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O Brasil está vivendo a mais profunda crise política, social e ética da sua história recente, desde a implantação da Nova República com Tancredo e Sarney. Crise esta só comparável com a era Collor/Itamar Franco no início da década de 1990.

No campo político e ético, a República é abalada pelas denúncias de corrupção, caixa 2, mensalão, que envolvem as últimas eleições, a troca de partidos após a eleições por parte dos deputados e senadores, para constituir uma frágil base aliada do governo Lula e aprovar as reformas da providência, sindical e trabalhista – as duas últimas não concluídas.

O Congresso Nacional e o poder Executivo Federal estão no centro dessas denúncias e sofrendo um desgaste político profundo e, por pressão da opinião pública, sem condições até o momento de terminar tudo num acordão vergonhoso perante a nação.

É interessante observar que, apesar da crise, há um acordo que envolve as elites econômicas e suas representações políticas para fazer uma blindagem na política econômica e no presidente da República, fiador desta política comandada pelo Ministério da Fazenda e Banco Central.

Logo, é fácil compreender que a atual crise política e ética está profundamente ligada à política econômica. Pois o Congresso Nacional tem aprovado todas as medidas impostas pela área econômica para a preservação do Plano Real, herdado da era FHC e mantido na íntegra pelo atual governo.

Esta política econômica está centrada na ortodoxia monetarista de influência externa, a partir dos centros hegemônicos do capitalismo, principalmente os EUA, cujo receituário, imposto pelo FMI, é marcado pela geração do superávit primário que era de 4,75% do PIB saltando no governo atual para mais de 6% do PIB, o que representou em 2004 uma sangria de R$ 145 bilhões para o pagamento dos juros da dívida interna e externa e neste ano deve ultrapassar 185 bilhões de reais.

Esta política tem imposto pesados sacrifícios à população brasileira, pela estagnação econômica, o desemprego crescente, o arrocho salarial, a alta concentração de renda, onde 10% da população mais rica detém 50% da riqueza nacional.

A retomada do crescimento econômico é uma promessa que virou mito, devido à alta taxa de juros Selic de 19,75%, enquanto nas economias desenvolvidas é de 1% ao ano e na Argentina de 2,5%, razão pela qual a Argentina tem vivido um crescimento de quase 8% ao ano, enquanto o Brasil mantém-se em torno de 3%, um crescimento praticamente vegetativo.

Esta política econômica é mantida com mãos de ferro pelo Ministério da Fazenda e o Banco Central, que opera as mediadas econômicas, com a mesma equipe que vem desde a era FHC e com presidente que veio de um dos maiores bancos credores do Brasil, o banco de Boston.

É uma política econômica conservadora, orientada pelos pressupostos neoliberais do Estado enxuto, com as privatizações das estatais, o aperto fiscal, monetário e tributário, que já revelou seu fracasso.

A justificativa para a implantação do Estado enxuto era a de gerar recursos para investir em gastos sociais e na infra-estrutura e o que assistimos foi um desmonte do Estado, o sucateamento dos serviços públicos de educação, saúde, habitação e a destruição da infra-estrutura e a elevação brutal das tarifas de telefonia, energia e pedágio das empresas públicas e estradas privatizadas. As rodovias que continuam públicas estão destruídas pela falta de investimentos.

Portanto, as empresas e os bancos públicos privatizados são hoje os que mais dão lucros no país. O que temos hoje são poucos oligopólios que dominam o setor produtivo e financeiro cada vez mais lucrativos, sendo que o setor bancário gera mais lucro do que o setor produtivo. É o setor que mais centraliza capital, principalmente os bancos estrangeiros que passaram a atuar no país e o setor dinâmico da indústria como o setor automobilístico e eletroeletrônico.

Esta política econômica privilegia o mercado externo em detrimento do mercado interno, por isso impõe o arrocho salarial para restringir o consumo interno visando aumentar o excedente econômico para exportação.

O discurso oficial procura convencer a academia e a sociedade que não há como romper com esta política econômica devido as retaliações externas.

Este argumento não se sustenta, à medida que a crise econômica argentina demonstrou que é possível romper com essa lógica. O governo argentino diante da crise e do caos social e a pressão da sociedade, que impôs a renúncia de vários presidentes, obrigou o atual presidente da República a romper os acordos com os credores externos, desvalorizando a dívida externa argentina em 70% e dando prazo aos credores para assinar um novo acordo, tendo os mesmos assinado uma renegociação da dívida em menos de 30 dias.

O que falta ao governo brasileiro é determinação no enfrentamento aos bancos nacionais e internacionais que praticam juros exorbitantes e não têm nenhum interesse na liquidação das dívidas interna e externa, fontes inesgotáveis de seus lucros.

Lafaiete Neves é doutor em Economia pela UFPR, professor aposentado da UFPR e professor de Economia Política da PUCPR.

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