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A crise na Europa, que recentemente viveu a iminência da ruptura e ainda respira incerta, expõe um dilema próprio do mundo globalizado: como conciliar leis, direitos consolidados, normas internas, tradições, interesses e mesmo deficiências nacionais com um sistema produtivo, financeiro, de comércio e de serviços que funciona em rede e desconhece fronteiras? Como assegurar a integridade de uma nação, de sua economia e patrimônio, diante do imperativo dos interesses do mercado de capitais?

Vinte e cinco países europeus selaram acordo para adaptar suas respectivas constituições a um receituário austero e evitar a quebradeira generalizada do sistema financeiro. Remédio amargo, que deverá demandar longo período de ajustes e recessão. No Brasil, que tem conseguido superar os impactos das crises americana e europeia desde 2008, o impasse que se origina deste conflito entre os interesses nacionais e a lógica global parece ainda não nos dizer respeito; passa ao largo das decisões e estratégias governamentais. No entanto, ele está também entre nós, e cedo ou tarde deixará sequelas.

É o caso da situação vivida pela indústria nacional. Não importa que responda por quase 30% de toda a produção da riqueza brasileira, que em 60 anos se estruturou para tornar o país autossuficiente em bens de produção e de consumo. Nada parece servir como mérito para que receba prioridade nas estratégias econômicas.

Vivendo o resquício da cultura da colonização, permanecemos condescendentes com aqueles que vêm de fora, beneficiando-os com isenções ou omissões tributárias e reservando os sacrifícios à ala doméstica. As autoridades dão mostras de não se importar que nossos bens recolham pelo menos 37% de tributos para serem comercializados entre nós, tampouco os próprios consumidores. Ao adquirir malas by Germany, por exemplo, movimentamos a rede de indústrias do Japão, França, República Tcheca e outros, enquanto o empreendedor brasileiro faz uma corrida de obstáculos para manter seu negócio.

Das áreas federal, estadual e municipal sobressaem compromissos e obrigações, em nome de impostos, contribuições e taxas diversas. As empresas brasileiras destinam pelo menos um terço de cada ano para o atendimento a essas obrigações, o equivalente a 108,3 dias de trabalho, contra 56 dias da média mundial.

Quando surge uma nova lei que promete desonerar a indústria, há distorções que às vezes acentuam a carga em lugar de aliviá-la. A rota de obstáculos é complementada pela informalidade e pela insegurança jurídica, dado que as decisões surgem para o atendimento a questões e demandas pontuais, descoladas de um projeto mais duradouro e, muitas vezes, com desconhecimento da realidade das indústrias.

O caso da Europa deveria servir para o governo acender a luz de emergência e passar a cuidar estrategicamente do setor produtivo nacional, encerrando esse longo ciclo de o país permanecer na superfície dos problemas e optar pelo remédio temporário em lugar da cura.

José Chapina Alcazar, empresário, é presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e de Assessoramento no Estado de São Paulo e presidente do Conselho de Assuntos Tributários da Fecomércio SP.

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