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O princípio constitucional do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) encontra na ampla defesa (CF, art. LV) seu maior corolário. Esta, por sua vez, é demonstrada através da autodefesa (que ocorre quando o próprio acusado se defende nos autos – como no interrogatório, por exemplo) e da defesa técnica (formulada por um advogado). Dentre as atividades deste profissional, encontra-se a sustentação oral, formulada perante um tribunal quando da sessão de julgamento de determinada causa.
A prática forense tem mostrado certa insatisfação dos julgadores quando da realização de sustentações orais pelos defensores. Premidos pelo tempo e pela carga oceânica de processos em pauta, não raro os desembargadores mostram desinteresse e impaciência quando da defesa oral em 2ª ou 3ª instâncias.
Uma boa sustentação oral tem o poder de ganhar causas. É fundamental, porém, usá-la de forma adequada e inteligente
Contudo, ainda que sensíveis à realidade dos tribunais, devem os advogados ter garantida essa faculdade. Não se pode, em qualquer hipótese, relativizar direitos defensivos previstos na Constituição, em leis e nos regimentos internos das cortes de Justiça. Não raro, casos são decididos em razão da defesa oral quando da sessão de julgamento. Conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, “o direito à sustentação oral constitui prerrogativa de essencial importância, cuja frustração afeta o princípio constitucional da amplitude de defesa” (HC 364.512/RJ – 6ª Turma – Rel. Min. Rogério Schietti Cruz). É inviável, pois, transigir com aqueles que defendem o fim das sustentações orais ou a restrição drástica de sua utilização.
O que é possível fazer, sim, é otimizar esse momento processual, fazendo uso da palavra de modo inteligente e chamando positivamente a atenção dos julgadores para a causa. Uma defesa objetiva, linear e prática é muito mais vantajosa do que um discurso meramente retórico e vazio em seu conteúdo.
Cada profissional tem a sua forma de sustentar oralmente na tribuna. Contudo, a experiência diária e o dia a dia dos tribunais permitem a formulação de algumas sugestões para a realização de sustentações orais de forma didática, direta e clara.
a) Deve-se avaliar se a defesa na sessão de julgamento é necessária. Nem todos os casos exigem sustentação oral. É o caso, por exemplo, quando a discussão é meramente jurídica ou de aplicação objetiva da lei. Nessas situações, entrevistas prévias com os magistrados, com a entrega de memoriais, são mais eficazes do que a defesa durante a sessão de julgamento.
b) Se a opção for pela sustentação oral, esta não deve ser uma mera leitura dos memoriais entregues. É fundamental a elaboração de um roteiro prévio, com a escolha de uma ou de poucas teses, para torná-la didática e objetiva. Deve ser curta e terminar antes do prazo regimental.
c) É fundamental conhecer o perfil e posicionamento dos julgadores quanto ao tema apresentado e, quando possível, mencionar decisões do próprio colegiado para reforçar seus argumentos.
d) A sustentação oral não é júri. Um discurso simples e tranquilo, sem a elevação do tom de voz, por exemplo, é bastante adequado para o ato.
e) É necessário um amplo conhecimento do processo, sobretudo para invocar eventuais questões de fato quando do julgamento.
f) Evidentemente, deve-se evitar embates com a parte contrária e aceitar e respeitar o posicionamento dos julgadores, ainda quando contrários aos interesses do constituinte.
A sustentação oral é, portanto, o momento de uma defesa sincera, olho no olho. É o momento da empatia do defensor com o julgador. Da busca pela justiça na sua forma mais pura: o convencimento do semelhante.
Em sua célebre obra “Eles, os Juízes, vistos por um Advogado”, o jurista e professor PIero Calamandrei (1889-1956) destaca: “Todo advogado vive no patrocínio certos momentos em que, esquecendo as sutilezas dos códigos, os artifícios da eloquência, as astúcias do debate, não sente mais a beca com a qual se vestiu, não vê mais as togas com que se vestem os juízes, e dirige-se a eles, fitando-os nos olhos de igual para igual, com aquelas palavras simples com que a consciência do homem se dirige fraternalmente à consciência de seu semelhante, para convencê-lo da verdade. Nesses momentos, a palavra ‘justiça’ volta a ser fresca e nova, como se fosse dita então pela primeira vez. E quem a pronuncia sente passar em sua voz um frêmito discreto e suplicante, como aquele que passa nas palavras do crente que ora”. Uma boa sustentação oral tem o poder de ganhar causas. É fundamental, porém, usá-la de forma adequada e inteligente.
Alexandre Knopfholz é advogado criminalista e sócio da Dotti Advogados.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos



