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A interpretação do curso da conjuntura permite observar que o país vive um prolongado ciclo de desidratação econômica, representado por alta da inflação e estagnação da produção e dos negócios, consequência das barbeiragens da gestão econômica, e não da retração global, como argumenta o governo.

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 1,6% ao ano no período 2011-2014, menos da metade do mundial, que subiu 3,5% ao ano, e um terço dos mercados emergentes, que observaram acréscimo de 5,1% ao ano, retratando a terceira pior performance da história, empatando com a década perdida dos anos de 1980. Mesmo assim, a inflação gira acima do teto da meta de 6,5% ao ano, fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

Ao mesmo tempo, a taxa de investimento despencou de 20% do PIB, entre julho e setembro de 2011, para 16,5% do PIB, no segundo trimestre de 2014, apesar dos polpudos financiamentos concedidos por bancos públicos a um grupo seleto de grandes empresas, e das sucessivas renúncias tributárias em favor de ramos escolhidos por critérios pouco transparentes.

É claro que a nação experimentou avanços consideráveis na área social na última década, tirando proveito do bônus externo, formado pela bolha imobiliária dos Estados Unidos e pela valorização dos termos de troca – com a disparada das cotações das commodities, puxada pela demanda chinesa – e da maturação de um conjunto de mudanças institucionais, introduzido nos anos 1990, também beneficiado pela desinflação, trazida pelo Plano Real, e pelo cumprimento do contrato social contido na Carta Magna de 1988.

No entanto, o comportamento inadequado diante da perda de embalo da economia mundial – marcado por crescentes irresponsabilidades macroeconômicas, cometidas desde setembro de 2008, maximizadas a partir de 2011 e que resultaram em substanciais aumentos do déficit externo, do desequilíbrio das contas públicas e da inflação, mesmo com o breque nas tarifas de energia e nos preços dos combustíveis – vem emitindo pesada fatura. O maior exemplo disso é a reversão da trajetória de queda da desigualdade de renda e da extrema pobreza no país entre 2011 e 2013, em consequência da fragilização do mercado de trabalho, depois de ter acusado pronunciadas reduções desde 1994, segundo inferências feitas com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Nessas circunstâncias, parece lícito admitir que o Brasil carece da reconstrução urgente de uma atmosfera propícia à derrubada do pessimismo e à retomada da confiança dos atores sociais, essencial para a negociação política da segunda geração das reformas estruturais, requerida para a compressão de custos e o acréscimo da produtividade do aparelho produtivo instalado em território nacional e sua integração às modernas e complexas cadeias globais de produção.

O plano geral do atual governo rechaça veementemente essa pauta, optando por sugerir a permuta de "carne por ovo". Já a frente oposicionista a abraça, manifestando o retorno do núcleo da lógica do crescimento econômico, antecedido pelo investimento, suficiente para ensejar o aprofundamento da inclusão e mobilidade social, não apenas pela transferência de renda, mas pela ascensão oportunizada pela vertente educacional, particularmente na qualificação do fator trabalho, cada vez mais escasso, em linha com o gradativo fechamento da janela demográfica.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, é diretor-presidente do Ipardes e professor da FAE.

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