Poucas pessoas tomaram conhecimento e leram o relatório do Tribunal de Contas da União sobre as contas da presidente Dilma Rousseff em 2013. É um documento de quase mil páginas, denso, que detalha e analisa o que o Tribunal chama de governança de cada setor da administração federal. Eu, que tenho sido um crítico ácido da ação do TCU, nos últimos tempos voltada para as prefeituras, os bolsistas da Capes, os desmandos do Dnit e o varejão das aposentadorias dos servidores públicos, omitindo-se em setores críticos – como os empréstimos a governos antidemocráticos, Petrobras, Eletrobras, BNDES, BB, Caixa, contratos superfaturados de obras, desmandos nas áreas de transportes, rodovias, saúde, educação, Receita Federal (Refis, renúncias e desonerações, incentivos etc.) –, devo, por oficio e respeito aos trabalhadores do TCU, reconhecer o trabalho profissional executado na elaboração dos relatórios setoriais das contas da presidente.

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Li com muita atenção o capítulo sobre Previdência e Assistência Social, que compõe o que se chama Proteção Social. Deixo de lado a Assistência Social, que é bancada pelo orçamento fiscal e paga por todos os contribuintes. Nas sociedades contemporâneas, são desejáveis políticas públicas compensatórias de combate à fome e à miséria, de preferência sem proselitismo, exigindo-se contrapartidas dos beneficiários. Volto-me para a Previdência Social, para a qual as empresas (não se sabe até quando) e os trabalhadores pagam contribuições definidas para benefícios definidos que se transformam em aposentadorias e pensões.

Em principio, supõe-se a existência de uma matriz atuarial contributiva para assegurar um beneficio que, em tese, represente pelo menos 70% do salário em atividade. Prevê-se que, para assegurar um padrão mínimo de dignidade, esse beneficio não sofra desvalorização e acumule imensas perdas, como no caso da iniquidade brasileira. A aposentadoria não é um favor do Estado, não é um benefício assistencial de salário mínimo. É um direito do cidadão que trabalhou, contribuiu com um contrato social ou um pacto social entre gerações, no qual a mão grande do governo deveria ficar distante. Mão grande e criminosa.

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Há, entre supostos especialistas em previdência, o complexo vira-lata de enxergar distorções apenas nos benefícios previdenciários. Acham tudo errado na despesa com benefícios e tudo certo na receita previdenciária. No mínimo, permitam-me um termo duro: são os ignorantes, vassalos de um empresariado que sonha em contribuição zero para a previdência, como no Chile. A substituição da contribuição sobre a folha para uma alíquota no faturamento foi um passo. Enganam-se os que pensam que o custo Brasil está no INSS.

O relatório do TCU nos surpreende pela riqueza de detalhes sobe a governança administrativa do INSS, despojado, arruinado e distanciado de sua receita. "São gritantes as distorções identificadas na área de recursos humanos e nos ‘sistemas transacionais’", constatando o TCU que inexiste uma política de pessoal e que há fragilidades na infraestrutura e nos sistemas de informação. "Causa preocupação a política de pessoal do INSS" é a leitura da contundente análise que aponta para um pequeno grupo de 6 mil servidores, dos 39.392, que concederam 80% dos benefícios de junho de 2012 e maio de 2013. Além disso, 26% do efetivo está usufruindo abono-permanência e teima em continuar pelo temor de perder 40% de seus salários.

Enquanto as observações sobre a atividade-fim se mexem em todas as direções críticas ao alcance dos sticks, sofisticando os radares e sonares de cada atividade, inclusive a tecnológica, o relatório menciona que "o déficit não tem diminuído e que a principal causa desse déficit encontra-se no RGPS rural, deficitário em R$ 74,2 bilhões" em 2013. E dispara que "o déficit atingiu 1,0% do PIB, sendo que a clientela urbana apresentou superávit de 0,5% do PIB e a clientela rural foi deficitária em 1,5% do PIB". Mais ainda: em 2013, a arrecadação teve incremento de 0,1% do PIB enquanto a despesa aumentou sua relação com o PIB em 0,2%. Em nenhum momento, ousa esquadrinhar o esfarelamento da receita, às voltas com renúncias, desonerações, Refis, sonegação, evasão, não fiscalização, não cobrança e não recuperação de crédito.

Com o Executivo anestesiado e imobilizado pela campanha eleitoral, o Legislativo mergulhado no esforço de renovação da Câmara e do Senado, no "salve-se quem puder", e o Judiciário distante de ser acionado e assistindo à detetoriaçao da função de gestão pública, resta-nos a esperança idílica de sonhar que o ideário de Eloy Chaves sobreviva a tudo isso.

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