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O atraso da estréia do novo governo foi vantajoso e não apenas por causa da expectativa criada em torno do lançamento do PAC. Ao contrário do que ocorreu em 2003, quando o país vivia um sonho e entregava-se à esperança, desta vez há ceticismo. Isso é ótimo: nada melhor do que a descrença para animar os crentes. Sobretudo aqueles mimados pela sorte.

O presidente Lula ficou decepcionado com as primeiras reações e manchetes, esperava maior adesão, mais entusiasmo. Homem de palanques, sensível às vibrações que capta dos circunstantes, imaginou que os aplausos que recebeu no palácio quando apresentou o seu programa, logo ecoariam pelo país afora.

Impossível galvanizar um país destas dimensões com aquela robusta e às vezes impenetrável coleção de projetos e propostas, algumas insuficientemente definidas e quase todas situadas no hermético departamento econômico.

O prêmio veio justamente da esfera política, sempre mais acessível especialmente quando apresentada de forma cabal, inequívoca, peremptória. O compromisso de crescer com democracia e a promessa de não ceder às tentações totalitárias, prescindiram de longos estudos e cálculos complicados, não precisarão ser regulamentados pela área jurídica nem aprovados pelos legisladores.

É evidentemente uma resposta à truculência do venezuelano Hugo Chávez e uma visível opção pelas posturas chilenas, mas é, sobretudo, a ferramenta para dissipar alguns temores fabricados aqui mesmo, nos últimos rounds da disputa eleitoral.

Colocado na defensiva pelas artimanhas dos aloprados do seu partido, o presidente Lula assumiu uma agressividade incompatível com a sua biografia e deixou angustiados aqueles que o consideravam um líder popular e não populista, democrata e não discricionário, responsável e não delirante.

Ironicamente, serão aquelas duas breves frases de teor puramente político e nas quais relembrou as suas convicções democráticas que servirão ao presidente Lula para vencer ou atenuar as resistências ao PAC no território econômico, administrativo, fiscal ou jurídico.

"Pouco me interessaria um aumento expressivo no PIB se isso implicasse, o mínimo que fosse, em redução das liberdades democráticas. Assim como não adianta crescer sem distribuir, não adianta crescer sem democratizar." Assinado: Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República.

Crescimento com respeito ao Estado de Direito significa negociação, recuo, busca de diálogo, aproximações. A poção democrática tem algo de mágica, talvez seja a única capaz de transformar crescimento em desenvolvimento. As diferenças não são semânticas: desenvolvimento pressupõe direção e conteúdo do crescimento.

O país precisa alcançar um aumento no PIB de 5%, mas este aumento só se sustentará se forem preservadas certas regras de convivência sem as quais será impossível criar a sensação de comunidade. Um clique no computador é capaz de alterar muita coisa, desde que a máquina esteja ligada à rede. Para ligá-la basta uma senha. E algumas palavras convincentes.

O PAC desagradou a governadores, ao funcionalismo, às lideranças sindicais, aos empresários que não conseguem sobreviver com as atuais taxas de juros ou foram excluídos do PAC. Suas queixas são justas, as diferenças de pontos de vista não são desprezíveis, mas todos foram previamente avisados de que serão ouvidos.

O modelo de aceleração foi apresentado junto com um sistema capaz de evitar manobras abusivas e desgastes, é isso que está no seu manual de instruções lido pelo presidente Lula. Doravante é isso o que conta, é isso que vai reger as relações entre governantes e governados.

O debate democrático é meio e fim. Serve para promover entendimento em questões pontuais e serve principalmente para definir uma sociedade.

Alberto Dines é jornalista.

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