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Tão logo se encerrou o ciclo eleitoral, teve início, no interior do governo Lula, uma batalha pelo comando da política econômica no segundo mandato do presidente. De um lado, surgiu o trio considerado integrante da linha desenvolvimentista, formado pelos ministros Tarso Genro, Dilma Rouseff e Guido Mantega, com o primeiro decretando o desfecho da neurose antinflacionária remanescente da era Palocci, ancorada em juros reais elevados e câmbio apreciado em regime de livre flutuação e sistema de metas.

As principais bandeiras dessa corrente repousariam na utilização de providências dirigidas à queda mais intensa das taxas de juros, núcleo do desequilíbrio fiscal, à flexibilização dos superávits primários, à implementação de medidas mais comprometidas com a subvalorização do real e a recuperação da competitividade das exportações, pelo Banco Central, e ao reforço do intervencionismo estatal.

Em face da imediata desautorização do grupo heterodoxo, proferida pelo presidente depois da reconquista de um capital político superior a 58 milhões de votos, a ministra Dilma tentou contemporizar ao esclarecer que, nos tempos de Palocci, havia a preocupação em implementar ajustes visando derrubar a inflação do patamar de dois dígitos. Com isso, a ministra engavetou sua interpretação pretérita quando manifestou, há cerca de um ano, flagrante preferência por uma inflação superior a um dígito em troca de maior parcela de recursos para investimentos.

De outro lado, mantém-se o pensamento ortodoxo, hospedado no Banco Central (BC), e com atuação concentrada nos meios financeiros, preconizando, de forma persistente, a recuperação estrutural do equilíbrio nas finanças públicas – com ênfase para a contenção e reversão da desenfreada subida dos gastos primários, observada desde os anos 1990, e uma nova reforma da previdência –, como requisito mínimo indispensável à diminuição mais pronunciada dos juros e à reativação dos investimentos em ampliação da capacidade produtiva.

Contudo, o presidente também não concedeu aval pleno ao time do mercado. Não obstante os dispêndios primários, das três instâncias da administração pública, terem crescido de 24,0% do PIB, no triênio 1991–1993, para 33,4% do PIB em 2005, o que exigiu o acréscimo de carga tributária de 26,0% para 38,0% do PIB no mesmo período, Lula negligenciou a importância de promoção de corte de gastos, alegando tratar-se de "discurso meio batido".

Por certo, percebe-se a intensificação da discussão acerca da necessidade premente da criação de condições para a renovação da capacidade poupança e investimento domésticos e, conseqüentemente, o retorno da expansão duradoura dos níveis de oferta, emprego e renda do país, desprovido de pressões inflacionárias. Isso deveria ocorrer em circunstâncias de manutenção e ampliação dos programas de redistribuição de renda e de diminuição da pobreza que, embora sejam categorizados como despesas correntes, constituem investimentos na construção de capital humano.

O cotejo entre as diferentes alternativas econômicas provocou o aparecimento de posições no mínimo curiosas, como aquela do senador petista Aloísio Mercadante, de linha heterodoxa, defendendo cortes nos gastos públicos, e a do ex-ministro Delfim Netto, de postura ortodoxa, amenizando a retórica de déficit nominal zero e apregoando apenas o congelamento de despesas e a elevação da produtividade do setor público.

Pelo prisma político, é inegável o amadurecimento da democracia brasileira, depois de cinco eleições presidenciais, um impeachment e outros constrangimentos, sem qualquer sinalização de regressão institucional. Por uma ótica estritamente econômica, fatores de oferta representados pela existência de capacidade ociosa (equipamentos, instalações e fator trabalho), constituem satisfatórias justificativas para ao menos a amenização da predominância dos interesses financeiros especulativos na gestão macroeconômica, responsáveis, em grande medida, pela sobrevalorização cambial, pelo sobrecarregamento das contas públicas e, por extensão, pela ausência de crescimento econômico.

Diga-se de passagem que mesmo com a substancial demanda por dólares, subjacente à estratégia de acumulação de reservas internacionais e de liquidação antecipada de dívidas, promovida pelo BC, o real exprime a maior apreciação dos últimos dois decênios e meio, excluindo-se o intervalo 1994–1998, caracterizado pela prática de um câmbio fixo com flutuação em bandas.

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