Apesar de estar sendo tratada como vilã na discussão do novo Código Florestal, a agricultura familiar é a grande responsável pela segurança alimentar do País
Informações distorcidas semeadas por todo o País estão contaminando o debate sobre o novo Código Florestal. Duas delas têm, notadamente, causado prejuízos à discussão: a primeira é que a agricultura e a pecuária estariam se expandindo à custa do desmatamento de matas nativas; a segunda é que a agricultura familiar deveria ter reserva legal semelhante à exigida para médias e grandes propriedades rurais. A análise dos dados do insuspeito Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desmente essas duas teses: a área da agropecuária está encolhendo no mapa do Brasil, e a agricultura familiar, com média de 18 hectares por produtor, faz uso intensivo da terra, cuja grande parte foi desmatada ainda no Brasil Colônia.
Não é difícil desmontar a tese do aumento do desmatamento das matas nativas pela agropecuária. Atentemos para o caso do Paraná, um dos principais polos da produção agrícola nacional, é um exemplo dessa realidade, ignorada por aqueles que querem tumultuar o processo de votação do novo código. No Paraná, o confisco das terras da atividade rural fez com que elas tivessem uma redução de 660.098 hectares, entre 1996 e 2006, quando foi feito o último censo agropecuário do IBGE. Em toda a Região Sul, a redução de área chegou a 2,8 milhões de hectares.
Os especialistas atribuem a redução da área da agropecuária, nesses dez anos, à ampliação da demarcação de áreas indígenas, que teve aumento de 128%, e à expansão de unidades de conservação, que cresceu em 19%. Em contrapartida, o número de propriedades rurais saltou de 4,8 milhões para 5,2 milhões no período. Desse total, a agricultura familiar contava, em 2006, com 4,3 milhões de unidades de produção.
Apesar de estar sendo tratada como vilã na discussão do novo Código Florestal, a agricultura familiar, mesmo ocupando apenas 24% da área total da agropecuária, é a grande responsável pela segurança alimentar do País. Ela é responsável por abastecer a mesa do brasileiro com 87% da produção nacional de mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 58% do leite, 59% do rebanho de suínos, 50% das aves, 30% dos bovinos, 21% do trigo e 16% da soja. Aliás, para desconsolo de alguns ambientalistas, a agricultura familiar também produz essa outra "erva do diabo", a soja, introduzida no Brasil pelas mãos de um poeta modernista, o gaúcho Raul Bopp, e de uma escritora comunista, a paulista Patrícia Galvão, a Pagu, que contrabandearam sementes da China na década de 1930.
Com média de 18 hectares por propriedade, a agricultura familiar tem dificuldades intransponíveis para atender às elevadas e inoportunas exigências de áreas de proteção permanente e reserva legal. Pelo Código Florestal em vigor, ela deve conservar uma faixa de 30 metros nas margens dos cursos dágua com até 10 metros de largura não importa que seja um filete dágua de apenas um palmo que seca na estiagem.
Em inúmeros casos, a cobertura florestal original foi removida há séculos, desde o início da colonização do país. Ainda assim, segundo o Censo Agropecuário de 2006, nada menos que 28% da área das propriedades familiares estavam cobertas por mata, florestas e "sistemas agroflorestais", na definição do IBGE, com taxa de reserva legal média de 10%. Agora, querem que o pequeno agricultor reponha toda a porcentagem de cobertura florestal exigida em lei. Ora, isso significa obrigá-lo a arrancar lavouras para replantar vegetação nativa, o que é uma total insensatez.
Por isso o projeto do novo Código Florestal isenta a pequena propriedade de manter a reserva legal, para que ela possa continuar usando toda a terra disponível na produção de comida para o povo brasileiro.
Aldo Rebelo, deputado federal pelo PCdoB-SP, é relator do projeto de lei do novo Código Florestal Brasileiro.
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