Entra ano e sai ano e as notícias a respeito da dengue do Brasil se repetem. Estamos no fim do mês de abril e já foi registrado um aumento de 240% dos casos, mais de 400 mil pessoas infectadas e mais de 100 mortes.

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Os órgãos gestores alegam que a oscilação no número de casos é normal e que não estamos diante de uma epidemia. Contudo, não dá para negligenciar que a doença causa um impacto socioeconômico considerável, deixando os cidadãos em vulnerabilidade diante de um perigo que, até então, parece virtualmente impossível de controlar.

Parece que já foi tentado de tudo: desde artistas famosos dando recado na novela do momento ao controle químicos, biológico, manipulação genética, vistorias nas casas com autorização judicial...

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A pergunta que o cidadão faz é por que nada disso dá certo? É possível que um animalzinho tão insignificante perto da magnitude da humanidade possa ter um tal poder de interrupções de vidas?

Há quem diga que é uma doença democrática e mesmo atingindo altas classes sociais e megalópoles economicamente relevantes, deixa um lastro de impotência e de tristeza. Até onde se pode alcançar não é possível atestar falta de interesse científico, político e social na questão. As campanhas educativas atestam a responsabilidade do cidadão orientado por órgãos gestores e ONGs, mas ainda sem um controle efetivo.

A dengue não deve ser vista como o problema, mas como um termômetro de que algo na base está errado

Seria essa uma das vulnerabilidades da espécie humana à autonomia da mãe natureza? O problema da dengue é uma das catastróficas consequências da ação desmedida do homem contra a natureza e a favor do seu desenvolvimento tecnocientífico: o desmatamento, o aumento populacional, o crescimento desordenado dos centros urbanos e a introdução de espécies invasoras.

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Um dos principais mosquitos que transmite a dengue é africano, que veio para o Brasil trazido pelas próprias mãos do homem, assim como o caramujo africano, a abelha africana, os pombos, os ratos e tantas outras espécies que encontraram aqui condições ideais, ausência de competidores, excesso de refúgios e alimentos conferindo-lhe alcançar o status de “pragas urbanas”.

Infelizmente, algumas dessas espécies podem trazer algum dano material ou para saúde e, devido à resistência e resiliência intrínseca, uma vez instaladas, o extermínio deles parece de fato impossível.

A bioética ambiental é uma ferramenta que visa colaborar na resolução de problemas complexos, globais e plurais como a vulnerabilidade da população diante de desequilíbrios ambientais.

A dengue não deve ser vista como o problema, mas como um termômetro de que algo na base está errado. Cidadãos, comunidade, gestores e natureza devem estar em consonância na manutenção da teia de relações que é a ecologia urbana. Não é por estarmos nas cidades que deixamos de manter uma relação com o ambiente. O ecossistema se reestrutura e as escolhas de um irão impactar na vida do outro.

É preciso aplicar princípios de responsabilidade, precaução, comunicação e cuidado para que o ambiente esteja em equilíbrio. Portanto, a bioética propõe ser a ponte que promove o diálogo entre as ciências da vida e as ciências socais, que viabiliza uma ecologia social, em que questões aparentemente sem solução como a que estamos presenciando possam ter um final feliz.

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Marta Fischer, bióloga e doutora em Zoologia, é coordenadora do Ceua-PUCPR e professora titular do mestrado em Bioética da PUCPR.