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Não faz muito tempo, ouvi um conferencista de grande eloqüência tentar convencer o auditório de que a universidade não tem sentido algum se não produzir dinheiro.

Ao final, perguntou: alguém dos presentes ainda tem alguma dúvida?

Levantei-me para dizer que não seria propriamente uma dúvida, porém, a certeza que tenho é de que a finalidade imediata da universidade não é esta; seu primordial papel é o de formar cérebros e fomentar o juízo crítico.

Se assim não fosse, que sentido teria, por exemplo, o curso de Filosofia?

O constrangimento inevitável por parte do palestrante motivou, por outro lado, a ponderação de que o mundo capitalista especulativo, hoje, ao mesmo tempo em que impõe dogmaticamente a supremacia do mercado, como se todos os valores humanos devessem submeter-se ao dinheiro, subverteu também totalmente a própria razão de ser da universidade.

Daí, em grande parte, a obsessão pela privatização do ensino e, conseqüentemente, a baixa de seu nível.

Evidentemente, os alunos são as primeiras vítimas dessa distorção e, conseqüentemente, a sociedade como um todo, sem falarmos nas graves repercussões que se projetam para o futuro.

Recentemente, em sala de aula, fiquei perplexo. Procurando dar motivação à prática da oratória, que costumo realizar como parte integrante da avaliação do primeiro bimestre, por considerar que a oratória é imprescindível à formação jurídica, algo inusitado aconteceu.

Entre outros temas estabelecidos com razoável antecedência, solicitei-lhes que pensassem e discorressem sobre a seguinte questão: Nem toda lei é direito; nem todo direito está na lei (assunto, aliás, amplamente abordado em aulas anteriores, a partir de uma perspectiva histórica).

Ressalvadas algumas exceções, a apresentação, mediante chamada por sorteio, foi decepcionante. O medo superlativo de falar em público – que não pode acontecer numa Faculdade de Direito – levou alguns alunos ao pânico. Houve choros e ranger de dentes.

Não faltaram até mesmo reclamações à coordenação, sob alegação de que o professor estaria extrapolando de suas atribuições por exigir "matéria" não encontrada nos manuais de Direito.

Cada vez mais, a capacidade de raciocínio dos jovens dissolve-se em formas padronizadas de pensar, por vezes, infelizmente, motivadas pelas próprias instituições de ensino.

De fato, como aconteceu há pouco, uma escola de Curitiba resolveu, na calada da noite, alterar radicalmente toda uma grade horária, com extinção de disciplinas básicas, criação de outras, sem qualquer consulta aos professores, nem mesmo às chefias departamentais, e, o que é pior, sem qualquer critério pedagógico, o que por si só esconde objetivos exclusivamente econômicos.

Evidentemente, na medida em que o fator lucro entra prioritariamente no processo educacional, a qualidade intelectual dos alunos e, conseqüentemente, da própria sociedade cai, enquanto a elitização do saber se concentra cada vez mais na minoria dominante, pelo simples fato de que só tem acesso à educação quem pode pagar.

Enquanto isso, a persistir tal situação, desenha-se para o futuro um quadro muito sombrio e preocupante, formando uma geração que poderá chamar-se talvez a geração "copiar-colar".

Aloísio Surgik é professor de Direito, doutor em Direito pela USP e presidente do Sinpes (Sindicato dos Professores de Ensino Superior de Curitiba e região metropolitana).

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