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Corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, peculato e por aí vai. Não foram poucos os crimes atribuídos aos réus do rumoroso processo iniciado em 2006, com o oferecimento de denúncia pelo procurador-geral da República. O assunto é muito conhecido. O publicitário Marcos Valério cooptava personalidades intimamente ligadas ao poder, seduzindo-as com a possibilidade de influir em votações no Congresso Nacional, em troca de recursos financeiros destinados a cobrir gastos de campanhas eleitorais. Tais pagamentos a partidos e parlamentares ficaram conhecidos como mensalão.

De um lado, alguns obtinham dinheiro fácil com contratos publicitários e fontes de renda obtidas ilicitamente; de outro, mantinha-se sob controle a base aliada. Todos lucravam. O Executivo vinha dominando o Legislativo, conforme denúncias do então deputado Roberto Jefferson, que só botou a boca no trombone após seus apadrinhados serem apanhados em flagrante.

Não fora a liberdade de imprensa, permaneceria encoberto mais um dos descalabros que correm nos subterrâneos deste país. Foi um julgamento midiático, como sustentam os réus? Estavam eles previamente condenados? Choros e exageros à parte, o fato é que o Supremo Tribunal Federal analisou as provas por longo tempo. Cada parte exerceu plenamente o seu direito de defesa e os ministros daquela corte debateram e fundamentaram exaustivamente os seus votos.

Foi um julgamento difícil, por se tratar de ação complexa, pelos múltiplos desdobramentos de um sofisticado esquema que só se viabiliza com a participação e organização de muitas pessoas. O mensalão mostrou, uma vez mais, que a corrupção é um monstro de muitas faces e se faz presente tanto através de pequenos achaques, como em grandes negociatas.

O STF julgou em clima tenso, em face da personalidade exaltada, digamos assim, do relator e agora presidente do tribunal, Joaquim Barbosa. A composição do Supremo mudou durante o julgamento, visto que Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso não participaram da decisão de mérito, mas tiveram atuação decisiva nas apertadas votações (6 a 5) pelo cabimento de embargos infringentes e no acolhimento dos mesmos, afastando condenações anteriormente impostas a vários réus: por formação de quadrilha, no fim de fevereiro, e por lavagem de dinheiro, na quinta-feira passada.

Nesse ponto reside a polêmica, pois há quem sustente que a presidente Dilma os escolheu por conhecer previamente suas inclinações favoráveis à tese de defesa. O julgamento do mensalão seria "um ponto fora da curva", afirmara um deles. Mas daí a dizer que os referidos ministros foram nomeados para servir aos interesses do governo vai boa distância. Zavascki, juiz de carreira, antes de assumir a cadeira no Supremo foi presidente do TRF da 4.ª Região e ministro do Superior Tribunal de Justiça, ao passo que Barroso situa-se entre os mais capazes e festejados juristas do país.

Apesar de suas credenciais, o fato é que, ao participarem do julgamento já em seu fim, inocentaram alguns dos principais réus quanto à formação de quadrilha e com isso deram margem a especulações. Passaram a ser atacados por todas as pessoas que, cansadas da impunidade de corruptos e corruptores, mostram descrença com a Justiça quando se trata de julgar esse tipo de questão.

Com todo o respeito, melhor seria para o STF, e para eles mesmos, que não tivessem votado. Razões não faltariam. Como tema de debate, cabe a sugestão de se colocar em pauta alguma medida a ser adotada pelo STF no futuro, vedando a participação de novos ministros que ingressam quando o processo está chegando ao fim, com o que se preservaria o sentido da decisão adotada pela composição original da corte, garantindo a sua credibilidade.

José Lucio Glomb, advogado, foi presidente da OAB-PR e do Instituto dos Advogados do Paraná.

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