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O pífio crescimento de 2,2% do Produto Interno Bruto brasileiro (PIB), entre janeiro e junho de 2006, quando confrontado com igual intervalo de 2005, atesta a desaceleração verificada na economia brasileira no corrente exercício. Em 12 meses, a expansão do sistema econômico do país foi de 1,7%. A modesta performance foi influenciada pelos setores industrial e de serviços que registraram variações de 2,6% e 2,3%, respectivamente, pois as atividades agropecuárias acumularam incremento de apenas 0,3%.

Conforme o critério de utilização final do Sistema de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a liderança coube às importações (+13,9%), aos investimentos (+5,9%) e ao consumo das famílias (+3,8%). Chamou a atenção a perda de ímpeto das exportações (+4,1%) e o tímido acréscimo dos gastos do governo (+1,9).

A indústria foi impulsionada pela construção civil (+4,7%), pelos segmentos de máquinas para escritório e equipamentos de informática (58,4%), especialmente computadores e monitores; atividades extrativas (8,4%), sobretudo de minério de ferro e de petróleo; máquinas, aparelhos e material elétrico (13,8%); e refino de petróleo e produção de álcool (5,2%), que responderam por mais de 70,0% do crescimento. As performances negativas ficaram por conta de produtos químicos (-2,7%), madeira (-8,8%) e vestuário (-7,9%).

Como se pode perceber, trata-se de um dinamismo bastante concentrado setorialmente, confirmando a tendência verificada desde 2004, com o predomínio dinâmico de segmentos atrelados à exploração de recursos naturais, à ampliação da oferta de crédito, principalmente aquele consignado com desconto em folha de pagamento, ao barateamento de custos de importações, em virtude do câmbio sobreapreciado, e à continuidade do crescimento da economia mundial e, por extensão, da ascensão das cotações das commodities minerais. O encolhimento da produção em algumas atividades esteve diretamente associado à otimização negativa entre câmbio e colapso dos negócios atrelados ao campo.

A situação instável da indústria pode ser notada pela queda real de 0,5% da receita líquida das empresas de capital aberto no primeiro semestre, segundo levantamento da Consultoria Economática, com base nos balanços de 88 companhias com ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Foi o pior desempenho desde 1998, motivado pelos desdobramentos do atraso cambial no comércio externo particularmente dos segmentos siderúrgico, metalúrgico, químico, veículos e peças, têxtil e de telecomunicações.

Essencialmente, a marcha da economia no primeiro semestre de 2006 traduziu os impactos concatenados da maior disponibilidade de crédito, mesmo em clima de escassa concorrência bancária e de cobrança de enormes spreads (diferenças entre as taxas de empréstimo e as de captação), da expansão da massa de rendimentos médios reais e do declínio da inflação, sobre algumas camadas do tecido econômico que, no geral, ainda padece com a conjugação entre juros e tributos elevados, câmbio baixo e reduzidas inversões infra-estruturais.

A continuidade do movimento ascendente do aparelho produtivo até o final do ano depende do controle das variáveis macroeconômicas em um ciclo político desprovido de maiores novidades, a não ser aquelas relacionadas à ampliação do gasto público e à exaustão da capacidade de endividamento primário da população, constatada por meio dos incrementos de 31,0% do crédito às pessoas físicas em 12 meses encerrados em julho vis-à-vis 6,0% da massa de salários e da impulsão de 24,2% da inadimplência desde o final de 2004.

Aliás, o aumento dos dispêndios governamentais vem sendo amparado pela perfeita sintonia entre contração dos superávits fiscais primários e comerciais, sob pena de deflagração de pressões de inflação de demanda. O saldo primário das contas públicas atingiu R$ 41,4 bilhões entre janeiro e julho de 2006, o que representou 3,55% do PIB, bastante aquém da meta de 4,25% do PIB. As despesas públicas cresceram 14,8% entre janeiro e julho de 2006, ante igual período de 2005, contra evolução de 11,1% das receitas.

Ainda assim, essa postura pode redundar em comprometimento do instável equilíbrio das finanças públicas, baseado em ampliação de carga tributária e corte de investimentos, inclusive em infra-estrutura. A carga tributária brasileira, de 37,4% do PIB em 2005, é a quinta maior do mundo, atrás apenas de Suécia, Noruega, França e Itália.

Em um quadro de pronunciada desaceleração do crescimento da economia mundial, devido à necessidade de esvaziamento da bolha imobiliária e de amenização das pressões inflacionárias acopladas às commodities minerais (petróleo e aço) e, na ausência de elevação expressiva do salário mínimo e das dotações dos programas de cunho assistencialistas como o Bolsa-Família, em razão dos efeitos negativos sobre as contas públicas, e de permanência dos obstáculos aos investimentos e às exportações – notadamente os desarranjos dos preços básicos como câmbio, juros e tributos –, é lícito admitir para 2007 a projeção de taxa de expansão do PIB inferior ao modesto patamar de 3,5% previsto para o ano de 2006.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, coordenador do curso de Ciências Econômicas da UniFAE – Centro Universitário – FAE Business School.

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