| Foto: André Rodrigues/André Rodrigues

Retomo, caros leitores, o tema de dois artigos recentes publicados neste espaço opinativo: “Imprensa, recados de uma eleição” e “Lufada conservadora”. A razão é simples e direta: sinto, com inquietante angústia, que o tempo da autocrítica e da mudança estratégica propositiva da mídia se encurta de modo acelerado. A eleição de Jair Bolsonaro escancarou uma virada cultural profunda que sacode os alicerces do jornalismo tradicional. A imprensa, no entanto, parece estar paralisada pela síndrome da negação. De costas para as mudanças que estão gritando na nossa frente, na queda da circulação, na diminuição das audiências, aferra-se a um passado que não voltará mais. As empresas de conteúdo, éticas e independentes, são essenciais para a democracia. Mas precisam se reinventar. E parte importante dessa mudança, urgente e necessária, passa por uma autocrítica sincera, que não briga com a realidade e com a força dos fatos.

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Muitos foram os recados dessa eleição disruptiva. O presidente eleito soube captar o pulsar profundo da sociedade. O Brasil real estava algemado pela interdição da ideologia. Sua mensagem – na política, na economia, na segurança pública, da defesa da família e dos valores – foi ao encontro de um sentimento latente na alma nacional. Isso explica uma boa parte do seu desempenho. Sem dinheiro, sem partido, sem televisão e sem apoio midiático, Bolsonaro transformou-se num fenômeno eleitoral.

Em nenhum momento desmontamos a fábula petista

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As redes sociais, por óbvio, tiveram um papel decisivo. Bolsonaro falou diretamente com o eleitorado. Rompeu, como nunca antes se tinha visto, a intermediação das empresas de comunicação. E a coisa está pegando. Mas não cola por acaso. O fenômeno de desintermediação teve, creio, precedentes que poderiam ter sido evitados não fosse o distanciamento da mídia dos seus leitores, sua incapacidade de entender o alcance das novas formas de consumo digital da informação e, em alguns casos, sua falta de isenção informativa e certa dose de intolerância ideológica.

Escorregamos na largada da cobertura eleitoral. Assumimos, sem senso crítico, a estratégia petista de que Lula era candidato à Presidência da República em 2018. Não apenas isso: a mídia, contra o sentimento da maioria da população, garantia que o ex-presidente, cumprindo pena por corrupção e na contramão da Lei da Ficha Limpa, era favorito disparado para ganhar. Entramos de cabeça numa hipótese muito pouco provável. Nossas manchetes, apoiadas na abstração dos institutos de pesquisa, asseguravam que Lula era imbatível. Em nenhum momento desmontamos a fábula petista.

Quando o próprio Lula, finalmente, anunciou que não era candidato, e os institutos mudaram o foco, entramos de cheio na segunda fase da estratégia petista: Haddad era a bola da vez. O poder eleitoral de Lula, transferindo milhões de votos de sua cela em Curitiba, elegeria o poste. Mas não paramos aí. Entramos, mais uma vez, na roubada dos institutos: Bolsonaro perderia de “todos os outros candidatos” no segundo turno, em “todas as pesquisas”. Lembram disso? Pois é. Deu-se o exato contrário. Perigosos desvios de rota levaram a mídia a um porto inseguro.

Leia também: Quem elegeu Bolsonaro? (artigo de Adriano Gianturco e Lucas Azambuja, publicado em 4 de novembro de 2018)

Leia também: A “nova era” e os sete dias que chacoalharam a grande mídia (artigo de Bruno Dornelles, publicado em 7 de dezembro de 2018)

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A verdade, limpa e pura, é que, frequentemente, a população tem valores opostos aos nossos. É, por exemplo, a favor da polícia, que a imprensa considera inimiga dos pobres, e contra os bandidos, que os jornalistas consideram vítimas da injustiça social.

O jornalismo precisa fazer a leitura correta e isenta dos acontecimentos. É preciso informar com objetividade. Esclarecer os fatos sem a distorção das preferências e dos filtros ideológicos.

A internet, o Facebook, o Twitter e todas as ferramentas que as tecnologias digitais despejam a cada momento sobre o universo das comunicações mudaram a política e mudarão o jornalismo. Queiramos ou não.

É hora de dinamitar antigos processos e modelos mentais ideológicos. A crise é grave. Mas a oportunidade pode ser imensa. A todos, feliz Natal!

Carlos Alberto Di Franco é jornalista.