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Os blocos econômicos representam elevada concepção da recente história das relações entre Estados. Destinam-se às sociedades maduras, com percepção privilegiada do que deva ser o convívio internacional, a partir da certeza das vantagens do comércio livre, das sociedades plurais e da convivência pacífica entre povos.

Devendo fundar-se em regime de leis a garantir segurança e fluidez para a economia, sem a qual a democracia é precária, são ainda blocos econômicos ferramentas essenciais para o desenvolvimento harmônico de países vizinhos, permitindo ajudas e alianças regionais sem violar regras da Organização Mundial do Comércio. É certo que, no mundo atual, fora de blocos econômicos não há salvação, o que explica a miríade de siglas que espocam em todos os continentes e em todas as latitudes.

Apesar do grande número de coletividades estatais dessa natureza, há apenas dois blocos que possuem personalidade jurídica, vale dizer, que são sujeitos de direito internacional como se Estados fossem: a União Europeia e o Mercosul. Todos os demais, a incluir o Nafta, não atingiram o difícil concerto político a permitir a existência de união aduaneira e da consequente personalidade internacional. Claro que blocos que atingem esse patamar de evolução vão muito além do comércio, com todos os dilemas que a proximidade e a vida em comum podem gerar.

Não obstante serem uniões aduaneiras consolidadas e que por força deveriam estar juntas, em inigualável bloco transcontinental, União Europeia e Mercosul há décadas negociam sem nada de concreto, além de fastidiosas declarações de amizade recíproca. O gargalo sempre foi, pelo lado europeu, o deslavado protecionismo de sua política agrícola, a impedir os sul-americanos de vender suas commodities. Por outro lado, são notáveis as queixas de Bruxelas acerca do endêmico protecionismo industrial e da falta de coordenação entre os países do lado de cá do Atlântico Sul.

Sem vontade política e em negociações contaminadas por rancores de fracassos pretéritos, pouco se avançou para aproximar a Europa das formidáveis economias que se vêm construindo no Cone Sul, a despeito de birras ideológicas e de casuísmos de calendários eleitorais. Agora, em era de necessidades extremas, na qual se chega a cogitar livre comércio entre a Europa e Estados Unidos, como se alguém pudesse obter vantagens com Washington, volta-se a falar na retomada do diálogo entre o Mercosul e a União Europeia. Sempre com algum veneno, nas maldosas insinuações de que o Brasil poderia negociar em separado de seus sócios, logo repelidas pelo (agora ex-)chanceler Antonio Patriota, que de imediato esclareceu ao Financial Times que seu país está comprometido com o Mercosul e que agendas comerciais separadas só terão lugar dentro do grupo.

O Mercosul com personalidade jurídica é, pelo que significa e permite para este e para futuros governos, conquista irrenunciável e legado precioso para gerações futuras. A despeito das recorrentes críticas que recebe, fundadas na crença simplista de que é possível fazer política externa apenas pela lógica elementar das somas, há muito mais em uma integração regional estratégica do que a obviedade das vantagens econômicas. Quando o Reino Unido envia navios de guerra para a costa espanhola, a agravar o imbróglio hispano-britânico sobre Gibraltar, sem precedentes em uma Europa que se estima supranacional, os pecadillos regionais daqui se minimizam, na certeza de que nosso breve acervo de integração já tem lições a dar.

Jorge Fontoura, doutor em Direito, é professor titular do Instituto Rio Branco e presidente do Tribunal Permanente do Mercosul.

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