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Policiais russos guardando a Praça Vermelha na última quinta-feira (29).
Policiais russos guardando a Praça Vermelha na última quinta-feira (29).| Foto: EFE/SERGEI ILNITSKY

Igor Strelkov, Aleksandr Khodakovsky, Rybar, Romanov, WarGonzo, etc... são talvez alguns dos nomes que não comumente vemos encabeçando as notícias da guerra que está chegando ao seu 500º dia. Anteriormente costumavam-se ver nomes como Putin e Zelensky e, em tempos mais recentes, Shoigu e Prigozhin; porém, com o desenvolvimento da guerra, os canais de Telegram tem se tornado uma fonte alternativa ao discurso oficial, principalmente no lado russo do conflito.

Enquanto as fontes oficiais ou da grande mídia relatam o posicionamento autorizado pelo Estado para aquele instante, para aquela determinada circunstância, os canais de Telegram “patrióticos” representam um espaço onde os poderes menos representativos política e financeiramente falam direta e indiretamente para milhões de pessoas. Enquanto os detalhes da negociação entre Prigozhin e Lukashenko permaneciam em sigilo, determinados canais já postavam informações acuradas sobre o tema, inclusive a de que o ex-chefe do Estado-Maior russo, Sergei Surovikin, teria participado – ou, no mínimo, se ausentado – perante o motim organizado pelo Wagner e estaria preso desde o dia 25 de junho.

Por que se deve prestar atenção a tais canais?

Em uma guerra onde as informações muitas vezes provem comunicados oficiais, ou de relatórios post factum de baixas e perdas, os canais do Telegram apresentam o retrato do que está se desdobrando naquele exato momento. Além disso, fora da orbita da mídia oficial, eles dão voz a comentaristas que expressam opiniões geralmente alinhadas com a narrativa geral da guerra, porém não com sua condução e objetivos. Por isto, além das opiniões, análises e perspectivas, tais canais recebem informações sigilosas de fontes nas mais altas esferas dos grupos de poder na Rússia, tornando-se porta-vozes destas.

Dentre os principais comentaristas independentes russos, talvez o mais vocal, capacitado e com as melhores e mais importantes conexões seja Igor Strelkov (Girkin), quem possui um mandado de prisão internacional expedido por Haia por sua participação na derrubada do voo MH-17 da Malaysia Airlines. Girkin é provavelmente o comentarista mais citado em fontes ocidentais que buscam informações pró-russas sem a marca da propaganda e do wishful thinking estatal, fazendo análises que a médio e longo prazo se mostraram muito acuradas. Já no primeiro dia de junho ele comentava sobre a situação do Wagner:

“Uma tentativa de golpe já foi anunciada. O que vai acontecer em seguida, eu não sei, principalmente porque o Wagner está sendo retirado com urgência para a retaguarda. Está claro que paira no ar um risco de golpe”, disse.

O ex-funcionário da KGB e supostamente do GRU (inteligência militar russa) se mostrou crítico da condução das hostilidades desde o princípio, fazendo críticas ferozes a Shoigu, Prigozhin e até mesmo diretamente a Putin. Antes mesmo dos grandes pacotes de ajuda militar ocidental chegarem à Ucrânia, ele chamava textualmente o presidente russo de “palhaço” por sua postura perante a condução da guerra. Por conta destes e outros episódios, ele recebeu denúncias formais de que estaria incorrendo no descrédito das forças armadas – tipificado como crime na Federação Russa – e por usar a palavra “Guerra” para descrever o que oficialmente o Estado chama de “Operação Militar Especial” – também um crime. Supostamente, por suas conexões nas altas esferas do poder, nenhuma das denúncias foi adiante.

Patriotas e Nervosos

O que já era uma oposição ferrenha à condução da guerra se acentuou nos últimos meses, com Girkin juntando-se a Pavel Gubarev, Maxim Kalashnikov e outras figuras não-alinhadas da Rússia para formar o “Clube dos Patriotas Nervosos”, uma espécie de organização guarda-chuva para os diferentes matizes do nacionalismo russo que consideram os esforços militares da Rússia na Ucrânia como insuficientes. Após o motim do Grupo Wagner, o Clube organizou uma conferência emergencial, onde acusou o presidente russo de desaparecer no momento em que o país mais precisava dele e de incompetência, pedindo que ele transferisse o poder para uma pessoa mais capaz.

“Se o presidente não assume a responsabilidade perante o povo por travar uma guerra grande e séria, como você pode esperar que outros oficiais sejam responsáveis ​​por suas ações?”, disse Strelkov.

Na última quinta-feira (29), em seu canal de Telegram, Girkin seguiu comentando as consequências do motim do Wagner e proveu os leitores com seu usual diagnóstico apocalíptico. Para ele, o período verdadeiramente turbulento na Rússia ainda está por vir, pois tornou-se clara a fragilidade do poder vigente, sendo que ele está convencido de que haverá uma redistribuição completa de poder no país, uma vez que o Sergei Shoigu e Valery Gerasimov saíram completamente desmoralizados da situação. Ele ainda critica que o Estado russo não está tomando as devidas providencias perante a gravidade da situação.

“Cheguei à conclusão de que nosso presidente enlouqueceu completamente. Embora o Sr. Biden fale regularmente todo tipo de bobagens, sua administração é mais ou menos adequada. Porém, juntamente com o Presidente, todo o aparato estatal superior e nós mesmos ficamos loucos!”, disse.

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