Muitos que estão acompanhando com a sola dos sapatos essa massa humana pelas ruas devem estar eufóricos, perplexos e preocupados. Eufóricos estão aqueles que vivem esse momento histórico pela primeira vez, por se encontrarem com uma massa de jovens, convocadas pelas redes sociais. Perplexos e preocupados estão aqueles que, no passado – mais especificamente na década de 1960 –, vivenciaram movimentos de massa semelhantes, porém mais definidos ideologicamente.

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Na conjuntura atual, a inflação começa a se elevar; surge uma insatisfação difusa e generalizada, especialmente entre os jovens, e entidades como o Movimento Passe Livre começam a chamar atos de rua para exigir a diminuição do preço das passagens de ônibus. O movimento pega, ganha as ruas, empolga a juventude, e de repente o que vemos é uma multidão, de forma espontânea, criar seus próprios meios de convocação via redes. Nas manifestações, inventam formas criativas de denúncia. Tudo isso empolga e leva mais gente às ruas. O movimento tem proporções jamais vistas na conjuntura recente, com 30 mil pessoas em São Paulo, 300 mil no Rio, 30 mil em Belo Horizonte, 15 mil em Curitiba e Brasília e assim se repete em outras capitais e cidades do interior.

Entre as bandeiras aparece de tudo – desde as tarifas de ônibus, passando pela PEC 37, "abaixo a corrupção", "fora Feliciano", "não à Copa", mais verbas para saúde e educação. As passeatas fogem ao controle dos organizadores; grupos infiltrados partem para a baderna para chamar a violência policial, aproveitam o movimento para atacar o governo Dilma, chegando inclusive a acenar com o impeachment da presidente nas redes. A repressão é desproporcional, como ocorreu em São Paulo e outras capitais, onde ocorrem os jogos da Copa das Confederações. É grande a destruição de prédios públicos, queima de carros e ônibus, destruição de equipamentos urbanos por uma minoria que comanda esse quebra-quebra, deixando os setores organizados perplexos e sem ação para deter essa minoria, que é organizada e tem objetivos definidos de criar o caos para chamar a força bruta para pôr ordem na casa.

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As organizações populares, sindicais e estudantis que representam seus segmentos para engrossar e dar rumo ao movimento estão retomando as ruas. A política na sua forma tradicional, através dos seus partidos mais conhecidos, sofre um ataque das forças fascistas que buscam desqualificar a ação institucional das organizações da sociedade civil. Essa estratégia não é casual: querem dar rumo ao movimento e, para isso, têm de neutralizar as forças democráticas, que têm experiência nos movimentos de massas.

Esse movimento está abalando todas as convicções anteriores na sua forma de organização e de condução. Se a esquerda não conseguir decifrar isso, será engolida – não no sentido de um golpe militar, mas num golpe com outra característica, para derrotar as teses históricas da esquerda que quer avançar nas mudanças, e ganhar as consciências para o enfrentamento das forças do atraso, que defendem a manutenção das desigualdades sociais.

As bandeiras históricas, com o objetivo de uma sociedade mais justa e fraterna, têm de estar hasteadas no meio da multidão. É disso que os conservadores têm medo, apegando-se à bandeira da corrupção – que existe de fato e tem de ser combatida por todo cidadão honesto, independentemente de partido –, que tem um forte apelo para conduzir o movimento e enganar a massa. A corrupção, que se vê nas instituições e nos indivíduos, vem da natureza da economia de mercado, que, para atingir seu objetivo maior, que é o lucro, corrompe para obter vantagens em seus negócios.

Lafaiete Neves, professor, é membro representante da Plenária Popular de Transportes na Comissão da Urbs para Análise da Tarifa.