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Dia desses, escutei no rádio entrevista de ilustre representante do Ministério Público, que defendia com veemência a manutenção da idade de 18 anos para a responsabilidade penal. Em seus arroubos grandiloquentes, chamou de ignorantes todos aqueles que, como eu, defendem a redução da maioridade penal. Eu não achava que sou ignorante. Mas o digno procurador de justiça é um homem honrado. E se ele o afirma, com todas as letras, e com tal segurança, é porque deve ter seus motivos, e, no devido tempo, deve dar sua explicação.

O projeto de lei que prevê a redução de idade da responsabilidade penal do adolescente foi aprovado, recentemente, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, por votação da maioria de seus membros.

O que, na verdade, sua excelência teme, é a reforma do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), cuja manutenção defende com unhas e dentes.

A propósito, um livro, publicado em 1997, intitulado Falhas do Estatuto da Criança e do Adolescente, sob a coordenação do juiz Alyrio Cavallieri, aponta 395 objeções ao ECA. Vale dizer, o número de defeitos do Estatuto – apontados por vários juristas – é superior ao número de artigos. Não obstante, inexplicavelmente, os intransigentes defensores do ECA resistem heroicamente às mudanças.

Na entrevista, sua excelência afirmou também que nós, os ignorantes, estamos na contramão da história, porque, disse ele, a tendência mundial é pelo aumento da idade limite para a responsabilidade penal. Ora, eu pensava que era justamente o contrário. Mas o obstinado procurador de Justiça é um homem honrado. E não seria justo, não seria mesmo respeitoso para com ele, supor que estivesse manipulando dados estatísticos, para fazer valer suas ideias paternalistas.

Digo isso, porque tenho em mãos informações que estão sendo veiculadas na internet, mostrando justamente o contrário do que afirma sua excelência. E não me parecem equivocadas, pois confirmam dados anteriores que eu guardava em meus arquivos. Mas longe de mim pôr em dúvida a palavra abalizada de sua excelência! Prefiro eu mesmo passar por ignorante, como ignorantes devem ser também aqueles que votaram na Câmara pelo rebaixamento da idade para responsabilidade penal, e também ilustres juristas do Brasil inteiro.

Em vários países, a maioridade penal se dá aos 16 anos. Em algumas nações, a imputabilidade baixa para os 14 anos, nos delitos violentos. A França reduziu a maioridade penal para 13 anos. Nos Estados Unidos, a maioridade é entre 6 e 18 anos, conforme a legislação estadual. No México, entre 11 e 12 anos, para a maioria dos estados. Na In­­glaterra, a idade limite é 10 anos. Na Itália, Alemanha e Rússia, 14 anos. Na Suécia, Dina­­marca, Finlândia e Noruega é 15 anos.

É contraditório! No Brasil, o adolescente de 16 anos tem maturidade para votar e até para escolher o presidente da República, mas não a tem para responder por seus atos...

As esperanças se renovam, agora, quando se leva a questão a debate público, com amplitude e seriedade. Quem sabe, agora, se elabore uma lei despida do ranço demagógico e paternalista do velho estatuto.

"Com ele (ECA), os problemas permaneceram e, aliás, se agravaram", segundo Samuel Alves de Melo Júnior, juiz do TJ de São Paulo.

"O ECA ressente-se de alguns defeitos graves: inconstitucionalidades, imperfeição na sistematização, redação com pouca clareza em número não pequeno", diz José Carlos Barbosa Moreira, desembargador do TJ do Rio de Janeiro.

"Sou contrário ao ECA porque o considero um ato quase de insulto à sociedade brasileira", já declarava Hélio Jaguaribe, decano do Instituto de Estudos Políticos e Sociais.

"A liberdade de ir, vir e estar nos logradouros públicos concedida à criança instituiu a criança e o adolescente de rua", diz Celmilo Gusmão, juiz do TJ de Pernambuco.

Ora, depois de tudo isso, nós é que somos os ignorantes?!

Albino de Brito Freire é juiz aposentado

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