Há um profundo mal-estar na Europa, decorrente da crise vivida no continente e que tem graves consequências como alto desemprego – sobretudo entre os jovens – em diversos países. Pelo menos quatro anos de crise na Europa despertaram sentimentos latentes de insatisfação que estiveram em segundo plano nas épocas de maior prosperidade. O descontentamento se expressou de forma ilustrativa no crescimento da votação dos partidos de extrema-direita, que nas últimas eleições para o Parlamento Europeu tiveram de 20% a 25% dos votos em muitas nações. Na França, por exemplo, foram os mais votados.

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Os partidos de extrema-direita diferem bastante entre si. Vão do neonazismo da Aurora Dourada na Grécia ao tom mais populista da Frente Nacional, na França, e do Partido da Independência, no Reino Unido, que se esforçam para atrair eleitores que tradicionalmente votavam em partidos moderados, mas sentem-se desiludidos com seu desempenho diante da crise. Os extremistas mais que dobraram sua votação ao longo da última década e, na ausência de melhoras na economia, continuarão crescendo politicamente, tanto em termos nacionais quanto no Parlamento Europeu.

Um alvo frequente desses partidos é o processo de integração regional. Não por acaso, a plataforma anti-imigração e eurocética destas siglas atrai tanto eleitores irritados com o baixo crescimento e o alto desemprego na Europa quanto aqueles desconfiados da burocracia regional sediada em Bruxelas, que se consideram cada vez mais distante das demandas populacionais. É emblemático ver Marine Le Pen, líder da Frente Nacional da França, dizer que quer destruir a União Europeia.

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A raiva dos eleitores se expressa também no fortalecimento de demandas separatistas e por autonomia regional. Até o fim de 2014, a Escócia e a Catalunha realizarão referendos por sua separação do Reino Unido e da Espanha. Mesmo as regiões espanholas que não buscam independência de Madri mostram insatisfação com a monarquia, evidenciada na crise que levou à abdicação do rei Juan Carlos e na pressão para que haja uma votação pelo restabelecimento da república, abolida com a vitória do general Francisco Franco na guerra civil, em 1939.

Muito destas dinâmicas tem a ver com a inabilidade alemã para gerir a crise. A primeira-ministra alemã, Ângela Merkel, nunca a entendeu ou lidou com ela como uma crise europeia propriamente dita e sim como dificuldades grega, portuguesa, espanhola ou irlandesa. Isso faz toda a diferença. Basta pensarmos no contrassenso que é termos a dívida grega, que não chegava a 3% do PIB europeu, ser uma grande dor de cabeça para o continente, ou mesmo no fato de a União Europeia ter problemas para gerenciar acontecimentos financeiros no pequeno Chipre.

A crise precisa ser pensada e gerida em termos europeus, passando mais por soluções regionais e menos por políticas individuais alicerçadas nas medidas de austeridade, que têm provocado enorme retrocesso social no continente, pelo corte de direitos sociais e econômicos. No contexto atual, continuará o agravamento do mal-estar e o fortalecimento de partidos xenófobos com elementos antidemocráticos.

Ramon Blanco, doutor em Relações Internacionais, é professor na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila); Maurício Santoro, doutor em Ciência Política, é professor na Universidade Candido Mendes e assessor de Direitos Humanos na Anistia Internacional Brasil.

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