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Confira a lista dos 40 deputados estaduais eleitos em Santa Catarina
Imagem ilustrativa.| Foto: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

Desde a redemocratização do Brasil, nos anos 1980, no primeiro turno sempre houve boas opções para candidato a presidente. Não vem ao caso se essas opções tinham ou não chance de vitória, pois eu não voto em quem vai ganhar: eu devo votar em quem julgo ser o melhor para dirigir o país. O resultado vem, obviamente, da maioria. É assim que uma democracia funciona.

Quando se procura manipular a vontade popular de qualquer forma, por exemplo, com a massiva divulgação de pesquisas eleitorais ou a incitação ao chamado voto útil, temos a deterioração da democracia. Tudo isso caminha no caminho oposto à concepção de uma eleição em dois turnos. No primeiro turno, deve haver apenas o voto. Nada de adjetivos, como “útil” ou “vencedor”. Vota-se na melhor opção, definida por você, num processo de escolha que deve ser bastante pensado, ponderado, analisado com diligência. Mas e no segundo turno?

No segundo turno, em muitas eleições, o voto não é em favor de um candidato, mas contra o outro. Na prática, até se pode dizer que dá no mesmo. Entretanto, em essência, trata-se de situações absolutamente diferentes. Numa eleição muito polarizada e disputada, abstenção e voto nulo são opções para muitos, mas não para mim, pois não posso nem quero me abster diante de momentos tão importantes. Logo, preciso escolher entre Lula ou Bolsonaro. Qualquer opção apresentará alguns ingredientes indigestos e alguns temperos de incoerência.

Meus motivos podem ser válidos ou não para você, mas são os meus motivos. Estabeleça os seus e vote em quem achar melhor. Compare, refute, discorde, analise, reflita e faça uso de tantos outros verbos. Mas tenha a sua decisão.

Meu paladar político deve escolher, prioritariamente, o que eu não quero deglutir, o que é menos indigesto consumir. O banquete da democracia nem sempre nos oferece os pratos mais apetitosos, mas é dela que temos de nos alimentar. Assim, decidi não votar em Lula e enumero as razões disso.

Lula tem o apoio ativo e irrestrito de Renan Calheiros. Pronto, esta lista de motivos já poderia parar aqui e dispensar as outras razões. Para mim, Renan sempre representou o que de pior existe na política brasileira e em todo o “mecanismo”. Os fatos estão todos aí, registrados pela nossa história contemporânea, sobretudo de 1990 em diante. Para Renan, democracia é a capa de invisibilidade sob a qual pode operar de modo nada republicano ou democrático.

O mensalão foi um grande atentado à democracia. O mensalão do lulopetismo, devidamente julgado e condenado, foi o exemplo de como muitos dirigentes do partido não têm um apreço pelo Estado Democrático de Direito. Dinheiro para comprar votos no Congresso, dinheiro para financiar campanhas milionárias, dinheiro para enriquecimento pessoal e institucional. O objetivo? Perpetuar-se no poder, burlando a democracia representativa. Não, o lulopetismo não foi mais uma opção de voto para mim desde 2006. Vale lembrar que esses crimes já foram julgados e não houve anulação qualquer, mas muitos dos condenados e envolvidos ainda são protagonistas do partido e vozes ativas nesta eleição de 2022. Democracia comprada é uma espécie de tirania. Democracia, assim, não funciona.

Houve corrupção bilionária, sim, em estatais e, principalmente, na Petrobras. A maior prova, entre tantas? A devolução de dinheiro público – bilhões de reais – por algumas empreiteiras, que assumiram formalmente a culpa. Ora, se houve corrupção de tamanha magnitude, o que se esperava dos governantes, dos líderes? Que renunciassem, pedissem demissão, que se afastassem da vida pública, que reconhecessem as tremendas falhas. Em alguns países, políticos em situação assim teriam imensa vergonha pelo dano que causaram direta ou indiretamente. Aqui, no Brasil, são exemplos de homens públicos... Democracia, com gente assim, torna-se cleptocracia.

Lula foi condenado em todas as instâncias. Na 13ª vara em Curitiba; depois, por unanimidade no TRF do RS; em seguida, no STJ, com direito a aumento de pena em um dos processos; finalmente, no STF. Posteriormente, houve anulação dos processos em virtude de tecnicalidades levantadas de modo estratégico, diabólico e minucioso, disfarçadas por uma nuvem de fumaça de conversas vazadas de forma escandalosamente criminosa – neste caso, supostas provas, pois foram mensagens manipuladas, editadas e descontextualizadas. Ou seja: cometeu-se o crime de quebra de sigilo, violação de privacidade, para tentar livrar Lula dos outros crimes cometidos. Não, não dá para considerar alguém, numa situação assim, como candidato ao cargo de maior autoridade da nação. Aqui, até vale o raciocínio: mesmo se Lula fosse absolutamente inocente de todas as acusações, ele não seria digno de disputar as eleições, pois esteve à frente de um partido e de um projeto de poder nos quais dezenas de diretores, tesoureiros, ministros, secretários foram condenados por vários crimes de corrupção. Numa democracia, gente assim deve estar é no presídio.

