| Foto: Eli Vieira com Dall-E
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O Fórum Econômico Mundial, em seu mais novo relatório anual de riscos globais, aponta como o principal alerta de curto prazo (na publicação significando os próximos 2 anos) as informações falsas e a desinformação (tradução livre de "misinformation and disinformation").

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É claro que no cenário de cada vez mais intensa polarização o uso de exageros e informações sem contexto (para não falar de mentiras propriamente ditas) está cada vez maior, e essa atividade tem o potencial de aprofundar ainda mais essas divisões no debate público. O que não é tão óbvio é a resposta para romper esse ciclo vicioso.

Porém, entendendo a importância de valores como a dignidade humana e a liberdade para uma democracia funcionar e se desenvolver, devemos ter cautela quando defendemos regulações para limitar a disseminação de informações falsas ou enganosas.

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Em estudo recentemente publicado (julho de 2023), o Centro para Assistência Internacional da Mídia (CIMA, na sigla em inglês), entre 2011 e 2022, 78 países aprovaram leis na direção de combater desinformação - sendo que, entre 2016 e 2022, 91 novas leis foram aprovadas. O estudo apontou como muitas dessas regulações são vagas e permitem que governos proíbam conteúdos de maneira discricionária, e várias buscam encaixar o combate às informações falsas como um tema de segurança nacional. Como consequência, jornalistas constantemente arriscam incorrer em multas ou até prisão por conteúdos que caem em oposição ao atual governo, e isso não somente em países autoritários.

Temos todo o potencial, como sociedade plural e dinâmica, de buscar alternativas que gerem incentivos positivos para um ambiente de promoção da liberdade de expressão como o melhor caminho para uma sociedade mais justa e próspera

Obviamente, nem todas as regulações levam a consequências negativas às liberdades de expressão e imprensa, e isso os especialistas reconhecem no estudo. Porém, a grande tendência, explícita inclusive no receio daqueles consultados pelo relatório de risco do Fórum Econômico Mundial, que aponta a necessidade de enfrentarmos esse risco da desinformação com ação governamental, e que uma demora na ação por parte de governos traz riscos graves, como ameaças à coesão das nossas sociedades.

A tentação de contar com uma elite (qualquer que seja) que assume a responsabilidade de nos mostrar a verdade e punir a mentira ou 'falas fora de contexto' é constante e, historicamente, não é incomum. E também podemos nos sentir bem, sabendo que puniremos demagogos populistas que manipulam uma massa crédula e ingênua. Vale mantermos em nossa memória, no entanto, que regulações sobre o que poderia ou não ser dito puniram e excluíram lideranças nazistas nas décadas anteriores à ascensão do partido ao poder na Alemanha - mas assim que Hitler se tornou Chanceler, utilizou as mesmas leis para excluir e perseguir seus opositores.

Como a maioria dos brasileiros esperam alguma nova regulação nas mídias sociais, conforme pesquisa de 2023 do Instituto Sivis, mantendo, porém, a liberdade de expressão - apontado como o princípio mais importante nessa possível regulamentação - vale a pena levarmos em conta essas experiências globais. Países democráticos, tidos como regimes abertos, enfrentam graves desafios. Mas medidas de restrição e censura à liberdade de expressão, apesar de estarem cada vez mais comuns mundo afora, vão na contramão de métodos mais eficazes de combater a polarização. Um exemplo disso é o “counterspeech” ou contradiscurso, que utiliza a disseminação de narrativas alternativas para combater discursos que visam desinformar ou desestabilizar, alcançando espectadores e evitando que sejam “contaminados” com o discurso tido como maléfico.

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"A sociedade civil, as universidades e as empresas de tecnologia também podem contribuir para promover um ecossistema de informações e ideias que incentive a confiança, a cooperação e a confiabilidade", diz Jacob Mchangama, fundador do think tank dinamarquês Justitia e CEO do projeto The Future of Free Speech, e um dos grandes pensadores do tema, que monitora a chamada “recessão global da liberdade de expressão”.

Temos todo o potencial, como sociedade plural e dinâmica, de buscar alternativas que gerem incentivos positivos para um ambiente de promoção da liberdade de expressão como o melhor caminho para uma sociedade mais justa e próspera. Afinal, o risco é real de que a desinformação e uso mal-intencionado de informações falsas gerem ainda mais instabilidade política e social, como aponta os especialistas consultados pelo Fórum Econômico Mundial. Resta às nossas lideranças a responsabilidade de proteger a liberdade de expressão, pilar indispensável de democracias saudáveis (e primeiro alvo de aspirantes a ditadores), com a prudência de buscar a alternativas positivas para o combate aos riscos advindos do cuidado com essa preciosa liberdade.

Jamil Assis, relações institucionais do Instituto Sivis, think tank voltado à defesa e promoção de valores democráticos.