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Desidratar o BNDES é um erro estratégico
| Foto: Leo Pinheiro/Valor

O relatório da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/19, que propõe a reforma do sistema de seguridade social, foi apresentado em Comissão Especial em 13 de junho e será votado em breve. A maioria da população já entendeu a importância do tema. O Brasil precisa de um sistema previdenciário mais justo e sustentável, com menos privilégios, e também demanda mais investimentos. Por isso a aprovação de uma reforma abrangente da Previdência se tornou tão importante, inclusive para estados e municípios, que deveriam ser incluídos nas mudanças.

A reforma indica que o Brasil terá condição de oferecer um sistema de seguridade social que caiba no orçamento público no longo prazo. Essa mensagem é valiosa para quem precisa e deseja empreender e investir no país – e para quem precisa dos empregos, da renda e das oportunidades de negócios que surgem destes investimentos.

Além disso, a reforma abre espaço no orçamento público para os governos investirem mais, sobretudo na infraestrutura, setor no qual R$ 1 bilhão em investimentos gera 22 mil empregos diretos e indiretos. No Brasil, 30 milhões de pessoas trabalham menos do que gostariam, incluindo 13 milhões de brasileiros que estão desempregados, pois faltam investimentos em infraestrutura, gastos autônomos que precisam vir antes da demanda.

É um erro estratégico reduzir o financiamento dos programas de desenvolvimento e de investimento conduzidos pelo BNDES

No entanto, o relatório apresentado na Comissão Especial trouxe um dispositivo preocupante que mexe na composição do orçamento do BNDES, transferindo recursos antes enviados para o banco de fomento para o custeio do sistema previdenciário.

Atualmente, a Constituição Federal determina, no artigo 239, que 40% dos recursos do PIS/Pasep devem ser direcionados para financiar programas de desenvolvimento econômico conduzidos pelo BNDES. Essa fonte tem representado cerca de um terço do orçamento do BNDES entre 2015 e 2018. No relatório da reforma da Previdência, essa determinação foi extinta, substituída por outra, que manda alocar no mínimo 28% de tais fontes para o financiamento de aposentadorias e pensões no Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

É importante encontrar fontes de recursos para o regime previdenciário, claro. Mas é um erro estratégico reduzir o financiamento dos programas de desenvolvimento e de investimento conduzidos pelo BNDES, pois eles serão responsáveis por gerar empregos, renda e oportunidades. O caminho de desidratar o orçamento do BNDES é equivocado.

Em uma eventual retomada econômica, poder haver sérias dificuldades para sustentar a demanda por investimentos se, de outro lado, as fontes de financiamento a tais empreendimentos forem escassas. Esse fenômeno poderá ser presenciado principalmente para projetos de grande envergadura, complexos e/ou que não apresentem as condições de retorno atraentes – mas que, mesmo assim, são determinantes para remover gargalos ou prover condições ao crescimento.

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Um exemplo está no setor ferroviário, onde os projetos são de longo prazo, com desafios de viabilização e com taxas de retorno mais desafiadoras. Mesmo alongando prazos para amortização do capital investido, muitos empreendimentos ferroviários podem não encontrar fontes de financiamento que não sejam um banco de fomento como o BNDES, sobretudo por causa de exigências de prazo mais dilatados.

O BNDES, historicamente, tem cumprido função importante de assessorar e financiar programas e projetos de investimentos com objetivo de promover desenvolvimento econômico e social. Nos anos recentes, no entanto, diversas medidas adotadas têm sido equivocadas, pois acabam restringindo a potência do banco em momentos em que a instituição deveria ser mais acionada.

A diretriz adequada é manter a instituição de fomento brasileira forte e capacitada para, no longo prazo, escorar a retomada do crescimento econômico. Em que pese o benefício e a importância do fortalecimento e da expansão das fontes privadas de financiamento dos investimentos, sobretudo do mercado de capitais, o BNDES permanecerá com papel relevante na oferta de crédito para programas e projetos mais desafiadores.

Outra função importante, além da oferta de crédito para projetos que não encontrem suporte financeiro no mercado privado, é a condução do programa brasileiro de desestatização, como já ocorreu no passado, e das iniciativas de estruturação de projetos de concessões e parcerias público-privadas (PPPs), como começou a ser feito recentemente.

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Além dos equívocos estratégicos, a proposta de transferir os repasses antes enviados para BNDES para o regime de previdência apresenta um problema técnico. Uma vez que os recursos do PIS/Pasep não são contabilizados pelo governo como despesas, a mudança de destinação dos recursos para a Previdência, ao serem contabilizados nas contas públicas, acarretará em aumento do déficit fiscal. Assim, o efeito desejado pelo governo será o inverso.

O Brasil investiu, em média, 1,7% do PIB na infraestrutura nos últimos três anos – e nunca investiu mais que 2,5% nos últimos 15 anos. No entanto, precisa investir 4,3% do PIB por dez anos seguidos somente para remover gargalos ao desenvolvimento. No atual estágio de desenvolvimento do Brasil, é fundamental contar com uma instituição como o BNDES.

Venilton Tadini é presidente-executivo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base (Abdib).

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