Lula escapou da prisão por “confiar na Justiça brasileira”. O próprio PT difundiu por anos a máxima de que “no Brasil, só pobre, preto e puta vão para a cadeia”. Agora, quem diria que seu líder maior seria o maior exemplo da frase. Lula conseguiu livrar-se da prisão porque contou com os melhores e mais caros advogados, ampla simpatia de muitos membros do Judiciário e relações espúrias com políticos influentes. Resultado? O sistema jurídico brasileiro funcionou maravilhosamente bem para não punir Luís Inácio. Em nossa República, infelizmente, todos os poderosos fogem da Justiça da mesma forma. Com a infinidade de recursos, embargos formais, embargos auriculares, jurisprudências, burocracia, conversas nada republicanas às escondidas e, sobretudo, novos entendimentos aplicados retroativamente, ganhou-se tempo para que houvesse algumas prescrições e para que a opinião pública pudesse engolir as decisões favoráveis ao ex-presidente. Uma democracia, assim, é desfigurada pela impunidade.

Sou contra o conglomerado que se fez para tentar eleger Lula. Vários jornalistas, grande parte da classe artística, setores do Judiciário, operadores do direito, ONG’s, movimentos sociais, sindicatos, vários intelectuais, grande parte do meio acadêmico das universidades públicas e setores ditos progressistas das Igrejas Católica e evangélica fizeram uma grande aliança em torno de Lula. Não, num primeiro momento, ninguém afirmava que era um apoio a Lula; tudo era em nome da democracia, em defesa do sacrossanto Estado Democrático de Direito, que estaria correndo sérios riscos no mandato de Bolsonaro.

Depois, na campanha eleitoral, no momento oportuno, para a surpresa de ninguém, revela-se claramente o apoio a Lula. Uma aliança tão ampla, tão escancarada e tão poderosa assim inibe qualquer tipo de questionamento, pois, se você questiona a isenção e a imparcialidade de muitas dessas entidades, se você busca um debate tentando demonstrar as contradições de uma candidatura assim, ainda que de modo mais respeitoso e republicano, imediatamente, você é encaminhado ao “setor de desconstrução” do partido. Você passa a ser carimbado com um ou mais dos seguintes rótulos: o bolsominion, o negacionista, o fascista, o teórico da conspiração, o terraplanista, o machista, o homofóbico, o racista, o tiozão ignorante do WhatsApp, o crente manipulado pelo padre ou pelo pastor, o devastador da natureza, o inimigo dos animais, o intolerante, o disseminador de ódio e de fake news. Críticos sensatos e arruaceiros ignorantes são igualados, embalados, rotulados e despachados para a execração pública, com muito ódio do bem, claro. Isso é democracia?

O lulopetismo não aproveitou os seus anos de governo para implementar mudanças efetivas no país. Muito se fala das conquistas sociais da era Lula. Bem, se levarmos em consideração que o país herdado por Lula estava nos trilhos econômicos e fiscais e que, de 2003 a 2007, vivemos anos espetaculares graças às commodities e ao crescimento econômico da China, perceberemos que perdemos oportunidades de ouro para implantarmos reformas muito mais ousadas em matéria de infraestrutura, educação, saúde e saneamento. Não tivemos mudanças efetivas nessas áreas ao longo dos oito anos do governo Lula, muito menos nos seis anos do governo Dilma. Todos os números estão aí, para que sejam minuciosamente analisados, verificados, esquadrinhados. Não, não se avançou o tanto que se propaga, muito menos o tanto que se poderia ter avançado. Democracia se fortalece com maior desenvolvimento.

Os eventos esportivos do lulopetismo deixaram um legado absolutamente negativo ao Brasil e aos brasileiros. O 7 a 1 que tomamos da Alemanha foi a nossa menor derrota, quando analisamos qual o legado que a Copa 2014 e as Olimpíadas 2016 nos deixaram. Seria surreal, se não fosse criminoso: há obras para a Copa do Mundo 2014 que ainda hoje, em pleno 2022, não foram concluídas! Estádios construídos dão prejuízos milionários, todos os meses. Não se localizou nenhum impacto positivo na vida de pessoas mais humildes após o término dos eventos. Mas muita gente ligada ao lulopetismo enriqueceu com esses eventos, autênticos atletas de saltos orçamentais, medalhistas de ouro em matéria de corrupção. Nossa democracia entrou em campo e foi derrotada pela corrupção e pela incompetência.

