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Prometo aos 212 amigos que farei uma última visita ao Facebook, mas a partir daí não garanto nada, pois, para­­­doxalmente, meus amigos da rede virtual exigem mais tempo e atenção do que os de carne e osso

Dizem que a penetração das redes sociais é tão grande que até o ditado mudou. Antes era "O que acontece em Las Vegas permanece em Las Vegas" (ou simplesmente Vegas para os íntimos). Agora é: "O que acontece em Vegas acaba no Facebook"...

É realmente inacreditável que 600 ou 700 milhões de pessoas acessem regularmente Facebook, Twitter, Linkedin, Orkut e um rosário de redes compostas por indivíduos do mundo todo para, pura e simplesmente, saber o que os outros estão fazendo ou fazer os outros saberem o que estão fazendo. Fui convidado a entrar no Facebook e desde então vivo em estado de permanente remorso. Não passa dia sem que chegue uma mensagem da rede lamentando que eu não o acesse já há algum tempo, frustrando 212 amigos que aguardam uma mísera palavra minha. Na última mensagem, mais direta e incisiva, fiquei sabendo que me esperam 38 mensagens e uma "cutucada", que não sei o que é mas deve ser o correspondente eletrônico de uma leve descompostura. Prometo aos 212 amigos que farei uma última visita ao Facebook, mas a partir daí não garanto nada, pois, paradoxalmente, meus amigos da rede virtual exigem mais tempo e atenção do que os de carne e osso.

Essa ânsia de socialização, de belongingness, palavra que foi traduzida para o horroroso "pertencimento", traduz um desejo de se sentir membro aceito de um grupo ou comunidade e é um dos traços da nossa época, o que parece contraditório quando se observa que ela convive com um arraigado e crescente individualismo. As famílias estão ficando menores, não porque tenham menos membros e sim porque os mesmos pouco se encontram. Há quanto tempo, paciente leitor, você não recebe a visita de um parente que não seja um filho, genro ou nora? Ou visita alguém nas mesmas condições? Famílias estendidas são uma raridade atualmente. Quanto a amigos, há as rodas de companheiros de trabalho, do happy hour e da feijoada, de torcedores do mesmo time, frequentadores do mesmo boteco ou da Boca Maldita, mas os laços entre eles são frágeis e episódicos. Cada vez mais isolados na vida real, os indivíduos se refugiam em redes sociais eletrônicas para relacionamentos profundos e duradouros... Entenda-se!Já na política, essa ânsia de associação é cada vez menor e esta vai sendo progressivamente relegada a três tipos de militantes: os que mandam nos partidos e fazem dele instrumentos para avançar suas ambições pessoais; os periféricos aos primeiros, que utilizam a escada da militância partidária para obter um lugar, um cabide em algum órgão governamental ou para gozar de algumas benesses oficiais; e – em muito menor número – grupelhos de militantes radicais que possivelmente já desistiram de mudar o mundo, mas não desistem de querer parecer que pretendem salvar a humanidade dos males do capitalismo selvagem. A sugestão de Max Weber é cada dia mais popular: "Se procuras a salvação da alma, não a procures na política". E assim, as pessoas desistem de se ocupar da vida cívica, da civitas, embora adorem pensar que estão praticando integralmente a cidadania.

Guerreiro Ramos, meu inesquecível professor, ficaria horrorizado. Cada vez que um dos seus alunos se referia ao homem como um animal social, ele corrigia: "O homem não é um animal social, é um animal político, um zoon politikon". E completava: "Social é o elefante, que quando quer se acasalar com a elefanta, vai se chegando, chegando, encosta nela". E, com um sorriso maroto, imitava com o corpo a suposta investida amorosa do paquiderme.

P.S.: Cobras e Lagartos, o programa de debates criado por Ney Hamilton Michaud na tevê da Universidade Federal do Paraná está completando oito anos ininterruptos no ar. Em mais de 300 programas semanais, ele , Mario Negrão, Hugo Mengarelli e eu demos e damos opiniões, palpites e pitacos sobre os mais variados assuntos. E , pelo jeito e reação do nosso pequeno mas fiel público, esse programa vai continuar se recusando a ser uma metamorfose ambulante e insistindo em ter opinião formada sobre tudo e todos. (Serviço: no canal de TV da UFPR, todos os dias nos horários mais surpreendentes, inesperados e insólitos).

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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