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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

O MEC divulgou recentemente uma proposta para formação docente que seria o primeiro passo para criar uma espécie de “Exame de Ordem” (em referência ao teste aplicado pela Ordem dos Advogados do Brasil) para professores. Ainda sabemos pouco sobre ele: que conteúdos cobriria? Com que frequência seria aplicado? Estaria disponível para os egressos das licenciaturas também? Diante da falta de informações, resta-nos especular.

Em um cenário próximo do ideal, parto do princípio de que a intenção do Estado é a de promover uma melhora no nível do ensino a partir de docentes mais qualificados. Suponho também que outro objetivo importante seja o de informar às escolas e seus clientes sobre a qualificação teórica dos profissionais disponíveis no mercado, não apenas porque isto permitirá escolhas mais adequadas, mas em respeito aos que pagam os salários de todos no setor educacional estatal. Como nenhuma dessas duas premissas – melhor qualidade e respeito ao pagador de impostos – é compatível com a existência de uma reserva de mercado, concluo que este será, portanto, um exame opcional. Aquele que concluísse o curso de Pedagogia ou Licenciatura poderia escolher se submeter ou não ao exame. E ao mercado caberia decidir se o exame é ou não necessário no momento da escolha por um profissional.

Segundo dados do Inaf, apenas 40% dos professores brasileiros são capazes de solucionar problemas de porcentagem e de resumir textos jornalísticos

Se for um exame de abrangência nacional, deverá ser bastante genérico; logo, não atenderá a critérios locais e à variedade de demandas do mercado. Pode-se pensar em um exame em duas fases, aos moldes do exame da OAB, mas isso o encareceria sem a garantia de que conteúdos específicos (metodológicos, filosóficos, didáticos etc.) fossem adequadamente testados. Além disso, por ser um exame estatal, certamente seguirá critérios ideológicos, o que, além de eticamente inaceitável, também é incompatível com a diversidade do mercado.

Isto posto, considerando os dois objetivos acima – melhor qualidade dos docentes e acesso a informação sobre sua qualificação –, tal exame ficaria longe do ideal. Sim, ele informaria ao mercado sobre o conhecimento dos docentes, mas apenas de acordo com os critérios deste exame, que não necessariamente seriam os mesmos em que o mercado teria interesse como parâmetros. Quanto à qualidade, devido à generalidade do escopo e ao viés ideológico, na melhor das hipóteses, o teste seria capaz de reter os muitos analfabetos funcionais.

Exagero? Não. Segundo dados do Inaf, apenas 40% dos professores brasileiros são capazes de solucionar problemas de porcentagem e de resumir textos jornalísticos. Pior: apenas 16% deles têm alto nível de alfabetismo. O próprio Inep acaba de divulgar que apenas 0,5% dos cursos de formação de professores a distância – onde está quase a metade dos alunos – têm nota máxima. Nos cursos presenciais, o porcentual não passa de 2,5%.

É melhor desregulamentar: Exame ou controle? (artigo de Fausto Zamboni, doutor em Letras, professor de Língua e Literatura Italiana na Unioeste e autor de “Contra a escola: ensaio sobre literatura, ensino e educação liberal”)

Dados esses números e o fato de que o próprio MEC prevê a necessidade de um exame, conclui-se que a chancela estatal não representa qualquer garantia de boa formação docente. Logo, além de não impor o seu exame, o Estado deve permitir que instituições privadas possam formar e certificar docentes. Não falo de concorrência entre faculdades públicas e privadas chanceladas pelo MEC; falo de concorrência entre diversas chancelas privadas e a pública. Sem isso, mais um simples exame estatal, ainda que opcional, será perda de tempo e de dinheiro.

Anamaria Camargo, mestre em Educação com foco em eLearning pela Universidade de Hull, é diretora do Instituto Liberdade e Justiça e coordenadora do projeto Educação Sem Estado.
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