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A desigualdade social é produto histórico de mecanismos que organizam a produção e a distribuição econômica no mercado capitalista. Há inúmeros institutos que protegem a propriedade privada e os interesses (lucro) dos indivíduos, e promovem a acumulação quase infinita de renda e riqueza, intencionalmente distribuída de maneira iníqua pelos critérios institucionais da meritocracia ou de instrumentos de poder que usam força e coerção. O resultado é claro: miséria e pobreza predominam em um mundo no qual todos poderiam viver bem, preservando e renovando os recursos naturais.

Como tem feito anualmente na semana em que ocorre o Fórum Econômico de Davos, na Suíça, a Oxfam – confederação internacional de 20 organizações que trabalham em rede, em mais de 90 países, com a questão da pobreza e das desigualdades – divulgou estudo que mensura as várias manifestações de desigualdade globalmente. “Bem público ou riqueza privada” é, mais uma vez, um relatório impactante. A leitura do documento gera mal-estar, sensação de impotência, mas pode provocar também uma indignação transformadora.

Miséria e pobreza predominam em um mundo no qual todos poderiam viver bem

Em 2018, a desigualdade aumentou ainda mais, segundo o estudo. A fortuna dos bilionários cresceu 12% (cerca de US$ 900 bilhões), “modesta” ampliação de US$ 2,5 bilhões por dia. Só o aumento da renda chegou perto de R$ 1 trilhão! Dá para ter ideia do que isso significa? Com esse montante, daria para gastar US$ 1 milhão por dia, por 2.738 anos! Se a gastança começasse hoje, só acabaria em 4757!

E, desde a crise de 2008, diz a Oxfam, o número de bilionários quase dobrou. Entre 2017 e 2018, surgiu um novo bilionário a cada dois dias. Do outro lado, no subsolo da sociedade, nesse mesmo período, a riqueza de 3,8 bilhões de pessoas (a metade mais pobre da população mundial) caiu 11%. E incrível: a riqueza de 26 indivíduos somada é igual à riqueza destes 3,8 bilhões de pessoas: cada um desses 26 multimilionários possui, em média, o equivalente à riqueza somada de 146 milhões de pessoas entre os que compõem a metade mais pobre da população do mundo. Os estudos vão longe nos dados e situações.

A Oxfam propõe ainda três diretrizes, que cabem como luva para nosso país, para transformar essa realidade: a primeira é proporcionar saúde, educação e outros serviços públicos de forma universal e gratuita, que também funcionem para mulheres e meninas; parar de apoiar a privatização dos serviços públicos; fornecer aposentadoria, salários-família e outras formas de proteção social a todos; implementar todos os serviços de forma a garantir que eles também atendam às necessidades de mulheres e meninas.

Opinião da Gazeta: A pobreza pode ser vencida (editorial de 4 de fevereiro de 2019)

Leia também: Discriminação e desigualdade (artigo de Rodrigo Constantino, publicado em 4 de junho de 2018)

A segunda diretriz é liberar o tempo das mulheres, reduzindo os milhões de horas não remuneradas que elas passam cuidando de suas famílias e lares, todos os dias; permitir que quem faz esse trabalho essencial tenha voz nas decisões orçamentárias e fazer da liberação do tempo das mulheres um objetivo fundamental dos gastos públicos; investir em serviços públicos, incluindo água, eletricidade e creches, que reduzam o tempo necessário para realizar esse trabalho não remunerado; e construir todos os serviços públicos de maneira que eles funcionem para quem tem pouco tempo livre.

E, por fim, rever a baixa tributação de empresas e pessoas ricas, tributar a riqueza e o capital em níveis mais justos; brecar a redução generalizada do imposto de renda de pessoas físicas e empresas, eliminar a evasão e a elisão fiscais por parte de empresas e indivíduos super-ricos; chegar a um consenso sobre um novo conjunto de regras e instituições globais para reformular os fundamentos do sistema tributário com o objetivo de torná-lo justo, com os países em desenvolvimento tendo participação igualitária.

Clemente Ganz Lúcio é diretor técnico do Dieese.
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