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O Instituto DataFolha publicou recentemente o resultado de interessante pesquisa sobre o perfil da juventude brasileira. O estudo pode ser considerado como o mais completo já realizado no Brasil. Foram entrevistados 1.541 jovens com idade entre 16 e 25 anos, para expressar o retrato socioeconômico e político-cultural dos mais de 35 milhões de jovens que representam 19% da população brasileira. Nossa população está envelhecendo, pois os jovens estão longe de ser maioria.

Sobre a cor da pele indicadora da origem racial, 53% dos entrevistados declararam-se pardos ou negros e 36% brancos; 4% disseram ter pele amarela e 3% declararam-se indígenas. Para nós, que vivemos no sul, é bom ter consciência dessa atual realidade etnográfica brasileira, a fim de superarmos eventuais preconceitos raciais explícitos ou latentes. Surpreende que o porcentual de jovens de origem oriental seja relativamente tão expressivo e supere o número de brasileiros indígenas ou de seus descendentes. Somos, portanto, uma população de pardos, negros e brancos, mesclada por alguns olhos amendoados e por semblantes tupis-guaranis que ainda resistem ao desmonte de suas identidades étnicas causado pela hegemônica supremacia da comunidade indo-européia majoritária.

Quanto à ocupação principal, a pesquisa apontou que 35% da população juvenil só trabalha; 25% são apenas estudantes; 25% estudam e trabalham, e 15% não estudam e nem trabalham. Assim, o porcentual dos que somente estudam é pequeno, se comparado com o de países considerados desenvolvidos. Já os que trabalham de forma permanente ou fazendo "biscates" somam 60% da juventude brasileira, aí incluídas as jovens donas de casa, que representam 5% desse batalhão juvenil.

Surpreendeu-me saber que o sonho de 51% dos nossos jovens é ter um emprego e trabalhar. Destes, 18% sonham em ser médico ou advogado. No primeiro caso, a explicação parece fácil. A medicina é uma atividade profissional respeitada e capaz de garantir uma vida de bem-estar social. Afinal, os médicos ainda dispõem de um mercado com boas oportunidades de trabalho.

Quanto à advocacia, creio que o sonho se deve às imagens midiáticas dos grandes e famosos advogados, que conquistaram o sucesso profissional e financeiro na defesa dos autores das fraudes bilionárias contra a administração pública e o sistema econômico financeiro. Parece que os jovens desconhecem que a maioria dos advogados dá duro para se manter na atividade profissional. Tudo indica que as carreiras da magistratura, do Ministério Público, da Polícia Federal e as assessorias jurídicas em geral também influenciaram a resposta dos jovens em relação aos seus projetos de vida profissional.

O sonho juvenil de uma vida melhor, passa também pelo desejo de ter casa própria (14%); terminar os estudos (12%); ter uma boa família (10%); ganhar dinheiro (9%), e ter um carro ou uma moto (4%). Apenas 3% responderam que seu maior sonho é ser feliz e um porcentual menor ainda de 1% sonha com "um mundo sem violência".

É verdade que a pergunta apenas indagou "Qual é o seu maior sonho?". E a resposta veio de forma espontânea. Mas suficiente para desmontar a romântica imagem que povoa o nosso imaginário e que ainda pinta o jovem como contestador, rebelde e politicamente engajado. Na verdade, o que o jovem quer (ou disse querer) mesmo é emprego e trabalho. Nesse ponto, seus maiores sonhos são apenas materiais. Sonham viver uma vida materialmente melhor do que, nós adultos, estamos lhes proporcionando.

Confesso que me surpreendi com o resultado da pesquisa. O articulista da Folha de S. Paulo, Contardo Calligaris, foi além e se confessou assustado. Pois, como disse ele, ainda acreditávamos "numa visão cinematográfico-literária da adolescência" e pensávamos que os jovens "fossem insubordinados e visionários". A pesquisa revelou, ao contrário, que os jovens já não estão mais politicamente comprometidos com as transformações sociais. Ou, quem sabe, vivíamos iludidos com o mito de uma juventude inevitavelmente rebelde, contestatória e revolucionária?

João José Leal é professor da Pós-Graduação em Ciência Jurídica da CPCJ/Univali. É ex-procurador-geral de Justiça e promotor de Justiça aposentado.

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