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Não é nada fácil começar a vida em nosso país. Dependendo do estado da federação e do momento em que o pobre bebê resolver nascer, sua sorte pode mudar radicalmente. Até bem pouco tempo atrás, Santa Catarina era um dos piores lugares para se escolher nascer. Desde 2023, alguns membros do Ministério Público de Santa Catarina produziram uma cartilha que foi publicada promovendo ostensivamente o abortamento nos casos não puníveis por lei, como o de gravidez originária de estupro, preconizando, inclusive, a realização de tortura dos bebês através da assistolia fetal, indicando a realização do procedimento independentemente da idade gestacional da desafortunada criança.
Para termos uma ideia do quanto seus idealizadores têm empatia pelo ser humano, a cartilha impunha que o destino final destes bebês deveria ser sempre o mesmo: se menores de 22 semanas, incinerados como lixo hospitalar ou, maiores, cremados quimicamente pelo Cloreto de Potássio.
Diante de tantos despautérios desses agentes públicos que deveriam zelar pelo bem comum, resta-nos questionar onde é que estamos errando na seleção das pessoas que irão exercer essas funções tão caras à nossa Justiça
Nos últimos dias, entretanto, a sorte do bebê catarinense vem mudando. Escolhidos os nomes da lista tríplice para quem iria comandar o Ministério Público do estado, os candidatos se viram às voltas com o problema da cartilha abortista. Como o atual governador do estado é aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, os aspirantes ao cargo tentaram de todas as formas se desvencilhar do documento.
O Procurador Geral de Justiça, que queria ser reconduzido, afirmava que não foi o autor da cartilha. Sua opositora, por sua vez, asseverava ser conservadora. O fato é que nenhum dos dois se pronunciaram contra o documento, mesmo que ele tenha sido refutado por um grupo de promotores que protocolaram um pedido de revogação da citada cartilha, mas que não obtiveram nenhuma resposta sobre o assunto.
No dia 19 de março, o governador Jorginho Mello decidiu pela promotora de justiça Vanessa Cavallazzi, que comandará a instituição para o biênio 2025/2027. Quem sabe agora que o assunto da cartilha ressurgiu e a vida parece ter encontrado eco no pensamento e nos corações dos promotores, a sorte dos bebês barriga-verde possa mudar com isso tudo?
Já no Distrito Federal, a situação dos bebês ficou bem complicada por uns dias, mostrando que não estava valendo a pena querer vir ao mundo na capital. Seguindo ideias completamente infundadas, membros do MPDFT resolveram aderir a esta macabra “necrotendência”. Contrariando princípios básicos de bioética, direito e outros tantos, promotores do DF encaminharam recomendações à secretaria de saúde do Distrito Federal no mesmo sentido daquela de SC, para que se abortassem todas as crianças, nos casos em que o aborto não é punido, em qualquer idade gestacional, chegando, inclusive, a determinarem que os médicos não poderiam usar o direito constitucional de se opor ao aborto através da objeção de consciência. Pensar em preservar a vida do bebê periviável para esses agentes públicos é algo – com o perdão do trocadilho – inconcebível.
Graças a Deus (ou ao acaso para aqueles que não creem), após uma intensa movimentação de diversas autoridades de todos os âmbitos e poderes, as malfadadas recomendações dos promotores da morte foram devidamente suspensas por absoluta falta de fundamentação, dentre outras tantas irregularidades.
Diante de tantos despautérios desses agentes públicos que deveriam zelar pelo bem comum, resta-nos questionar onde é que estamos errando na seleção das pessoas que irão exercer essas funções tão caras à nossa Justiça. Há aqueles que afirmam que a dificuldade dos concursos exige cada vez mais de seus candidatos e estes, apesar de serem tecnicamente muito bem-preparados, não o são no quesito empatia; outros dizem que o status do cargo associado à alta remuneração os afastam daquilo que é ordinário e importante ao cidadão comum... Bem, não se sabe. O que sabemos, apenas, é que esses promotores públicos já nasceram e infelizmente parecem não se importar com a sorte dos que ainda estão por nascer.
Danilo de Almeida Martins é defensor público federal.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos