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| Foto: Marcos Tavares/Thapcom

Em seu texto “Um roteiro para o MEC”, o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, afirma que nós, brasileiros, somos reféns de um sistema de ensino que impõe uma doutrinação “enquistada na ideologia marxista, travestida de ‘revolução cultural gramsciana’”. Apesar dos protestos de sempre, de que não há estudos científicos que comprovem tal visão, há exemplos bastante contundentes.

Em relação à doutrinação ideológica nas universidades, foi divulgada em 2017 uma compilação da bibliografia disponível nas bibliotecas das cinco universidades públicas brasileiras melhor colocadas no ranking de 2016 da Times Higher Education. O resultado mostra uma enorme desproporção entre livros de autores de esquerda e de direita. Na USP, onde esta desproporção é menor, para cada autor de direita há 3,2 de esquerda. Na UFMG, a diferença chega a 5,2 autores de esquerda para cada autor de direita.

Apesar dos protestos de sempre, de que não há estudos científicos que comprovem tal visão, há exemplos bastante contundentes

Se os acervos das universidades públicas, sem especificação por curso, claramente favorecem a difusão das ideias da esquerda, o que esperar de cursos nos quais tradicionalmente se fomenta a ideologia de viés “progressista”? Refiro-me principalmente aos cursos voltados para a formação de professores. Não há qualquer novidade em currículos de Pedagogia com disciplinas como “Paulo Freire - Teoria, Método e Práxis” (USP), “Raça, currículo e práxis pedagógica” (UFF), “Paulo Freire: Pensamento e obra” (UFF) e “Educação e Diversidade Étnico-Racial” (Ufal). Para um estudante de Pedagogia, nada mais corriqueiro que dedicar semestre após semestre ao estudo de teóricos esquerdistas. O problema é que, ainda que ele consiga sobreviver à lavagem cerebral e continue sendo capaz de pensar criticamente, ele sabe que o tempo que desperdiçou sendo doutrinado poderia ter sido melhor empregado. Sabe também que as ideias de Louis Althusser pouco lhe servirão quando precisar ensinar Matemática para crianças que, aos 9 anos, ainda não sabem ler.

E, se o leitor acha que disciplinas ideologicamente enviesadas só estão presentes em cursos para professores das áreas de Humanas, está enganado. A doutrinação imposta pelo Estado não perdoa nem mesmo aqueles que vão ensinar Ciências Exatas. Basta dar uma olhada no projeto pedagógico do curso de Licenciatura em Ciência da Computação da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). As disciplinas Projetos Integrados I, II e III obrigatoriamente terão de incluir “conteúdos de Educação e direitos humanos, Educação ambiental e sustentabilidade, Educação, gênero e diversidade sexual, Educação e relações étnico-raciais”. Trata-se de três disciplinas obrigatórias (três semestres, portanto) em que alguém que vai ensinar Ciência da Computação passa se dedicando a esses temas absolutamente alheios ao objeto de seu estudo. À nossa custa.

Da mesma autora: Solução estatal errada para um problema real (publicado em 31 de dezembro de 2018)

Leia também: Educação é outra história (artigo de Fausto Zamboni, publicado em 2 de agosto de 2018)

E alguém acha que pelo menos estes futuros professores de Ciência da Computação estão livres de Paulo Freire? Claro que não. Outra disciplina obrigatória é Fundamentação Sócio-Histórica da Educação, cuja referência básica é... Pedagogia do oprimido, de Paulo Freire. Outras disciplinas obrigatórias, de relevância igualmente duvidosa para o curso, custeadas com recursos públicos são Fundamentação Antropo-Filosófica da Educação e Educação Inclusiva.

Por outro lado, Redes de Computadores e Internet e Design de Software são disciplinas optativas. Ou seja, para a intelligentsia acadêmica, o professor de Ciência da Computação pode até não saber muito sobre redes ou sobre design de software, desde que ele aprenda que a classe burguesa oprime o proletariado, e que seja capaz de incluir “gênero, diversidade sexual e relações étnico-raciais” nas suas aulas – de Ciência da Computação!

Leia também: A reforma do ensino básico e o futuro dos grupos de educação (artigo de Cesar Silva, publicado em 30 de julho de 2018)

Bruno Garschagen: Quem é e o que pensa Ricardo Vélez Rodríguez, o novo ministro da Educação (publicado em 23 de novembro de 2018)

E, antes que alguém suponha que defendo o banimento de Paulo Freire ou qualquer outro autor, explico: o que defendo é o fim do monopólio do MEC sobre a formação e certificação docentes. Se aqueles que pretendem alfabetizar crianças ou ensinar Ciências da Computação, Biologia ou qualquer outra disciplina desejarem dedicar horas de suas vidas lendo teorias emboloradas sobre a educação libertadora para “oprimidos”, sobre a inexistência da verdade em um mundo em que “tudo é relação de poder”, ou sobre “gênero, diversidade sexual e relações étnico-raciais”, que sejam livres para fazê-lo nos cursos de Pedagogia e Licenciatura chancelados pelo MEC. No entanto, que chancelas privadas alternativas possam concorrer com a do MEC e que as escolas sejam livres para escolher seus profissionais, sejam eles provenientes de cursos com ou sem o selo do MEC. É a concorrência entre diferentes modelos e currículos e não a doutrinação imposta que formará professores mais capacitados.

Anamaria Camargo, mestre em Educação com foco em eLearning pela Universidade de Hull, é diretora do Instituto Liberdade e Justiça e líder do projeto Educação Sem Estado.
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