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É notório o grande enfado que a presidente Dilma Rousseff tem em relação aos assuntos internacionais. Contudo, há a tentativa de mitigar tal realidade com uma ação de grande impacto no plano externo: liderar um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE).

Alguns fatos contextualizam tal empreitada. No plano internacional, proliferam os acordos comerciais. A região do Pacífico, por exemplo, está repleta deles. Não precisamos ir longe para os perceber. Recentemente, México, Colômbia, Peru e Chile assinaram, no âmbito da Aliança para o Pacífico, um ambicioso acordo de livre comércio. Não por acaso, o eixo do comércio internacional já se moveu do Atlântico para o Pacífico. Tal cenário pressiona o Mercosul para que aprofunde suas relações comerciais com outros países e blocos, e não fique ilhado internacionalmente.

No plano interno, o ano eleitoral não é um fato negligenciável. De certo modo, Dilma é impelida a superar a sua distância em relação à diplomacia e tentar apresentar algum feito (ou ao menos alguma movimentação para tal) no plano externo, dimensão na qual é bastante criticada.

Do lado europeu, é a crise econômica o que impulsiona a União Europeia a negociar. A UE vê no aumento e na diversificação de suas trocas comerciais a saída para a crise. Basta vermos as negociações em curso e suas pautas. Com os Estados Unidos, por exemplo, a ambição é criar a maior zona de livre comércio do mundo.

É nesse contexto que se inserem as negociações entre Mercosul e UE. Iniciadas em 2000, elas nunca avançaram muito. Contudo, o ímpeto para a criação de uma área de livre comércio ganhou fôlego recentemente. No fim de fevereiro, no âmbito da Cúpula Brasil-UE, em encontro com líderes europeus, Dilma chegou a afirmar que o acordo está próximo. Sua real ambição só poderá ser dimensionada no próximo dia 21, quando ambos os blocos apresentarão suas propostas.

Esse é um assunto particularmente relevante para o Brasil. A UE é o maior parceiro comercial do país, à frente da China e dos Estados Unidos: absorve cerca de 20% das exportações brasileiras, é a origem de 21% de nossas importações e detém mais de 50% dos investimentos estrangeiros no país. Entretanto, essa relação vem se modificando – de uma relação superavitária, passamos em 2013 a ter um déficit comercial, o primeiro em mais de dez anos.

O possível acordo Mercosul-UE não é um caminho sem obstáculos. Fora a dificuldade de os próprios membros do Mercosul entrarem em sintonia quanto à proposta do bloco, a UE contesta, por exemplo, os incentivos brasileiros dados à indústria automobilística e à Zona Franca de Manaus. Do lado sul-americano, as críticas centram-se nos subsídios agrícolas europeus.

Contudo, o grande obstáculo a uma maior atuação brasileira no comércio internacional não está lá fora, mas aqui dentro. Além de uma estratégia de inserção internacional, é urgente um real planejamento para superar a nossa falta de competitividade. É preciso, por exemplo, aumentar drasticamente a nossa produtividade, reverter o atual processo de desindustrialização, reformar o nosso insano sistema fiscal e jurídico, assim como revolucionar a nossa infraestrutura.

Só assim o país será realmente competitivo internacionalmente. O desafio é enorme. Resta saber quando, definitivamente, daremos sólidos passos nesta direção.

Ramon Blanco, doutor em Relações Internacionais, é professor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) e pesquisador associado do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (Portugal).

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