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Campanha é como a nuvem da veneranda metáfora do saudoso e arguto mineiro Magalhães Pinto, que morreu sem realizar o grande sonho de chegar à Presidência da República: espia-se o céu e o desenho das partículas na atmosfera parece compor o esboço que lembra uma figura cá de baixo. Daí a segundos ou minutos, o bosquejo se desfaz no borrão disforme.

Mesmo no ronceiro cotidiano de época magra em imagens além do mensalão, do caixa 2 e de outros símbolos da corrupção, a campanha sempre injeta o soro da esperanças de renovação, de mudanças na safra de promessas.

Mas convém adotar cautelas no embalo do otimismo e, no reverso, não confundir tendências dos flagrantes das pesquisas e ficar atento às regras básicas do jogo que não começou a ser jogado e engatinha na fase preliminar da arrumação das peças no tabuleiro.

Com os complicadores da reeleição, da derrubada da verticalização que escancara as porteiras às mais extravagantes alianças eleitorais e manda às favas a coerência partidária de siglas de circunstância, estamos muitos passos antes da caminhada das decisões. É o horário de eleitoral, em rede nacional de emissoras de rádio e de televisão que marca o chão da maratona e divide as etapas com características distintas.

Nos ensaios do aquecimento, trocamos as pernas de apoio na pré-campanha. Não se trata de menosprezar a sua importância mas, de buscar entendê-la. Nela, desde o início, o presidente Lula desempenha o papel principal, de referência para a oposição e para os prováveis aliados. Desfruta de privilégios conquistados pelos 53 milhões de votos que o elegeram na quarta e vitoriosa tentativa de chegar ao poder.

Candidato único em campanha em tempo integral, sem sombra que o ameace no combalido PT respingado pela lama das denúncias de corrupção ou na sopa de legendas que esperam a vez de ser chamada para ocupar o seu lugar no segundo mandato.

Lula não pode e nem deve oficializar a sua candidatura antes do fim prazo legal, em junho, para usufruir até a última gota do oportunismo dos buracos constitucionais da emenda da reeleição, feita sob medida para a inauguração da novidade do segundo mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Finge, sem contrair o rosto, que se consome em dúvidas, que padece as insônias da hesitação nas sofridas noites, que são todas as noites, em que faz e refaz o tricô do ser ou não ser candidato. Não precisava exagerar tanto no papel de mocinho de novela. Mas o fato é que voltou à confortável posição de favorito com a tática de negar qualquer participação na pilhagem do mensalão, ao rifar sumariamente os companheiros Delúbio, o marqueteiro Duda Mendonça das mágicas da maquiagem, o prestativo Marcos Valério, especialista em mapear os caminhos dos milionários recursos que regaram, com a fartura do desperdício, a sua ascensão. De cambulhada despediu o sumido José Genoíno e outros indesejáveis. Nas asas do AeroLula, luxo de rico, viaja para todas as roças de votos, inaugurando até esqueleto de obras e espargindo promessas como um pródigo benfeitor dos pobres e remediados.

Se nada de ruim estragar a sua festa, deve largar para a decisão, na reta final como folgado favorito, com muitos corpos à frente do tucano com as penas da oposição.

Até aqui e por mais algum tempo, sugará o caldo doce no canudo de candidato único, com ampla cobertura da mídia, superexposição do perfil retocado com severa dieta e outros truques.

Nada que se comparece com o que promete o galope com vários competidores no grande prêmio do horário de propaganda eleitoral. O calendário que o Tribunal Superior Eleitoral aprovou fixa, para o primeiro turno, o período de 15 de agosto a 29 de setembro. É o instante da massificação da campanha, bulindo com os indecisos, incendiando as paixões. E quando o eleitor, em casa, diante da telinha, compara e confere, para confirmar a escolha ou trocar de candidato.

Se o mais votado não atingir a maioria absoluta – metade mais um dos votos válidos, excluídos os em branco e nulos – que decide a parada, teremos o mano a mano no segundo turno entre os dois mais votados. E aí a temperatura estoura o termômetro na fervura do confronto direto, com possíveis debates, na reta curta de 16 a 27 de outubro do repeteco das redes nacionais de rádio e tevês.

No segundo turno não há muro nem conversa fiada: quem ganhar, leva.

Eleição, como a Copa do Mundo, não se ganha de véspera. Mas no voto e no campo.

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