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| Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo

Na segunda-feira, dia 17 de outubro, já eram 550 escolas ocupadas no Paraná, em mobilização histórica dos estudantes secundaristas. A principal reivindicação é a de que não sequestrem seu futuro: rejeitam ser meros espectadores do cenário político e repudiam com veemência as contrarreformas do governo Temer, que buscam congelar os investimentos sociais por 20 anos (PEC 241) e, com menor orçamento, redimensionar a educação para um viés profissionalizante, acrítico e que caminha para a privatização (MP 746). As instituições têm sido chamadas a se manifestar sobre as mobilizações. O dilema posto é sobre qual direito deve ser aplicado à situação.

É possível resumir a controvérsia jurídica nos seguintes termos: há quem defenda que o direito a ser aplicado é a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, que garantem aos estudantes direito à opinião, à livre manifestação e à organização estudantil. Por outro lado, há os que defendem que deve ser aplicado o Código Civil de 2002, sobretudo no suposto direito de que o estado do Paraná “recupere a posse” dos prédios públicos, ocupados pelos estudantes.

É a liberdade de manifestação contra o arbítrio do poder econômico e político

A tese que ganhou força no Tribunal de Justiça do Paraná (sobre os casos de São José dos Pinhais, Paranavaí e Ponta Grossa, em juízo sumário) é de que deve prevalecer a primeira posição. A comunidade jurídica tem adotado oficialmente a mesma linha, como exemplificam as ações da Promotoria da Infância e da Juventude (MPE-PR), da Defensoria Pública do Estado (DPE-PR) e, também, da Associação dos Conselheiros Tutelares do Estado do Paraná (Actep). Para essas instituições e entidade, não se trata de uma “questão possessória”, mas sim de uma questão de liberdade de manifestação, em que o direito e a democracia se manifestam em seus sentidos fortes: a possibilidade de que a política não se resuma ao voto, mas possa ser também um exercício cotidiano e educativo.

A versão derrotada, no juízo sumário do Tribunal de Justiça, afirmava que as ocupações de escola configurariam o chamado “esbulho possessório”. Trata-se de confusão entre direitos políticos e direito à manifestação. Anote-se que o esbulho possessório requer, para sua configuração, a posse do bem para utilização em benefício próprio. Isso não ocorre, pois os ocupantes não carregam a intenção de ficar com o bem ou de retirar o bem permanentemente da esfera do domínio do Estado. Pelo contrário, têm realizado até mesmo melhorias nos bens, como pinturas e limpezas, com vistas à sua utilização pública, não por eles próprios, mas sim pela comunidade escolar, o que demonstra uma forte noção de coisa pública e direito à educação.

A formação social brasileira possui uma democracia frágil e blindada às demandas do povo pobre e trabalhador. Os donos da ordem sabem disso e, na situação de crise econômica, propõem uma requalificação rebaixada dos direitos sociais. Esperam que, pelo cenário institucional instável e de golpe parlamentar, seja possível realizar uma série de contrarreformas, sem que os movimentos sociais se organizem para resistir. As 550 escolas ocupadas no Paraná demonstram que não só é necessário resistir, mas também que é possível vencer.

Nesse contexto, as instituições e ativistas comprometidos com a democracia devem apoiar as ocupações de escolas. É a liberdade de manifestação contra o arbítrio do poder econômico e político. É a defesa do futuro, que se aprende na expressão contraditória da organização das lutas do presente. São 550 escolas, em que os estudantes assumem seu papel de educadores, como protagonistas da comunidade escolar e da defesa da liberdade de opinar, manifestar e organizar-se.

Lawrence Estivalet, doutorando em Direito, é integrante dos coletivos Direitos para Todxs e Advogados pela Democracia.
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