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Enquanto as discussões do novo Código Florestal continuam travadas por causa da dificuldade de definir pontos sensíveis, os agricultores norte-americanos ganham novos incentivos financeiros para manter, temporariamente, a vegetação nativa nas propriedades, e conservar a biodiversidade.

Por meio do Conservation Reserve Program (CRP), o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) dá incentivos aos produtores que deixam de produzir e mantêm as áreas conservadas por um período que varia de dez a 15 anos. O programa existe desde 1985 e foi criado não com propósito ambiental, mas sim para evitar a sobreprodução de alimentos, o que deprimiria ainda mais os preços, visto que na época a agricultura norte-americana passava por um período de recessão.

Atualmente, o valor pago aos agricultores é de US$ 100 acre/ano, ou US$ 250 por hectare. O USDA anunciou que pretende aumentar o pagamento para US$ 150 acre/ano, ou US$ 375 por hectare, visando proteger áreas sensíveis que chegariam a mais de 400 mil hectares. A proposta do governo é evitar que mais de 2,6 milhões de hectares protegidos atualmente voltem a ser utilizados para produção, considerando que o prazo de conservação de até 15 anos expira no outono. O grande desafio do governo norte-americano é convencer os produtores a manter essas áreas conservadas, pois o custo de oportunidade da terra deve fazer com que boa parte da área volte a ser cultivada. Apesar de ser um incentivo, os US$ 100 ou US$ 150 por ano ainda são pequenos diante do retorno propiciado pelas culturas agrícolas.

Outro programa, Working Lands for Wildlife Habitat, destina US$ 33 milhões para parcerias entre agricultores, pecuaristas e proprietários de terras com florestas a fim de restaurar e proteger os hábitats para a vida selvagem, o que é relevante considerando que a caça é permitida em vários estados. O programa busca incentivar a visão de que é possível produzir, conservar a biodiversidade e permitir que as pessoas usufruam dos recursos naturais. Além disso, há uma iniciativa que destina US$ 10 milhões a projetos que visam aprimorar a qualidade da água, a proteção dos hábitats e a produtividade do solo.

Os produtores americanos não são obrigados a conservar parte de sua fazenda como no Brasil, e recebem incentivos quando o fazem. As fazendas brasileiras protegem mais de 250 milhões de hectares de vegetação nativa, via APPs e áreas de Reserva Legal, que desempenham papéis fundamentais na conservação da biodiversidade. No entanto, os produtores brasileiros não recebem nenhum estímulo financeiro.

As discussões sobre pagamento por serviços ambientais (PSA) no Brasil precisam sair do plano teórico. O programa Produtor de Água, por exemplo, visa estimular projetos de pagamento por serviços ambientais ligados à proteção e melhoria da qualidade da água. Casos como o Conservador das Águas, no município de Extrema (MG), o Projeto Produtor de Água na Bacia do PCJ, o Projeto Oásis, em Apucarana (PR) e o Projeto Guariroba, no Mato Grosso do Sul, são alguns dos exemplos concretos de PSA.

O desenho de políticas de comando e controle é ultrapassado e ineficiente. O Código Florestal atual é um exemplo de como é preciso agregar às obrigações impostas pela lei, incentivos que premiem e diferenciem quem mantém e conserva a vegetação nativa e, consequentemente, todas as riquezas inerentes a ela.

Enquanto nos Estados Unidos os produtores, que, além de receber fartos subsídios, ganham incentivos para conservar áreas de sua fazenda, no Brasil os produtores têm a obrigação de conservar áreas sem ganhar nada em troca. Reconhecer o papel dessas áreas para a conservação da biodiversidade e valorizar os agricultores que deixam de produzir em parte de sua área para gerar outros benefícios à sociedade é um grande desafio para o país. A Constituição Federal prevê que essa conta deve ser dividida por todos os beneficiários, e a construção do desenvolvimento sustentável depende disso.

Rodrigo C. A. Lima, gerente do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), é pesquisador da Rede de Conhecimento do Agro Brasileiro. E-mail rlima@iconebrasil.org.br

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