O nosso Judiciário vêm sendo cada vez mais acionado pelos homossexuais em busca de seus direitos. A evolução da sociedade e das famílias alimenta os principais temas julgados e debatidos nos tribunais brasileiros. Um dos pleitos mais comuns de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis, por ser ele o mais elementar, é o de reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo. A obtenção de tal direito é fundamental para que se atinjam outros tantos, dele dependentes. Exemplo disso é o direito de ser tido como herdeiro de companheiro falecido. O reconhecimento da união estável, nesse caso, é imprescindível, já que o parceiro sobrevivente jamais poderá ser herdeiro do outro, sem que lhe seja concedido tal direito, exceto se houver testamento feito em seu benefício.

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Porém, enquanto não há consenso entre nossos julgadores sobre a possibilidade de haver ou não união estável entre homossexuais, enquanto são discutidos textos legais ultrapassados por não contemplarem uniões homoafetivas, a sociedade já evoluiu e os casais homoafetivos apresentam anseios e necessidades de maior complexidade.

Recente discussão que exemplifica a tese é a do registro de filhos oriundos de relações homoafetivas. Muitos casais que já vivem uma união mais sólida e estável, apesar de não reconhecida pela lei, partiram em busca de filhos, seja através da adoção ou da inseminação artificial.

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Não raro, os parceiros homossexuais desejam ampliar suas famílias e utilizam-se dos recursos disponíveis para isso. Os homossexuais masculinos buscam cada vez mais a adoção de crianças e os casais formados por duas mulheres optam, na maior parte das vezes, pela inseminação artificial. É um direito que lhes é assegurado pela Constituição Federal, se partirmos do princípio que seus pilares são, entre outros, o direito à dignidade, liberdade e, principalmente, o direito à igualdade.

O debate torna-se mais complexo e delicado quando a questão envolve crianças nos lares de casais homoafetivos. Os preconceituosos gritam mais alto e o Poder Judiciário titubeia, pois engatinha ainda quando falamos na possibilidade da existência das uniões. Dois casos foram noticiados recentemente pela imprensa, quase que simultaneamente, com resultados não definitivos e diametralmente opostos. Dois casais de lésbicas optaram pela inseminação artificial. Um deles em São Paulo e outro em Santa Catarina, cujo processo foi levado a julgamento perante o Tribunal do Rio Grande do Sul, sempre o mais avançado ao tratar dos direitos homoafetivos.

A questão em ambos os processos é a mesma: os casais buscam registrar os filhos em nome das duas mães. No caso de São Paulo, o pedido de tutela antecipada para registro imediato das crianças dessa forma foi negado em uma primeira fase, mas isso não significa dizer que a causa esteja perdida. O juiz do caso optou por decidir se concederá tal direito às companheiras após obter mais informações. A sentença pode, e espera-se, ser favorável ao casal, já que ainda não houve decisão final.

No caso julgado no Rio Grande do Sul, o casal já alcançou seu objetivo, realizando o desejo de registrar os também gêmeos, em nome de ambas, com o sobrenome das duas companheiras. Por certo, outros casais farão tal pedido a nossos julgadores, sendo que ainda está longe de haver consenso entre eles sobre questão proposta há muito tempo que é o reconhecimento das uniões homoafetivas.

O Judiciário precisa se apressar sob pena de perder o bonde da modernidade. Mas o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não corre esse risco. Abriu as portas para o casal e para seus filhos gêmeos que poderão, a partir do êxito, vencida a barreira, viver em harmonia, já que finalmente foram vistos como um núcleo familiar que a nossa lei maior diz ser a base da sociedade. Não há texto legal nenhum de nosso país que afirme que tal base seja sedimentada apenas pela família heterossexual. Então, que sejam bem-vindas as novas famílias homossexuais. Que outras portas se abram!

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Sylvia Maria Mendonça do Amaral é advogada especialista em Direito Homoafetivo, Família e Sucessões. É autora do livro Manual Prático dos Direitos de Homossexuais e Transexuais. sylvia@smma.adv.br