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Fartura de crédito não significa descuido na análise do tomador, pois o país poderia recair no erro dos Estados Unidos em relação aos créditos sub-prime

O despertar das classes C e B e a migração de uma parcela significativa da população brasileira para a classe média trouxeram a oferta de crédito no país, cuja expectativa é que atinja 50% do PIB nos próximos anos.

Esse crédito tem sido disponibilizado em várias frentes, seja no setor imobiliário, seja para a aquisição de bens duráveis, empréstimos de curto e longo prazo, entre outros, contribuindo inclusive para que o Brasil, por força do crescimento do mercado interno, superasse a crise de 2008 quase incólume, marchando a passos largos como o sétimo principal mercado consumidor do mundo.

Entretanto, fartura de crédito não significa descuido na análise do tomador, pois o país poderia recair no erro dos Estados Unidos em relação aos créditos sub-prime. Desse modo, a concessão de crédito impõe que as instituições concedentes desenvolvam habilidades no gerenciamento do risco, permitindo um correto dimensionamento desse, refletindo na diminuição dos juros.

Quanto menor o dimensionamento do risco, maior a inadimplência, e, por conseguinte, mais elevada a taxa de juros, forçando os bons pagadores a se submeterem a créditos cada vez mais caros, ainda que não tenham culpa pelo inadimplemento causado pelos que não cumprem com as suas obrigações.

No âmbito empresarial, a história não é diferente. Atualmente, as próprias empresas produtivas são concedentes de crédito a seus clientes, forçando-as, dessa maneira, a criarem uma cultura para o dimensionamento de seus riscos, possibilitando que a realização de transações comerciais não implique em aumento do número de inadimplência.

Limites de crédito concedidos por fornecedores, por exemplo, para serem outorgados, devem sofrer uma minuciosa análise da empresa concedente, que precisa conhecer efetivamente alguns aspectos da empresa tomadora: o endividamento, a imagem, o cenário econômico do ramo de atuação, a situação patrimonial, clientes e fornecedores, relacionamento com as instituições financeiras, o comportamento enquanto pagadora, a possibilidade de concessão de garantias.

Não bastassem esses indicativos, existem sinais de alerta que a empresa tomadora pode dar durante uma negociação, e que podem ser decisivos na concessão do crédito, como, por exemplo, a mudança de gestão, investimentos realizados em atividades distintas a da empresa e administradores com histórico de insucesso.

Não é apenas a possibilidade ou não de se conceder um crédito que deve ser analisada, mas também o quanto conceder, já que a concessão elevada de crédito (overdose de crédito) pode quebrar a empresa tomadora, fazendo com que ela faça aquisições, que suplantem sua real capacidade financeira.

O fato é que o modelo de avaliação de risco atual, seja no mercado financeiro, ou em transações comerciais, é impreciso, submetendo algumas empresas a riscos que poderiam ser evitados ou, pelo menos, melhor dimensionados.

Desse modo, é imperiosa a mudança do modelo atual de concessão de crédito, especialmente entre empresas não financeiras, inclusive do ponto de vista cultural, para que o mercado se mantenha aquecido e sem sustos desnecessários nas relações comerciais, os quais, certamente, podem representar enorme prejuízo econômico para as empresas.

Luciana Kishino é advogada da área cível.

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