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Da mulher às expressões femininas que devem começar por esperança
| Foto: nastya_gepp/Pixabay

No primeiro dia das mulheres da nova década, sucedendo ao assustado em prenúncios de lockdown 2020, o que temos? Vamos repetir discussões comerciais sobre a data, adornadas de tons rosáceos, perfumes doces e chocolates? Vamos cair em polêmicas e intermináveis discussões de gênero?

Obviamente, como mulher e médica, respeito muito a data. Mas, depois de sermos atropelados e atropeladas pelo Sars-CoV-2, restamos à mingua com imagens intrusivas de telejornais com covas rasas enlameadas exponenciando estatísticas de óbitos; temos a voz de alguém próximo entrecortada, ofegante e, quando não, enlutada e ausente.

Nos 365 dias que separam os “8 de março”, não nos faltaram comoções com as crises sanitária e econômica, com a emergência climática, com a violência doméstica, com as crianças sem escola e tantas outras mazelas. Saturados, desalentados e dessensibilizados, já não mais celebramos nossos e nossas colegas, exaustos na linha de frente: plantonistas, intensivistas, anestesistas... E mais: enfermeiras, técnicas, fisioterapeutas, auxiliares de limpeza, agentes funerários; operários, motoristas, eletricistas, educadores. Homens e mulheres, pais e mães, irmãos e irmãs, amigos e amigas. Enfim, hoje, colegas.

Se nos dermos por perplexos, que este momento nos rememore os pais que ficaram em casa por mais tempo com suas crianças, brincando e assistindo a aulas no computador, assando um bolo ou mesmo lavando a louça. Que nos demos conta de quanto os avós participam ativamente das famílias, pelo simplório e tão digno trocar um botão, consertar uma torneira ou assistir a desenhos com nossos filhos pequenos. Que percebemos a delicadeza da natureza, da deliciosa trivialidade de nossas rotinas, das pequenas conquistas. Em que todos aprendemos sobre a efemeridade da vida e a vastidão da saudade, valorizando o tempo como bem finito, escolhendo melhores palavras de conforto para os próximos.

O construto da pandemia em nossa língua-mãe é feminino, não por menos perigoso e arriscado, mas ouso por isso chamar o dia das mulheres a estes: a temerosa virulência, a alta transmissibilidade, a insana insegurança, a irrefreável ansiedade, as descabidas fake news, a ignorante violência, a aumentada distância, as incongruentes diferenças. Toda esta covarde destruição, palavra também feminina, nos espelhou em fraquezas e fortalezas para jornada difícil, perene exaustão, com a imperiosa resiliência e a colorida criatividade, a terna paciência, a esperança, a fé e a coragem, a força da vida; feminina na humanidade de cada um de nós, independentemente de gênero.

Laura Moeller é médica especialista em clínica médica e reumatologia, mestre em Medicina Interna e conselheira do CRM-PR.

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