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A tragédia da Praça Tiradentes é mais um episódio indicador da degradação do transporte coletivo de Curitiba, que há tempos perdeu noções de qualidade e confiabilidade, conforto e acessibilidade. Sem ser prioridade real, a segurança cedeu espaço às lógicas tarifeiras, à determinação de diminuição do preço das passagens. O limite foi atingido, provavelmente ultrapassado por limitações técnicas ou de sustentação de lucros ao custo da degradação do sistema.

Afirmações duras, mas que encontram, por exemplo, sustentação no edital para licitação de outorga de concessões para o transporte coletivo urbano de Curitiba, onde vimos, perplexos, entre outros itens discutíveis, a determinação de aumento da velocidade média dos ônibus. De que jeito? O resultado é que percebemos a ousadia de motoristas que, não raramente, cometem imprudências absurdas, dando-nos a entender que estão testando limites, treinando para uma condição operacional extrema.

Economia forçada e ganhos impossíveis levam ao esgotamento de tudo e de todos. Dizemos isso, pois falamos com a experiência de quem teve uma vida dedicada à engenharia e usa o transporte coletivo frequentemente em diversas linhas. Assim vamos convivendo com usuários e profissionais desses veículos, descobrindo falhas incríveis que nem o "perfeito 156" resolve, talvez por excesso de queixas.

A nossa experiência profissional em manutenção, gerência, planejamento etc. leva-nos a uma percepção especial do acidente com o ligeirinho na Praça Tiradentes, que nos obriga a registrar de forma até agressiva um padrão de serviços muito abaixo do necessário, se prestado com respeito aos usuários. Dentro e fora dos ônibus (calçadas, abrigos, sinalização etc.) vemos a ausência de critérios sustentados com firmeza pelas empresas e a administração municipal, onde desde o prefeito ao técnico mais humilde deveria ter a preocupação com a segurança de todos, motoristas, cobradores, passageiros, pedestres, enfim, atenção à população que usa e convive com esses carros pesados ao longo de nossas ruas e avenidas.

Não temos como desculpar os grandes gerentes diante de acidentes incríveis como a abertura da porta de um ligeirinho em trânsito, matando uma passageira e agora a perda de controle de um ônibus matando duas pessoas e ferindo dezenas, provavelmente por falha mecânica do veículo. Não é fatalidade, é erro mesmo.

Aqui temos bons técnicos, laboratórios, universidades, especialistas em qualquer atividade, gente que se for mobilizada evitará muitos problemas. Para tudo isso precisamos, contudo, de vontade política e administrativa a favor da segurança de todos nós, mais e mais dependentes de grandes equipamentos e sistemas de uma cidade que não para de crescer.

Se Curitiba produz e exporta ônibus modernos, se damos consultoria a inúmeras cidades, se acreditamos ser referência de urbanização, está na hora de se cuidar melhor da especificação, padrões, operação e manutenção dos nossos ônibus, che­­ga de acidentes!

É imperativo aprofundar análises técnicas e administrativas do acidente do dia 10 de junho na Praça Tiradentes. Como é normal acontecer, esse episódio trágico deve ter sido a somatória de erros, eventos e incidentes que precisamos conhecer e não permitir que se repitam. Enquanto isso o Poder Judiciário deve ser acionado para que os responsáveis compensem exemplarmente as vítimas (ou seus familiares) dessa tragédia.

Queremos ter mais tranquilidade e voltarmos a ter orgulho do transporte coletivo urbano de Curitiba, principalmente nós, usuários do sistema. Opinião de turista não vale. O que te­­mos visto clama por competência técnica e mudança de para­­digmas. Se baixar tarifas é importante, que anulem os impostos, tirem o custo da Urbs das tarifas, retomem o conceito de frota pública, aumentem e aprimorem a fiscalização e procurem suporte técnico adequado para que a qualidade e a confiabilidade do sistema tenham padrões civilizados.

João Carlos Cascaes, engenheiro e mestre, é ex-diretor de Planejamento e Engenharia da Urbs e ex-diretor e ex-presidente da Copel

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