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| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

O IBGE disponibilizou recentemente a pesquisadores e cientistas sociais atuantes no país, um excelente trabalho de revisão das projeções de população brasileira, até o ano de 2060, que ressalta dois aspectos gerais intimamente articulados e merecedores de criteriosas reflexões e estudos mais aprofundados. São eles: o envelhecimento populacional e o fim do bônus demográfico.

A evolução demográfica do país mostra subida do contingente de idosos com mais de 65 anos de idade na população total de 7,3%, em 2010, para 9,2%, em 2018, devendo atingir 25,5%, em 2060. Já a população em idade ativa (PIA), que ocupa o intervalo de mais de quinze e menos de 65 anos, diminuirá de 69,4% do total, em 2018, para 59,8%, em 2060.

Ao mesmo tempo, a taxa de fecundidade, que era de 2,32 filhos por mulher, em 2000, 1,75 filhos por mulher, em 2010, e 1,77 filhos por mulher, em 2018, continuará em rota cadente e chegará a 1,66 filhos por mulher, em 2060, fruto da combinação entre controles espontâneos de natalidade e expressivo avanço da participação feminina no mercado de trabalho.

As dramáticas alterações na dinâmica demográfica também requererão apreciáveis rearranjos no padrão de financiamento e no modus operandi da seguridade social

No que diz respeito à perda do bônus, o rápido envelhecimento brasileiro deverá ampliar, de forma expressiva, a denominada “razão de dependência”, configurada no quociente entre a parcela subordinada economicamente (crianças e jovens menores de 15 anos e velhos com 65 anos ou mais) e aqueles potencialmente produtivos ou em idade de trabalhar (entre 15 e 65 anos). A razão deve subir de 44% para 67,2%, no período em tela, significando que 67 indivíduos dependerão de cada grupo de 100, em 2060.

Assim, as estimativas permitiram apurar a antecipação do fechamento da janela demográfica – razão de dependência inferior a 50% – de 2041, de acordo com cálculos efetuados em 2013, para 2035, o que, com a diminuição da fração populacional em idade ativa, tornará o crescimento econômico cada vez mais condicionado à perseguição e obtenção de ganhos de produtividade.

Esses inescapáveis eventos exigirão que o país descubra meios e caminhos para “produzir mais com menos gente” e, por extensão, impulsionar a qualidade educacional, a incorporação de progresso técnico nos processos produtivos e as mudanças estruturais voltadas à multiplicação da eficiência dos fatores de produção.

Além de modificações relevantes no mercado de ocupações, as dramáticas alterações na dinâmica demográfica também requererão apreciáveis rearranjos no padrão de financiamento e o modus operandi da seguridade social (previdência, assistência e saúde), em face da crescente demanda por recursos, em clima de rápida e progressiva fragilização das fontes de arrecadação e provisão orçamentária.

Leia também: A doce ilusão da CPI da Previdência (editorial de 29 de outubro de 2017)

Leia também: O envelhecimento da força de trabalho no Brasil (artigo de Noélly Harrison Mercer, publicado em 26 de abril de 2017)

O mais preocupante é que os indicadores do IBGE servem para quantificar e desnudar um conjunto de suspeitas levantadas por cientistas dedicados ao exame das mazelas sociais há alguns anos, sintetizado na premissa de que o Brasil estaria reproduzindo o processo de envelhecimento acontecido em nações desenvolvidas, só que completamente acéfalo de haveres financeiros e retaguardas de proteção erguidas naqueles estados.

Na verdade, o país perdeu as chances oportunizadas por quase meio século de abertura da janela demográfica para ativar mecanismos e instituições capazes de catapultar estágios de desenvolvimento econômico e social, por meio de inversões que favorecessem contínuas elevações de produtividade, amparadas em abrangentes reformas dos aparatos educacionais, como fez a esmagadora maioria das nações.

Como se vê, há enormes desafios a serem enfrentados pela sociedade brasileira nos próximos anos, com a maximização da enorme fatura a ser paga pelos pecados de negligência e omissão, cometidos durante vários decênios, e, o que é pior, sem ajuda da demografia.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, professor da FAE Business School, ex-diretor-presidente do Ipardes.
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