoje é processada na Justiça americana por provocar dependência química em seus milhares de usuários.

A propaganda para venda do produto à população defendia que não havia riscos de vício no uso da substância. Com isso, o consumo era feito por meio de parcerias com médicos pelo país, que assinavam receitas autorizando seus pacientes - até com dores intermediárias - a consumir a droga.

As vendas chegaram até as áreas rurais dos EUA, onde havia muitos trabalhadores braçais e atletas com constantes lesões e dores musculares, um público ideal para a farmacêutica. Dados referentes à Purdue apontam que o lucro com a droga sintética até 2016 foi de US$ 35 bilhões (R$ 180 bilhões).

Como resultado do sucesso do medicamento e sua introdução na sociedade, cerca de meio milhão de americanos morreram de overdose causada por opiáceos desde então.

O alto consumo e as overdoses fatais levaram o governo americano a buscar alternativas para administrar a crise que tomou conta do país, com gastos públicos que chegavam a US$ 80 bilhões (cerca de R$ 412 bilhões) por ano.

Informações oficiais mais recente, de 2020, mostram que o custo do governo somente com a crise dos opioides atingiu quase US$ 1,5 trilhão (cerca de R$ 7,74 trilhões) aos EUA, o equivalente a 7% do PIB.

A empresa responsável pela formulação do novo problema de saúde pública nos EUA foi investigada e teve que restringir o seu produto para a população, no entanto, isso aconteceu com a crise já formada.

Com isso, os usuários da oxicodona perderam o acesso à droga sintética nos consultórios médicos e encontraram uma nova nas ruas: a heroína, antecessora do fentanil.

Por ser uma droga ilegal, a heroína virou uma dor de cabeça ainda mais complicada para o governo americano, que tentou endurecer as leis relacionadas ao consumo de entorpecentes, mas fracassou gestão após gestão. Com a introdução do fentanil, uma nova tentativa surgiu para tentar controlar a crise dos opioides.

De acordo com um levantamento da emissora britânica BBC, ao menos 46 dos 50 estados americanos apresentaram projetos de lei aumentando as penas mínimas para crimes relacionados à nova substância sintética neste ano.

Uma das propostas é a introdução das "leis de homicídio induzido por drogas", nas quais uma pessoa pode ser responsabilizada pela distribuição da substância que provoca a morte por overdose de um usuário e ser processada por homicídio.

Apesar da descriminalização das drogas ser um assunto que divide as pautas republicanas e democratas, a atual crise contribui para um consenso político entre as partes, que geralmente passam os projetos por unanimidade nas casas legislativas.

Na semana passada, o Departamento de Justiça dos EUA sancionou oito empresas com sede na China e 12 executivos por estarem envolvidos com a produção, distribuição e importação de fentanil e outros opioides sintéticos, sendo responsáveis por parte da crise no país.

Com isso, essas empresas foram proibidas de fazerem negócios nos EUA e utilizarem seu sistema financeiro.

A crise do fentanil 

A chegada do fentanil à liderança de consumo de drogas nos Estados Unidos é um fenômeno recente que tem deixado marcas profundas no país. Hoje, 66% das mortes por overdose de opioides nos EUA são causadas pelo fentanil.

Segundo as autoridades americanas, os insumos da droga sintética são fabricados na China, mas a venda acontece por meio de cartéis mexicanos, sendo os principais o de Sinaloa, administrado pelos filhos do traficante El Chapo, e de Jalisco, duas regiões reconhecidas internacionalmente como grandes pólos do narcotráfico no mundo.

Como mostra a minissérie da Netflix "Drogas, oferta e demanda", por ser sintética, a fabricação do fentanil é mais fácil e barata do que outros entorpecentes como a cocaína, que depende do cultivo de coca. Entre os ingredientes usados para potencializar seus efeitos estão a gasolina, a heroína e outras substâncias tóxicas, que podem levar uma pessoa à morte com apenas dois miligramas da substância.

O fácil acesso às drogas nos EUA faz com que o país tenha taxa de mortes por overdose 20 vezes maior em relação à média global.

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