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Nós, brasileiros, precisamos encarar a realidade para entender que o desempenho da seleção brasileira na Copa do Mundo não foi uma catástrofe isolada na nossa realidade atual. Foi, a meu ver, apenas o retrato da posição ocupada pelo nosso país, hoje, entre as demais nações. Ganhamos de países menos desenvolvidos, como Camarões, empatamos com emergentes, como o México, e perdemos de goleada para os países do primeiro mundo.

Vivemos, por um bom tempo, bombardeados maciçamente por mensagens otimistas, de que a seleção, como disse Parreira, estava com as mãos na taça, da mesma forma como os nossos governantes tentam nos convencer de que estamos avançando para um Estado de bem-estar e que os descalabros econômicos e sociais são apenas contingenciais. O Felipão e o ministro da Fazenda parecem uma pessoa só justificando o injustificável, explicando o inexplicável – no campo de jogo, por exemplo, o tal "apagão" dos atletas contra a Alemanha; e, no campo da economia, a indefectível crise financeira internacional. A diferença é que, no futebol, quem perdeu, embora doa em todos os brasileiros, foi a seleção da CBF. Na economia, não. Perdemos todos nós, brasileiros, com a inflação em alta, o PIB em baixa, as contas públicas desequilibradas e os fundamentos econômicos deixados de lado. A seleção não empolgava, mas nos vendiam a ideia de que podíamos ganhar, como nos vendem a imagem de que o país vai bem, quando todo mundo sabe que a situação é insustentável com o lamentável nível dos serviços públicos e o baixo desempenho da maioria dos segmentos econômicos.

Por isso, para mim, o grande legado da Copa, além de mostrar, de uma maneira irrepreensível, as virtudes do povo brasileiro na cordialidade e no modo como se comportaram nos estádios, foi o de escrachar a nossa necessidade de promover mudanças profundas em todas as nossas instituições. A CBF talvez seja o caso mais evidente, mas será que ela não é só um reflexo da nossa cultura? Será que os descalabros não se repetem, em outras esferas, no nosso dia a dia? A democracia, embora seja o melhor, não é um sistema acabado. Precisa de constantes aperfeiçoamentos.

E a impressão que se tem é de que no Brasil, em nome da democracia, nós estamos desaperfeiçoando as instituições, em todos os níveis. Ou seja, estamos piorando a democracia, que tem sido usada muito mais para ampliar benefícios e poderes de políticos que transformaram uma função pública em profissão (quando não em negócio), em detrimento dos direitos e necessidades dos cidadãos.

O fracasso da seleção nos dá uma ótima oportunidade para refletir. A CBF trocou a comissão técnica. E isso resolve, mantendo os mesmos princípios e conceitos e o mesmo statu quo? Ao menos ela tem quatro anos para apresentar resultados. E nós, cidadãos, que há muito tempo não podemos mais esperar, quando teremos sinais claros de mudanças no Estado brasileiro? O início das campanhas eleitorais frustra qualquer expectativa. Com a evolução do marketing – muito mais que da democracia –, os candidatos vão tentar convencer os eleitores de que são capazes de atender a todos os seus anseios apontados nas pesquisas (como se isso fosse possível), deixando de lado a essência da política, que é a de apresentar planos e formular ideias que façam a sociedade evoluir. Talvez nem se deem conta de que o verdadeiro líder é o que indica o caminho, não o que pergunta para os liderados por onde e para onde eles querem ir.

Aliás, Felipão, tido como grande líder, já foi embora como sinal de mudança. Mas será que alguma coisa mudou ou os dirigentes da CBF trocaram a comissão técnica para que tudo fique exatamente como está? E o povo brasileiro, como vai reagir diante de tantas esperanças frustradas e de tanta necessidade de mudar?

João Elísio Ferraz de Campos, empresário e membro do Conselho Consultivo do Instituto Ciência e Fé de Curitiba, é ex-governador do Paraná.

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