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 | Marcelo Andrade/Arquivo Gazeta do Povo
| Foto: Marcelo Andrade/Arquivo Gazeta do Povo

Na semana que antecedeu o fim do ano letivo, os dois maiores grupos de educação superior do país anunciaram medidas antagônicas, que levariam um leitor desatento a crer que atuam em segmentos e mercados distintos. A Kroton apresentou um plano de crescimento institucional para os próximos dez anos, prevendo, entre outros, o ingresso de 650 mil estudantes em seus cursos e uma expansão de R$ 1 bilhão em seu Ebitda. Paralelamente, a Estácio demitiu, de uma só vez, mais de 1,2 mil professores. Outras instituições realizaram cortes significativos, adequando seus modelos de negócios ao que se espera para o setor nos próximos anos.

Para entender essas ações, deve-se olhar para o momento em que se iniciava o processo não concretizado da compra da Estácio pela Kroton. Equipes gestoras estudaram possibilidades de integração de equipes, redução de quadros e otimização de processos. O primeiro suspendeu operações como criação de novos cursos, unidades e estratégias de consolidação de mercado e, assim, conquistou menos alunos do que poderia. Ao retomar a gestão individual, sua equipe acabou por executar, no primeiro momento que pôde – o fim de um semestre letivo –, os planos de otimização e de economia elaborados durante a negociação com a Kroton.

A possibilidade de contratação temporária permite que os quadros de docentes efetivos sejam reduzidos em todas as instituições

A Estácio, a exemplo de todos os outros grupos educacionais, prevê uma migração de estudantes de cursos presenciais para os da modalidade a distância (EaD), o que possibilita a redução dos seus quadros de professores. Outra variável é a reforma trabalhista. Não expressamente declarada, mas facilmente identificada nas entrelinhas da lei, a possibilidade de contratação temporária permite que os quadros de docentes efetivos sejam reduzidos em todas as instituições, ainda mais nas que se posicionam como “empresas de educação”.

Já a Kroton, sem perspectivas de adquirir concorrentes de grande porte, pretende manter seu ritmo de crescimento e a tranquilidade de seus acionistas por meio de uma expansão orgânica, que terá como base campos destinados ao EaD em cidades onde não atua, os chamados greenfields. São planos ambiciosos, particularmente quando a procura de alunos pelo ensino superior cai mais de 16%, na média, principalmente por causa da falta de políticas governamentais que fomentem o interesse pela busca por uma graduação.

L eia também: O caso Estácio não é culpa da reforma trabalhista (artigo de André Brandalise, publicado em 11 de dezembro de 2017)

Leia também: Por que nossos estudantes abandonam a faculdade? (artigo de Ademar Batista Pereira, publicado em 20 de janeiro de 2018)

O Ministério da Educação publicou decretos e portarias normativas que estimulam a oferta de cursos de graduação EaD, mas, claramente, não são políticas que estimulam o aumento do número de ingressantes. Os mais de 650 mil alunos que a Kroton pretende conquistar virão de outras instituições.

Com o grande mérito de ter cumprido suas metas no último decênio, a proposta da Kroton para 2027 não se sustenta na captação de alunos, já que estes ingressarão em programas EaD, que têm ticket médio significativamente mais baixo que o dos cursos presenciais. A previsão de um salto de 41% no Ebitda baseia-se não no crescimento de receita, mas na redução de custos e despesas. Portanto, até 2027, deverá realizar cortes sistemáticos de docentes a cada fim de semestre letivo.

Lamentavelmente, qualquer análise sobre a educação superior passa longe da discussão sobre novas estratégias, metodologias, novos recursos tecnológicos ou melhoria do processo ensino-aprendizagem. O caminho que as instituições de ensino superior trilham leva a um crescimento a partir da massificação do ensino e da redução de custos para aumentar o Ebitda.

Cesar Silva é presidente da Fundação FAT, entidade sem fins lucrativos que desenvolve cursos e treinamentos nas áreas de educação e tecnologia.
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