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A democracia tem enorme capacidade de absorver controvérsias e administrar conflitos. A nossa passa por um daqueles momentos que levaram, certa vez, o político baiano Otávio Mangabeira a compará-la "a uma plantinha tenra". E se essa frágil planta ainda não se pôde transformar na árvore frondosa capaz de dar abrigo às nossas aspirações de pleno desenvolvimento e de maior justiça social, devêmo-lo às distorções de nosso processo político-cultural servido por uma classe política que durante os anos do autoritarismo reclamou de seu afastamento do processo das decisões, mas, recolocada no poder, tem se servido dele para locupletar-se despudoradamente, deixando o povo cada vez mais desesperançado com ela. Esse quadro é ainda mais grave porque temos uma democracia mais de fachada do que real, de baixa representatividade, cujos objetivos e propósitos se perdem num emaranhado de interesses pessoais, corporativistas, regionalistas, afetados, ora por conotações ideológicas, ora pela prevalência do poder econômico onde a frouxidão partidária se traduz num amontoado de partidos sem expressão eleitoral que dificultam o encaminhamento e a aprovação de proposições importantes para a ação de governo. Essa dispersão enseja, no mais das vezes, a indisciplina partidária, ao sabor de interesses e de barganhas ocasionais.

O despreparo, o desinteresse, a omissão e o absenteísmo habitual de muitos dos nossos congressistas, que dificultam o cumprimento de prazos para a votação de matérias importantes, acabam ensejando a adoção de recursos que desmoralizam o Legislativo, como foram, no passado, a urgência, os decretos-lei e são, agora, as medidas provisórias, de que tanto se queixam alguns. Medidas importantes para o fortalecimento dos partidos, que haviam sido incorporadas à nossa legislação – tais como o instituto da fidelidade partidária e as rigorosas exigências para a criação e o registro de novos partidos políticos – foram afastadas sob a alegação de que se tratava de "entulho do autoritarismo", num revanchismo ridículo e demagógico de que muitos de seus autores mais tarde arrependeram-se, ao assistirem à proliferação de partidos sem nenhuma expressão.

A falência dos partidos, como canais eficazes de representação, de participação e de legítimos intermediários institucionais entre a nação e o governo é cada vez mais patente. Predominam os interesses setoriais, ao invés dos interesses gerais, que deveriam estar representados pelo Congresso. E cada grupo de pressão busca exercitar seu papel político diretamente, preenchendo o vácuo deixado pela inconsistência e pela omissão das agremiações partidárias. Não obstante, a democracia não se faz sem políticos, sem partidos ou sem Congresso. Há que conviver com eles na esperança de que a prática da democracia representativa leve a um contínuo aperfeiçoamento das instituições políticas e da participação popular no processo de escolha de representantes cada vez mais legítimos, honestos, competentes e confiáveis. E que, através deles, o Congresso Nacional reerga-se como Poder respeitado e cumpra a missão insubstituível que tem de representar legitimamente as aspirações populares. Caso contrário, a nossa desejada democracia continuará sendo aquela frágil e mofina plantinha de que nos falava Otávio Mangabeira.

Essas considerações parecem mais oportunas no momento em que a transformação do Partido dos Trabalhadores na "Geny" da política nacional é mais um lamentável exemplo do fracasso da classe política em corresponder às necessidades e esperanças do Povo Brasileiro. E nessa corrimaça sinistra de despudor, desfaçatez, negaças e espertezas, desaparecem os cúmplices que ajudaram a construir uma enorme falácia que há 25 anos vem enganando a opinião pública.

A grande imprensa que nela colaborou, assusta-se com a ineficácia de seu alardeado jornalismo investigativo – e é a jornalista engajada Miriam Leitão quem o reconhece em sua coluna de "O Globo" – que em muitos instantes só parecia ter olhos para tentar descobrir "os crimes da ditadura militar". Onde estão as reportagens de estrondo dos "caco barcelos" e dos "pedro bial"? Os nossos clérigos – que de há muito haviam colocado todas as pastorais da sua Igreja – dita Progressista – a serviço dos interesses políticos do PT, de suas facções e frentes – parecem atônitos e nem de longe dispostos a interceder para que no apedrejamento da "adúltera" só atirem a primeira pedra os que não tiverem pecado. Onde estão os intelectuais, artistas, músicos de protesto e seus quilométricos manifestos ou suas caravanas de solidariedade ao ditador do Caribe, cúmplices ou "inocentes úteis" na construção de uma enorme empulhação, hábeis em arranjar "bodes expiatórios" quando apanhados com a boca na botija? Farsas, velhas de muitos anos, que iriam permanecer ignoradas não houvesse o desatinado Roberto Jefferson dado o grito denunciando que o rei estava nu há muito tempo. A verdade é que a mitologia petista não teria sido construída sem o concurso de muitos cúmplices que hoje se omitem ou se escondem.

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