• Carregando...

Tinha e tenho pelo Palácio Iguaçu um sentimento quase que juvenil de admiração, talvez por ter sido o local em que me aproximei mais do poder público e estive mais intimamente vinculado a ele

A reabertura do Palácio Iguaçu, agora restaurado na sua dignidade arquitetônica e funcional, com a reforma interna e externa e a retirada das adaptações internas improvisadas com duratex e tabiques, me traz uma lembrança indelével dos anos que trabalhei lá, em diferentes circunstâncias: primeiro, assessorando Alipio Ayres de Carvalho na tentativa de institucionalizar o Conselho de Desenvolvimento Estadual, um órgão de planejamento colegiado no governo Paulo Pimentel, que não resistiu às pequenas intrigas e malvadezas dos provincianos da época. Depois, no governo de Parigot de Souza, quando Ivo Moreira e eu criamos a estrutura de planejamento do estado que funciona até hoje, quase 40 anos depois. Por fim, no governo de Jayme Canet Junior, pois a Secretaria de Planejamento funcionou no Palácio durante quase todo o seu mandato até ser (infelizmente) transferida para o prédio em que hoje é o Museu Oscar Niemeyer.

Tinha e tenho pelo Palácio Iguaçu um sentimento quase que juvenil de admiração, talvez por ter sido o local em que me aproximei mais do poder público e estive mais intimamente vinculado a ele: o Palácio era o magneto do governo paranaense, onde se desenrolavam e resolviam as crises políticas e se tomavam as decisões estratégicas. Era o local dos atos solenes das posses de governadores e secretários de estado e onde se realizavam as rotinas cerimoniais, de recepção de autoridades federais, diplomatas e celebridades. Foi onde a população velou o governador Parigot de Souza e em seu pátio frontal, o Papa João Paulo II se encontrou com uma multidão jubilosa de um milhão de devotos.

Das janelas do fundo, via-se os jardins do Palácio, com o mapa paranaense esculpido em concreto, sempre cercado e pisado por escolares que vinham conhecer a sede do governo e, durante muito tempo, podia-se ver o esqueleto de concreto abandonado do que viria a ser – de acordo com o projeto inicial – a casa do governador. Ao fundo, em discreto ostracismo, a estátua da Mulher Nua, que escandalizou os espíritos pudicos, horrorizados com que ela viesse a enfeitar os jardins do que seria o Palácio da Justiça. Depois de muitos anos, governantes desinformados colocaram a estátua junto à do Homem Nu, como demonstração de desassombro ante o moralismo tramontano. Foi um equívoco que a diferença de escala entre as duas estátuas deixa à vista de todos. São o Mutt e Jeff (vejam o Google, meninada) paranaenses com suas alturas desproporcionais.

O Palácio Iguaçu é, ao mesmo tempo, o ícone da administração de Bento Munhoz da Rocha, de sua límpida percepção do papel do Estado e do corps politique na formação de uma sociedade original, a dos paranaenses. As circunstâncias financeiras impediram que Bento pudesse completar o Centro Cívico, que acabou truncado e desfigurado arquitetonicamente, mas a mensagem está lá na proximidade física dos Três Poderes constitucionais, e na formação da grande ágora.

Já escrevi que Bento Munhoz da Rocha foi o intelectual e político que melhor se preparou para governar nosso estado, cujo conhecimento não foi apenas extraído da observação pragmática e direta dos fenômenos sociais que o cercavam, e sim uma simbiose entre a observação e uma sólida base filosófica. O estudo da realidade nacional o fez trilhar os mesmos caminhos que a maior parte da intelectualidade brasileira na primeira metade do século 20, cujas referências obrigatórias eram Oliveira Viana, Silvio Romero, Alberto Torres e Manoel Bonfim, Euclides da Cunha, Joaquim Nabuco e Gilberto Freyre. No entanto, seu pensamento não é um mero agregado dessas fontes nem uma mera condenação às mazelas passadas de nossa formação. Ele era um pensador voltado para o futuro, como sua insistência na necessidade de superação das fragilidades da economia cafeeira, a criação da Copel, o fortalecimento das instituições de ciência e pesquisa tecnológica e sua vitalícia dedicação à universidade demonstraram.

O pensamento que inspirou Bento continua atualíssimo e, enquanto vamos construindo uma economia moderna aos trancos e barrancos, vamos também deixando mais à mostra o vácuo social que se forma quando esquecemos a população como foco central das atenções do Estado e seu bem-estar coletivo como objetivo maior de qualquer governante.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]