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Em defesa da segurança jurídica e da proteção da confiança
| Foto: Felipe Lima

A reforma administrativa em pauta traz significativas alterações no regime jurídico dos servidores públicos estatutários e tem gerado intenso debate entre juristas, parlamentares e servidores públicos. Objetivando a diminuição do gasto de pessoal com os servidores públicos estatutários, a reforma pretendida tem como ponto central a revisão do instituto da estabilidade no serviço público.

Além de restringir a garantia da estabilidade apenas para algumas carreiras, como a Polícia Federal, as Forças Armadas e a Receita Federal, o projeto de reforma administrativa prevê, dentre outras iniciativas, a redução do número de cargos públicos; o estabelecimento de critérios de avaliação por insuficiência de desempenho para desligamento de servidores públicos; a eliminação do regime de promoção automática por antiguidade, fixando-se exclusivamente o sistema de mérito para as movimentações funcionais; e a ampliação do regime de contratação temporária.

No sistema constitucional brasileiro prevalece a relação estatutária entre o Estado e seus servidores. Ressalvadas, obviamente, as situações configuradoras de direito adquirido, o Estado detém o poder de alterar legislativamente o regime jurídico de seus servidores. Isso significa que não existe garantia de que os servidores serão sempre disciplinados pelas regras que vigoravam quando ingressaram no serviço público.

Registre-se que qualquer reforma que pretenda modificar a garantia da estabilidade no serviço público só pode ser implementada mediante emenda constitucional. Entretanto, aquelas situações já consolidadas como direito adquirido não podem ser desconstituídas, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. As modificações a serem introduzidas pela reforma administrativa não poderão desconstituir situações jurídicas já conquistadas por servidores públicos, aplicando-se suas disposições apenas àqueles que ingressarem no serviço público após a sua implementação.

As conquistas dos servidores públicos durante a trajetória de suas vidas funcionais e que se integram ao seu patrimônio como direitos adquiridos não podem ser atingidas ou modificadas por posterior inovação legislativa. Esses direitos constituem autêntico direito adquirido e, por isso, devem ser obrigatoriamente resguardados.

Os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança também podem ser invocados como barreira às radicais transformações determinadas pelo Estado no regime jurídico do servidor público. Do princípio da segurança jurídica, deduz-se como conteúdo jurídico essencial que os atos emanados da administração pública respeitem um mínimo de previsibilidade e, com o princípio da proteção da confiança, deles se extrai que o poder público não está autorizado a adotar providências novas, modificando as que foram anteriormente por ele próprio encetadas, surpreendendo a confiança depositada pelos cidadãos na conduta estatal e desconstituindo situações jurídicas consolidadas.

A reforma administrativa não poderá suprimir ou modificar situações que já tenham sido incorporadas ao patrimônio jurídico do servidor como autênticos direitos adquiridos, mas também não poderá desconstituir situações já consolidadas pelo decurso do tempo, sob pena de violação aos princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, principalmente os da proteção da confiança ou da boa-fé e da segurança jurídica.

Ana Cláudia Finger é advogada e professora de Direito Administrativo da Universidade Positivo.

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