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O ministro da Educação, Abraham Weintraub, fala sobre políticas para educação e Diretrizes para o MEC, durante café da manhã com jornalistas.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, fala sobre políticas para educação e Diretrizes para o MEC, durante café da manhã com jornalistas.| Foto: José Cruz/Agência Brasil

Este texto não faz referência à exuberância e diversidade da fauna brasileira, tampouco a uma das denominações que o Brasil recebeu logo após o seu descobrimento. Procuro, aqui, fazer um paralelo entre a principal característica de um animal doméstico, a Amazona aestiva, um dos mais famosos pela sua capacidade de reproduzir palavras, e o que diariamente observamos nas redes sociais: a replicação de informações e notícias sem base científica ou verificação de sua veracidade.

Refiro-me às notícias veiculadas nas últimas semanas sobre prováveis “cortes” orçamentários aplicados pelo governo federal em diversas áreas, sobretudo as de defesa e educação. A meu ver, existe na praça um grande contingente que migrou da categoria de ser pensante e crítico para uma posição de mero repetidor daquilo que se ouve, tal como um papagaio. É a ação e o pensamento de acordo com o senso comum e a cultura de massa. Total alienação intelectual.

A última eleição presidencial deixou como uma de suas principais cicatrizes um país polarizado, onde as pessoas defendem suas causas e ideologias com unhas e dentes, sem possuir conhecimentos sólidos ou base fundamentada sobre aquilo que profere como se fosse verdade absoluta.

Falta conhecimento, leitura e muita sensibilidade. A visão é míope, rasa

É plenamente aceitável que cada um possua a sua visão de mundo, isso de acordo com suas origens, educação familiar e formação intelectual. Todavia, ir numa rede social bradar verdadeiras aberrações sem qualquer base técnica ou legal, preocupa sobremaneira.

Alguns militantes defendem suas causas repetindo “mantras” como verdadeiros zumbis, não sabendo na verdade o que estão falando. Garanto que se eu perguntar aos palavrosos eruditos o que é LDO, LOA, meta fiscal, LRF, corte, contingenciamento, despesas obrigatórias ou despesas discricionárias, não terei resposta.

Na última semana o assunto do momento referiu-se aos “cortes” – na verdade não se trata de corte – que o governo federal aplicou a diversas pastas. Antes da verborragia contumaz, a Amazona aestiva deveria estudar os princípios do orçamento público, especialmente em relação à montagem, aprovação, execução e fiscalização. Gostaria de lembrar, ainda, algo bastante sutil. Quem aprova o orçamento a ser executado são nossos representantes, aqueles que foram eleitos pelo voto direto. Ou seja, nós, inclusive aquela Amazona aestiva que proferem impropriedades, por meio de sua verborragia.

Existe uma “tal” de meta de resultado primário que deve ser perseguida e respeitada, sob pena de crime de responsabilidade praticado pelo chefe do executivo. A meta de resultado primário consta de nossa lei de diretrizes orçamentárias (LDO), também aprovada por nossos representantes, ou seja, novamente por nós.

Leia também: As polêmicas do MEC continuam (editorial de 2 de maio de 2019)

Leia também: Nossas universidades (artigo de Cristovam Buarque, publicado em 10 de maio de 2019)

Corte ou contingenciamento? É 30% do orçamento total – despesas obrigatórias mais as discricionárias – ou 30% das despesas discricionárias? Onde está a verdade? O Ministério da Educação divulgou em seu site que o “corte” de 30% nas verbas, amplamente divulgado, na verdade corresponde a um contingenciamento de apenas 3,4% do orçamento total das universidades federais, considerando o somatório de duas rubricas: as despesas discricionárias, aquelas que o governo possui a liberdade de decidir executar ou não, e as despesas obrigatórias, aquelas que o governo não poderá deixar de executar como, por exemplo, a alimentação escolar e seguro desemprego, dentre tantas outras. Qualquer dúvida sobre despesas obrigatórias e suas categorias, consulte o rol das despesas constantes do anexo III da LDO-2019 (Lei nº 13.707, de 14 de agosto de 2018).

Falta conhecimento, leitura e muita sensibilidade. A visão é míope, rasa. O cerne do problema não está no contingenciamento ou “corte” da já diminuta despesa discricionária, mas talvez no avanço desenfreado das despesas obrigatórias. As perspectivas para o problema são muitas. Por isso necessitamos de reformas urgentes nos mais diversos campos.

Gosto muito de papagaios, todavia prefiro os livros. Por meio deles conseguimos exercitar e fortalecer nossa capacidade crítica, em meio a esse turbilhão de informações que as redes sociais proporcionam.

Carlos Alexandre Nascimento Wanderley, auditor, mestre em Ciências Contábeis e professor de pós-graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie/RJ.

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