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A consultoria, no Brasil, desenvolveu-se com grande força a partir da década de 70 do século passado, sob a égide do Banco Mundial, então o principal órgão financiador da infraestrutura em implantação no país. Ela trouxe de fora grandes nomes e absorveu o que havia de melhor, particularmente nos setores elétrico e de transportes. No setor de petróleo, ela sempre foi atuante (particularmente a estrangeira), uma vez que, nos seus primórdios, não havia experiência local.

A partir desse período, grandes empresas de consultoria se estabeleceram, cresceram e desenvolveram tecnologias autóctones que permitiram ao país grandes saltos de conhecimento (know how) e a aplicação desses conhecimentos às questões específicas colocadas pelas condições brasileiras. Nesse trabalho, elas tiveram o inestimável apoio e assistência de órgãos e empresas estatais, com as quais estabeleceram parcerias fundamentais, mercê do diálogo de alto nível que se estabeleceu entre as equipes das consultoras e os técnicos qualificados e experientes dos órgãos e empresas contratantes. Havia, então, uma compreensão da importância da qualidade dos projetos e dos custos que essa qualidade impunha.

Infelizmente, esse quadro de bonança não foi além da década seguinte, quando o até então decantado “milagre brasileiro” do regime militar entrou em parafuso pela crise mundial do petróleo que resultou da elevação dos preços dessa commodity e pela teimosia do governo de então de manter o Brasil como uma “ilha de prosperidade” enquanto o resto do mundo reduzia seu ritmo.

Ainda há muitas equipes técnicas de alto nível, suficientemente corretas e capazes de levar avante verdadeiros projetos no Brasil

A partir desse período, as obras de infraestrutura minguaram e os projetos (assim como os preços pagos pelos mesmos) seguiram o mesmo caminho. Foi o tempo dos famigerados “projetos simplificados” que nada mais eram que adaptações da tecnologia ao dinheiro disponível. Um desastre sob todos os pontos de vista. Em vez de projetos detalhados e consistentes, houve trabalhos sem base técnica sólida, executados em prazos incompatíveis apenas para atender a interesses político-eleitorais e sem condigna remuneração aos técnicos e às empresas. Uns e outros precisavam sobreviver e, para isso, foram sendo obrigados ou a abrir mão do rigorismo ou a buscar outros caminhos. Como consequência, as equipes foram sendo progressivamente desfeitas e a experiência conjunta dos corpos técnicos foi desaparecendo paulatinamente.

Hoje, estarrecidos, tomamos conhecimento de que a Petrobras passou a realizar obras complexas, como refinarias, sem projetos executivos! E, mais ainda, que “empresas de consultoria” com equipes inexpressivas, duvidosas e até mesmo unipessoais, algumas com escritórios em locais insólitos (como prisões, por exemplo), executam trabalhos de consultoria (até de caráter supostamente internacional) mais que regiamente remunerados!

Há de se tomar cuidado, entretanto, para não arrancar o trigo (que ele existe!) junto com o joio e não jogar o bebê com a água do banho, pois infelizmente é isso que estamos arriscados a fazer. O fato de que hoje a atividade de consultoria sirva para encobrir projetos de má qualidade – ou, pior ainda, esconder dinheiro de corrupção – não significa (ou não deveria significar) que devemos execrar ou acabar com a consultoria, do mesmo modo como o petrolão não deve significar execrar ou acabar com a Petrobras, ou que a degradação da política determine o fim da própria política. Ainda há muitas equipes técnicas de alto nível, suficientemente corretas e capazes de levar avante verdadeiros projetos no Brasil. Bastaria, para reavivar as chamas a partir das brasas existentes, uma nova mentalidade que poderá nascer das cinzas de todo esse descalabro exposto agora aos olhos da nação. Que a racionalidade e, por que não?, a vergonha voltem a imperar!

José Antonio Urroz Lopes é geólogo com mais de 50 anos de trabalho na área de Consultoria de Engenharia de Transportes.
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