O recuo de 3,6% no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no 4º trimestre de 2008, quando confrontado com os três meses imediatamente anteriores, o maior registrado desde 1996, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atesta a instantânea penetração da crise internacional no país, em linha com a queda abrupta da produção industrial e contrariando o otimismo reinante nas hostes oficiais, reproduzido em expressões como marola, quase imperceptível, blindagem, dentre outras

CARREGANDO :)

O declínio foi liderado pela indústria (7,6%), o maior desde os últimos três meses de 1996 (-7,9%), com efeitos multiplicadores negativos nos níveis de emprego e renda de diversas cadeias produtivas e, inclusive, nas receitas fiscais. Pela ótica da utilização final, os encolhimentos mais expressivos ocorreram nos investimentos (-9,8%, o maior da história) e nas importações (-8,2%, o 1º desde o 3º trimestre de 2005, quando desceu 0,5%).

Isso reflete não apenas o decréscimo da demanda (externa e doméstica), mas, sobretudo, as apostas de prosseguimento da marcha cadente dos lucros, por conta da deterioração das expectativas quando ao futuro da economia em curto e médio prazos, o que forçou o cancelamento e/ou o engavetamento, pela empresas, dos projetos em modernização e/ou ampliação das plantas produtivas.

Publicidade

O consumo das famílias diminuiu 2%, representando a primeira performance desde o 2º trimestre de 2003, quando os gastos dos consumidores caíram 1,2% em face da orientação macroeconômica recessiva do 1º ano do governo Lula, sob o argumento da necessidade de conquista da confiança dos agentes econômicos, defendido pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci.

A queda atual dos gastos dos consumidores decorreu da conjugação entre o encarecimento e a compressão do fluxo de crédito e a redução da massa de salários, evidenciada pela proliferação de expedientes de concessão de férias coletivas, suspensão temporária de contratos de trabalho e demissões, por parte das organizações, e pelo fim da colheita de safras de reajustes dos vencimentos acima da inflação, por ocasião dos dissídios trabalhistas. Nesse quadro, o navegador solitário foi a despesa do governo, que ainda cresceu míseros 0,5%.

A realidade nua e crua, exposta nas estatísticas econômicas, revela que a contração externa do crédito, do comércio e dos preços das matérias-primas, interrompeu o encaixe atrasado do Brasil no maior ciclo de expansão da economia mundial dos últimos 40 anos, e não pode ser compensada pelos efeitos da depreciação do real, acoplados ao próprio colapso, e pela estratégia de devolução de liquidez (via compulsórios), praticada pelo Banco Central (BC), e pelos estímulos localizados concedidos aos segmentos mais afetados, como agricultura e indústria automobilística.

Rigorosamente, ao ingressar em um período de acentuada retração, que aliás já vinha se delineando desde agosto de 2007, quando o planeta finalmente conheceu o lado ruim do mercado hipotecário periférico dos EUA, chamado subprime, a economia mundial comprimiu a utilização de commodities e de produtos manufaturados, o que interferiu negativamente no desempenho das vendas externas brasileiras que, por sinal, já apresentavam sintomas de fadiga com a crescente sobreapreciação da moeda nacional, verificada desde o final de 2004.

Nessa perspectiva, ao recusar uma alteração radical da política de juros, o governo brasileiro limita os resultados das providências de natureza monetária e fiscal que vem executando e impede a recuperação sadia da base produtiva do país, pela via da diminuição do custo do crédito e da restauração da capacidade competitiva das exportações, em um ambiente mundial recessivo e, por extensão, de multiplicação do protecionismo.

Publicidade

Por enquanto, os indicadores preliminares, relativos ao 1º trimestre de 2009, apontam o desenho de uma recessão técnica no Brasil, configurada pela queda do PIB por dois trimestres consecutivos, acompanhando a rota cadente da economia mundial. A quebra de safra no Centro-Sul, provocada pela estiagem, em uma conjuntura de preços agrícolas menores, a baixa na utilização da capacidade instalada da indústria, e os temores dos trabalhadores em perder o emprego, adicionam combustível aos prognósticos menos animadores.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, Coordenador do Curso de Ciências Econômicas e Editor da revista Vitrine da Conjuntura da FAE Centro Universitário.