Não concordo com a radicalidade de algumas pautas defendidas pelo lulopetismo, mas habilmente escondidas durante as eleições. Durante a campanha, para não perder votos, Lula procura não tornar explícitas certas pautas que são fundamentais e até mesmo legítimas à esquerda, configurando uma espécie de estelionato eleitoral. Contrariando essas pautas, eu sou favorável à legislação vigente sobre o aborto no Brasil, mas discordo totalmente das propostas de uma política mais ampla para o tema. Apoio a manutenção da política de cotas, ainda que com alguns aperfeiçoamentos e metas, mas não de sua ampliação indiscriminada. Sou a favor da manutenção do direito de um cidadão em poder possuir arma de fogo, desde que esteja comprovadamente apto para tal posse.

Meu objetivo não é convencer ninguém, é dar apenas subsídios para que cada um tome a decisão que achar mais sábia, correta ou sensata, em meio a tanta insensatez, erro ou tolice.

Discordo completamente contrário de qualquer lei que restrinja a liberdade de expressão dos cidadãos. Acredito que o teto de gastos deve ser cumprido pelos governos municipal, estadual e federal. Sou favorável à manutenção das reformas trabalhista e previdenciária, aprovadas de 2017 para cá. Revogá-las, como apregoam os aliados de Lula, é um grande retrocesso. Também discordo das políticas de segurança pública defendidas por vários setores que apoiam Lula, que constantemente criminalizam o trabalho diário e árduo da polícia e atenuam a culpabilidade objetiva de criminosos. Democracia deve ser feita de propostas claras, para serem abraçadas ou refutadas.

Não voto em que apoiou ou apoia regimes totalitários. Maduro, Chávez, Fidel, Ortega. A lista poderia ser ainda maior, mas já é suficiente para escancarar que quem anda com gente assim não pode se dizer democrata de fato. Aliás, como defender democracia no Brasil e chancelar regimes ditatoriais no exterior? Como acusar Bolsonaro de antidemocrata apoiando esses outros ditadores? É incrível o truque ilusionista de nossos intelectuais e jornalistas, que conseguem esconder cinicamente esses tiranos e projetar a imagem distorcida e forjada de um Bolsonaro fascista, genocida e miliciano. Democracia tem de ser para todos, seja aqui, seja no exterior.

Sou totalmente favorável à liberdade de expressão. Praticamente todo dia, a coligação encabeçada pelo PT entra com inúmeras ações no TSE denunciando fake news, abusos, crimes cometidos pela chapa adversária. Até aí, tudo bem, mesmo porque há constantes, inúmeras e flagrantes irregularidades cometidas. Estamos diante de duas campanhas bem sujas, de dois lados que se utilizam de um vale-tudo na disputa política. Mas o que é inadmissível? Perceber que o PT – sempre tão defensor da liberdade de expressão, que sempre vociferou contra a censura e contra os que “querem nos calar!” – frequentemente chega a pedir o fechamento de jornais, de canais, de páginas, a desmonetização e, o pior de tudo: a censura prévia, a materiais que ainda nem foram ao ar.

O caso mais emblemático é a censura ao documentário Quem mandou matar Jair Bolsonaro, produzido pelo Brasil Paralelo. A corte do TSE sequer assistiu ao documentário, aplicando a censura à queima-roupa. Como diz o clichê, julgaram o livro pela capa. A pedido do PT, por pressão do PT. Liberdade de expressão deve valer até para o meu adversário, mesmo quando eu discorde dele. Democracia se faz sem censura, muito menos prévia.

É isso. Para mim, o suficiente para decidir meu voto. Meu objetivo não é convencer ninguém, é dar apenas subsídios para que cada um tome a decisão que achar mais sábia, correta ou sensata, em meio a tanta insensatez, erro ou tolice. Meus motivos podem ser válidos ou não para você, mas são os meus motivos. Estabeleça os seus e vote em quem achar melhor. Compare, refute, discorde, analise, reflita e faça uso de tantos outros verbos. Mas tenha a sua decisão. Não deixe que outros pensem por você. Bom voto!

Fábio Bettes, graduado em Letras, é professor de Literatura e Língua Portuguesa, autor de livros didáticos e editor.

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