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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

A saída temporária, frequentemente elogiada pela sua intenção ressocializadora, adveio à ordem legal brasileira por meio da atual Lei de Execuções Penais. A exposição de motivos da referida lei, editada em 1984, mencionando a obra Prisión aberta (de viés desencarcerador), refere que “as autorizações de saída estão acima da categoria normal dos direitos”, vista como uma “etapa” do sistema progressivo de pena. Previa-se, pois, que os resultados do instituto seriam proveitosos, quando submetido à adequada fiscalização.

Entretanto, as “saidinhas” – tais como a de Suzane von Richthofen justamente na data comemorativa do Dia das Mães, ou a de apenado que dissimulou carona através de aplicativo para estuprar e matar uma jovem de 22 anos na cidade de Frutal (MG) – colecionam fracassos, tragédias e vítimas, apostando-se há mais de 30 anos no mundialmente desacreditado sistema progressivo de cumprimento de pena, do qual o brasileiro mostra-se o mais frouxo e leniente de que se tem notícia.

O cidadão brasileiro se vê incrédulo frente às punições insuficientes e desproporcionais aos crimes mais repugnantes

Em análise da realidade executória da pena, constata-se que a saída temporária, destinada apenas aos apenados que cumprem o regime semiaberto, premia praticamente apenas os autores de delitos de extrema gravidade, isto é, condenados por um dos 28 crimes que estipulam o regime inicial fechado (2,6% dos intervalos de pena previstos na legislação penal), visto que exige o mesmo requisito para a progressão de regime (1/6 da pena), salvo reincidentes (1/4). Consequentemente – atestando-se a frouxidão do sistema –, os demais condenados ou iniciam a pena em regime mais brando, ou (em sua grande maioria) cumprem medidas alternativas à prisão, sem nem sequer necessitarem da “saidinha”.

Cumpre ressaltar ainda que o baixo patamar de apenados que não retornam das “saidinhas”, que varia entre 5% a 10%, além de representar milhares de apenados soltos indevidamente, desconsidera a sua falta de fiscalização, bem como o baixíssimo risco de o apenado ser flagrado cometendo crime durante os 35 dias do ano em que se encontra em plena liberdade, considerando-se a vergonhosa taxa de elucidação de crimes no país.

Perda de direitos: O fim da saída temporária e o mito da redução da criminalidade (artigo de Monia Regina Damião Serafim, defensora pública do Paraná)

Ante tal cenário, o cidadão brasileiro se vê incrédulo frente às punições insuficientes e desproporcionais aos crimes mais repugnantes, culminando em uma falta de representatividade do poder estatal – justamente por deixar de defender satisfatoriamente os valores éticos e sociais da consciência coletiva, propiciando aos criminosos pouca ou nenhuma vontade de obedecer tais preceitos e deveres sociais. Diversamente do que pregam os teóricos contrários à prisão, que julgam os resultados dos benefícios legais pela sua intenção, os extensos benefícios da execução da pena, representados pela saída temporária, transformaram-se em falsas esperanças e em fantasias destrutivas. O criminoso de alta periculosidade, que já havia se negado a se socializar antes e durante o cometimento do crime, acaba internalizando erroneamente que a sociedade e/ou o Estado também não enxerga com tamanha gravidade o delito cometido.

Urge a retomada dos fundamentos básicos da dissuasão, por meio da alta probabilidade de punição, e da incapacitação, por meio da prisão por tempo considerável. Consequentemente, a extinção da saída temporária se impõe como retomada do dever básico e fundamental de proteção pelo Estado.

Bruno Carpes é promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, membro do Núcleo de Pesquisa e Análise da Criminalidade da Escola de Altos Estudos em Ciências Criminais e professor do Burke Instituto Conservador.
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