Tanques abandonados da petrolífera venezuelana PDVSA, em El Tigre, no Norte da Venezuela| Foto: New York Times

Milhares de trabalhadores estão largando a empresa estatal de petróleo da Venezuela, abandonando postos que já foram cobiçados, mas que hoje estão desvalorizados pela pior inflação do mundo. E agora essa sangria ameaça as chances da nação de superar seu longo colapso econômico, dizem líderes sindicais, executivos do petróleo e funcionários. 

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Trabalhadores desesperados e criminosos também estão levando equipamentos vitais da empresa, além de veículos, bombas e fiação de cobre, carregando o que podem para ganhar algum dinheiro. Essa diminuição de pessoal e equipamentos incapacita ainda mais uma estatal que oscila há anos, mas que ainda é a fonte de renda mais importante do país. 

 Pior momento para Maduro

O momento não poderia ser pior para o presidente cada vez mais autoritário da Venezuela, Nicolás Maduro, que foi reeleito no mês passado em um pleito amplamente condenado por líderes em todo o hemisfério, uma vez que políticos proeminentes de oposição foram impedidos de disputá-lo, aprisionados ou exilados. 

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 Mas, embora Maduro tenha firme controle político, a nação está de joelhos economicamente, aprisionada pela hiperinflação e por um histórico de má gestão. Fome generalizada, conflitos políticos, carência devastadora de remédios e um êxodo de mais de um milhão de pessoas nos últimos anos, geraram no país que já fez inveja econômica a muitos de seus vizinhos uma crise que se alastra por fronteiras internacionais. 

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Maduro só encontrará uma maneira de sair dessa situação usando o petróleo: praticamente a única fonte de renda de uma nação com as maiores reservas do mundo, segundo estimativas.  Mas a cada mês, a Venezuela produz menos. 

 Os escritórios da companhia petrolífera estatal estão se esvaziando, as equipes no campo operam pela metade, caminhões são roubados e materiais vitais desaparecem. Tudo isso está aumentando seus problemas gravíssimos, que já eram sérios por causa da corrupção, da parca manutenção, das dívidas incapacitantes, da perda de profissionais e até mesmo da falta de peças sobressalentes. 

 Agora, trabalhadores de todos os níveis estão se afastando em grande número, às vezes literalmente levando pedaços da empresa com eles. 

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De sonho a pesadelo

 Um trabalho na Petróleos de Venezuela, conhecida como PDVSA, costumava ser o ingresso para o Sonho Venezuelano. Já não é mais. 

 Acredita-se que a inflação no país chegue a surpreendentes 13 mil por cento neste ano, de acordo com o Fundo Monetário Internacional. Quando o New York Times entrevistou um funcionário do setor petroleiro, Carlos Navas, em maio, o salário mensal de alguém em um cargo como o dele mal dava para comprar um frango inteiro ou um quilo de carne; porém, com os preços subindo tão rapidamente, agora ele compra ainda menos. 

 A estatal petrolífera não está indo muito melhor. A produção está em seu nível mais baixo em 30 anos e a queda não dá sinal de que vai arrefecer. 

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 A empresa e o governo devem mais de US$50 bilhões em títulos, pois pararam de pagar juros desde o ano passado. A China recusou-se a continuar emprestando dinheiro à Venezuela em troca de futuros pagamentos em petróleo. 

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 As exportações dessa commodity também estão sendo interrompidas por ações legais. Nas últimas semanas, tribunais decidiram que a ConocoPhillips, uma companhia petrolífera dos EUA, poderia apreender carregamentos venezuelanos em refinarias e terminais de exportação em várias ilhas holandesas do Caribe. A ação resultou da decisão da Venezuela de nacionalizar ativos petrolíferos estrangeiros há uma década. 

 E em termos domésticos, teve tantos problemas com refinarias e outras instalações petrolíferas que precisou importar gasolina para o mercado interno, gastando dólares que não tinha. 

 Queda livre

Maduro ordenou a detenção de dezenas de gerentes da estatal petrolífera, incluindo o ex-presidente da empresa, no que descreve como repressão à corrupção. Mas a atitude tem as características de uma batalha pelo controle e pelo acesso à receita do petróleo. Em novembro, Maduro instalou um general da Guarda Nacional, Manuel Quevedo, sem experiência na área, para comandar a companhia.  O resultado é uma empresa em queda livre. 

 Em um discurso depois de sua reeleição, Maduro disse que a produção de petróleo deste ano deve aumentar em um milhão de barris por dia, tarefa aparentemente impossível, sugerindo que poderia buscar mais investimento de governos amigáveis, como o da Rússia e da China. 

 "Temos que produzir mais um milhão de barris! Quem vai fazer isso? Maduro?", gritou ele. A resposta: os trabalhadores da PDVSA. 

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 Na área em torno de El Tigre, muitas das operações são geridas pela estatal petrolífera em joint ventures com entidades estrangeiras, incluindo empresas ocidentais como a Chevron e a Repsol da Espanha, além estatais como a China National Petroleum Corp. e a Rosneft, da Rússia. 

 Dificuldade para trabalhar

Os executivos do setor citam a dificuldade de trabalhar na Venezuela com o declínio das condições sociais. "As pessoas estão famintas", disse Eldar Saetre, executivo-chefe da Equinor, o gigante de petróleo norueguês que trabalha com a PDVSA. 

 Entrevistas com mais de uma dúzia de funcionários atuais e antigos revelaram uma revolta profunda. Os trabalhadores, muitos dos quais preferiram não ser identificados porque temiam a retaliação, disseram que a empresa venezuelana vinha decaindo há anos, mas que agora o processo se acelerou.  "Era uma taça de ouro, não de prata. Ouro puro. Agora é de plástico", disse um deles. 

 Lamentam o fato de o seguro de saúde de uma vida toda agora valer pouco porque a estatal deixou de pagar às clínicas privadas. Empregados de campo se queixaram de que as refeições às vezes não chegam porque a empresa não paga o fornecedor. 

 Além disso, há o roubo de equipamento essencial. Uma visita às instalações petrolíferas em torno de El Tigre mostrou um cenário devastador. 

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Em várias estações de bombeamento e nos tanques, os ladrões haviam destruído instalações elétricas para retirar o cabo de cobre. Em um dos locais, nove transformadores haviam sido arrancados de postes e as partes de cobre foram levadas, desativando sistemas de controle vitais. 

 Muitas bombas estavam ociosas. Em um poço, o motor havia sido roubado. Havia brechas nas cercas e os portões ficavam abertos, deixando as instalações desprotegidas. Um empregado disse que uma unidade da Guarda Nacional designada para patrulhar a área ficou inativa por meses porque seu veículo quebrou e não havia peças sobressalentes para consertá-lo. 

 As instalações mostraram uma negligência profunda. Muitas tiveram derramamentos de óleo causados por tanques, tubulações ou válvulas danificadas. Em um local, dois tanques enormes foram cercados por um enorme lago negro de petróleo cru que havia vazado. 

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Os trabalhadores dizem não saber quem está por trás dos roubos. Acreditam que gangues criminosas podem ser culpadas, mas alguns reconheceram que desmantelar sistemas elétricos exige um conhecimento que apenas funcionários possuíam. 

Ali Moshiri, o principal executivo da Chevron para a América Latina até o ano passado, disse que os roubos nos campos petrolíferos da Venezuela eram um fato há 20 anos. "Mas os furtos aumentaram", disse ele, citando-os como razão primordial para a queda da produção de petróleo. "Eles roubam seu carro, a estrutura dos poços se puderem. Aí derretem tudo, tiram peças e as vendem."  

"As pessoas estão desesperadas, e vendem o cobre para alimentar a família", acrescentou. 

 Trabalhadores e supervisores em El Tigre disseram que a produção dos poços existentes caiu e que a perfuração de novos poços estava basicamente paralisada pela falta de equipamentos, produtos químicos, peças de reposição e itens básicos, como alimentação para os trabalhadores. 

Fuga de talentos

 Um supervisor listou os vários destinos para os quais seus colegas haviam fugido: Estados Unidos, Argentina, Peru, Equador, Brasil, Colômbia e Espanha. Muitos saem sem aviso prévio e geralmente não são substituídos. Quando o são, os novos trabalhadores em geral têm pouca ou nenhuma experiência. 

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Junior Martínez, 28 anos, que trabalha na indústria petrolífera há oito anos, está reunindo documentos, incluindo seu diploma de engenheiro químico. A esposa e a filha foram embora há três meses para tentar ganhar dinheiro no Brasil.  "Recebo 1,4 milhão de bolívares por semana que não dá nem para comprar uma caixa de ovos ou um tubo de pasta de dentes", disse Martínez sobre seu salário. 

 Seu pai, Ovidio Martínez, 55 anos, recorda-se de sua infância aqui, quando o boom do petróleo começou, com poços brotando por todos os lados. Ele chorou ao falar da vontade do filho de deixar o país. "Você vê seus filhos indo embora e não pode detê-los", disse o Martínez mais velho, lutando contra as lágrimas. "Neste país, eles não têm futuro." 

 

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